Pensão alimentícia: como evitar conflitos e preservar os filhos?

Especialistas dão dicas de como evitar conflitos e garantir que o assunto não afete os direitos ou o bem-estar das crianças

Madson de Moraes Publicado em 30.04.2025
Imagem mostra uma mulher branca de calos longos castanhos e um homem pardo de cabelos cacheados sentados lado a lado com a expressão séria.
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Resumo

Pensão alimentícia é um dos temas que mais gera conflitos entre casais que se divorciam. Apesar disso, especialistas explicam como é possível lidar com esse assunto sem prejudicar os filhos.

Falar sobre pensão alimentícia costuma ser um desafio para muitas famílias após a separação. O tema é delicado e, quando mal conduzido, pode gerar desgastes emocionais e financeiros, afetando diretamente o bem-estar das crianças. Por isso, a psicóloga Jéssica Ferraz Ornelas reforça a importância do suporte de profissionais em casos de conflito intenso.

“Por mais que a separação seja um processo que envolva dor, sofrimento, frustração, medo, raiva e tristeza na maioria das vezes, é necessário que haja um trabalho interno nos pais para que incorporem valores como bondade, compaixão, generosidade, outridade na escuta, sensibilidade e equidade”, afirma Jéssica.

Segundo ela, “o foco está em manter e sustentar o ambiente e a relação saudável, empática e engajada com a criança”.

A psicóloga Elsa de Matos, que atua como perita e assistente técnica em casos envolvendo disputas de guarda e convivência com os filhos, alerta que envolver a criança nessas disputas é prejudicial. Ela observa que, muitas vezes, as questões financeiras, como o valor da pensão e suas formas de pagamento, se tornam ferramenta de manipulação ou vingança. Ou seja, para reforçar dinâmicas de dependência e hostilidade, gerando danos ao bem-estar emocional dos filhos.

“Nos casos em que os filhos são envolvidos direta ou indiretamente nas disputas entre os cuidadores, seja sendo informada sobre descumprimento de obrigações parentais, seja por outros detalhes do processo judicial, isso pode gerar angústia e insegurança”, pontua Elsa. Para ela, portanto, o ideal é que a criança não seja exposta a informações que possam gerar ansiedade ou sentimento de culpa em relação às disputas dos pais.

De maneira geral, as especialistas recomendam que pais e mães estejam abertos e disponíveis para o acolhimento, a escuta e que mantenham o ambiente de segurança e confiança para o crescimento da criança durante as conversas mais sérias.

Pensão alimentícia, um assunto conflituoso

Mãe de dois meninos, de seis e nove anos, Joana Gonçalves viveu esse conflito após a separação. Apesar de um acordo inicial sobre a divisão dos gastos, a responsabilidade financeira acabou recaindo sobre ela. “No início, os valores pagos eram insuficientes, variando entre R$ 200 e R$ 300”, relata.

Após Joana recorrer à justiça para garantir o direito dos filhos, o desconto da pensão acontece diretamente na folha de pagamento do pai. No entanto, ela afirma que o valor atual não cobre nem metade das despesas dos filhos. Por esse motivo, sempre que surge um gasto extra, a conversa se torna desgastante. “No geral, ele não contribui além do valor estabelecido. Quando as crianças pedem algo diretamente, como uma mochila, ele atende, mas nada além disso”, explica.

A educadora Vanessa Ribeiro, mãe de Raul, 5 anos, enfrenta um dilema semelhante. Desde a separação, há dois anos, ela não recebe um valor fixo de pensão. O pai de seu filho cobre despesas como plano de saúde, materiais escolares e alimentação na escola. No entanto, ela sente que a distribuição não é equitativa.

“Minhas receitas são menores, pois precisei me afastar do trabalho devido à maternidade. Na prática, gasto muito mais da minha renda”, diz Vanessa.

O assunto gera desconforto sempre que precisa ser abordado. Como o filho estuda em uma escola de alto padrão, onde o pai é professor, ele acaba considerando que esse benefício equivale à pensão. “Isso dificulta as negociações, pois ele não vê necessidade de contribuir além disso”, acrescenta.

Direito garantido por lei

O Código Civil assegura que a pensão alimentícia deve garantir uma vida digna à criança, em relação à moradia, alimentação, vestuário, transporte, saúde, educação e lazer. No entanto, muitos homens deixam de cumprir essa obrigação, resultando em processos judiciais. Dados do Conselho Nacional de Justiça de 2024 mostram que, no Brasil, os processos envolvendo pensão alimentícia aumentaram no ano passado, em comparação a 2023.

Para se ter uma ideia, pensão alimentícia é um dos temas que mais gera conflitos entre casais que se divorciam. A advogada Victória Araújo, que atua diretamente com Direito de Família, ressalta que uma das principais causas disso é a divergência sobre o valor a pagar. Outras causas, de acordo com ela, são a dificuldade em comprovar a real necessidade da criança, a resistência de um dos genitores em cumprir com a obrigação e questões emocionais e de relacionamento entre os pais, interferindo na negociação.

Além disso, a falta de comunicação e a desconfiança mútua podem intensificar esses conflitos. Outra questão que acaba gerando divergências é a regulamentação da convivência. Isso porque, “em muitos casos, a ausência paterna e a falta de interesse em conviver e participar do desenvolvimento da criança trazem consequências negativas e dificuldades para chegar em um consenso”, afirma Victória.

Como calcular o valor correto?

O cálculo da pensão alimentícia geralmente considera a necessidade do alimentando (a criança) e a capacidade financeira do alimentante (quem paga). Segundo Vitória, a jurisprudência brasileira sugere que o valor da pensão deve ser proporcional à renda do genitor e levar em conta as despesas básicas da criança como alimentação, saúde, educação e lazer.

“Não há um percentual fixo, mas muitos tribunais utilizam uma faixa que varia entre 30% a 33% dos rendimentos do genitor”, explica a advogada. Além das despesas básicas, incluem-se os gastos extraordinários, que são aqueles que podem ocorrer de maneira esporádica como, por exemplo, medicamentos, tratamentos, festas de aniversário e alguma atividade extracurricular.

Por fim, “um ponto a ser levado em consideração é o padrão de vida do pai, que deve ser proporcionado à criança da mesma forma”, afirma Victória.

Economia do cuidado e pensão alimentícia

Fora o padrão de vida do pai, fatores indiretos podem influenciar esse cálculo. “Acho que a forma mais justa de avaliar o valor de uma pensão de alimentos, no meu caso, seria entendendo a proporcionalidade dos gastos com a criança, o que está diretamente relacionado ao tempo de cuidado com o filho”, defende Vanessa.

Nos últimos anos, alguns tribunais têm considerado no cálculo do valor da pensão alimentícia o trabalho de cuidado diário e não remunerado com os filhos,realizado majoritariamente por mulheres. De acordo com o Instituto Think Olga, mulheres e meninas ao redor do mundo dedicam 12,5 bilhões de horas ao cuidado sem remuneração.

A carga parental vai além das tarefas domésticas e inclui levar os filhos ao médico e à escola, auxiliar nas atividades educacionais, ler e brincar com as crianças, acompanhar compromissos sociais, entre outras responsabilidades.

“Embora não exista uma fórmula exata para calcular essa ‘remuneração’, é importante que a mãe documente suas atividades e despesas relacionadas ao cuidado da criança”, recomenda a advogada.

Em algumas situações, ela sugere argumentar que a dedicação integral à criança justifica um valor maior na pensão, “considerando que isso impacta na sua capacidade de gerar renda”.

Um resumão sobre pensão alimentícia para os filhos

  1. Como faço para pedir pensão alimentícia?
    Para isso, é preciso procurar um advogado ou advogada ou a Defensoria Pública caso não tenha condições de pagar pelo serviço.
  2. Quem pode pedir pensão alimentícia?
    No caso de filhas e filhos, quem paga é a pessoa que não tem a guarda. Se essa pessoa (pai ou mãe) não tiver condições de pagar, a pensão pode ficar sob responsabilidade de avós ou outros parentes.
  3. O valor da pensão alimentícia muda conforme a quantidade de filhos?
    Não há um valor fixo para o pagamento de pensão alimentícia, mas o número de filhos é um dos fatores considerados pela justiça na hora de fixar o valor a ser pago.
  4. E no caso de guarda compartilhada, como fica a pensão alimentícia?
    Nesse caso, há uma divisão de responsabilidades e despesas, e o pagamento da pensão alimentícia cabe a quem não mora com o filho ou a filha a maior parte do tempo.
  5. Até que idade é paga pensão alimentícia?
    Normalmente, até os 18 anos, mas pode se estender até o filho completar a faculdade ou até os 24 anos, em geral.
  6. Fui ameaçada pelo meu ex para desistir do processo de pensão alimentícia. O que devo fazer?
    É preciso procurar uma delegacia – de preferência, uma Delegacia da Mulher, se houver na cidade – e registrar um boletim de ocorrência. Com ou sem registro de BO, é possível fazer um pedido de medidas protetivas, na própria delegacia, por meio da Defensoria Pública ou advogado, com base na Lei Maria da Penha.

Fonte: Defensoria Pública do Estado de São Paulo

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