Qual é a importância da lentidão em um mundo acelerado?

No livro “A história de um caracol que descobriu a importância da lentidão”, crianças e adultos são convidados a refletir sobre o que se vê ao desacelerar

Renata Rossi Publicado em 12.04.2024
Num fundo azul, o caracol do livro “A história de um caracol que descobriu a importância da lentidão”. Ao seu lado, a capa do livro publicado pela Baião.
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Resumo

No livro “A história de um caracol que descobriu a importância da lentidão”, um caracol quer descobrir por que é lento. Esta jornada de autodescoberta é também um convite a refletir sobre o valor da lentidão em um mundo acelerado.

“Por que o caracol é tão lento?”, pergunta o menino Daniel enquanto observa atentamente o inseto caminhar pelo jardim. A partir desta questão, que na hora ficou sem resposta, o avô criou, muitos anos depois, “A história de um caracol que descobriu a importância da lentidão”. O escritor e jornalista chileno Luis Sepúlveda diz no prefácio ser uma tentativa de responder a essa difícil questão do neto.

Um grupo de caracóis vive no País do Dente-de-Leão, considerado o melhor lugar para se viver. Eles não tinham nome ou identidade, eram todos “caracol”. Os mais velhos costumavam dizer que por natureza eram lentos e silenciosos. “Assim é a vida e não há nada a fazer”. Mas, um deles, assim como Daniel, queria saber por que faziam tudo muito devagar.

Sem encontrar respostas entre seus iguais, que achavam seus questionamentos absurdos, este caracol anuncia: “Pois vou-me embora, e só voltarei quando souber por que somos tão lentos, e quando eu tiver um nome”. 

A partir daí, ele empreende uma corajosa viagem além do território onde nasceu e cresceu para descobrir o porquê de tanta vagareza. No caminho, conhece mundos jamais imaginados e conversa com animais que o levam a pensar sobre coisas que não sabia. É no encontro com a tartaruga — um animal lento como ele — que entende, enfim, o valor da lentidão e passa a se chamar Rebelde.

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“A história de um caracol que descobriu a importância da lentidão”, Luis Sepúlveda e Satoshi Kitamura (Baião)

Os caracóis do País do Dente-de-Leão levam uma vida lenta, pacífica e silenciosa, a salvo dos predadores e de outros riscos. Um deles, porém, insiste em ter um nome e descobrir quais são os motivos da sua lentidão. Para isso, ele parte numa viagem de autodescoberta. Mas, uma ameaça pode colocar a vida de todos em perigo.

A importância de desacelerar 

Se o menino Daniel estivesse em ritmo acelerado teria conseguido observar a lentidão do caracol? Certamente, naquela época, longe das telas e com tempo livre para brincar no quintal, havia muito a descobrir.

O mundo cheio de estímulos em que vivemos hoje coloca muito valor na rapidez. Há cursos para ler mais rápido, aprender um idioma em poucos meses e realizar tarefas com máxima agilidade. A antropóloga e cientista social Kathryn Bouskill afirma, em “As imprevisíveis consequências de um mundo acelerado”, que as pessoas aceitaram a aceleração como inevitável. “Elas temem que, se desacelerarem, podem correr o risco de ficarem obsoletas. Elas preferem estar exaustas a ficar enferrujadas, mas, ao mesmo tempo, temem que a velocidade acabe com suas tradições culturais e o sentido de lar”.

A rotina atribulada que impera na vida de muitos adultos acaba transbordando para a das crianças. Famílias com agendas lotadas, correndo de um compromisso para outro, muitas vezes por falta de rede de apoio, não têm outra saída senão preencher o dia dos pequenos com diversas atividades além da escola

“Cultura e rituais em todo o mundo se desenvolvem na lentidão, porque a lentidão nos ajuda a reforçar nossos valores compartilhados e a nos relacionar”, defende Bouskill. Mas, embora as relações sejam uma parte importante do ser humano, os momentos que poderiam ser de pausa, acabam se espremendo entre compromissos e a convivência fica cada vez menor.

No livro “As coisas que você só vê quando desacelera” (Sextante), o monge budista Haemin Sunim diz que apenas ao diminuir o ritmo vemos com clareza o que se passa ao nosso redor e dentro de nós. Para isso, basta parar e respirar profundamente. É o que se chama de trazer a consciência para o momento presente e então observar o que se sente, o que se vê, o que se escuta. 

Esse estado de concentração leva a uma possibilidade que é muito rica para a infância: a contemplação. Como diz José Saramago: “Se podes olhar, vê. Se podes ver, repara”. Em certa medida soa como um desafio, mas essas pausas podem beneficiar adultos e crianças.

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