Mudar de escola: guia para uma transição tranquila na infância

Especialistas explicam quando faz sentido mudar de escola, quais sinais observar e como apoiar a criança em cada etapa da transição escolar

Fernanda Martinez Publicado em 08.12.2025
Imagem mostra uma mulher adulta de mãos dadas com duas crianças, cada uma com uma mochila nas costas. Elas estão de costas; Imagem ilustra matéria sobre mudar de escola.

Resumo

Mudar de escola pode gerar insegurança, tanto na criança quanto na família. Especialistas explicam os sinais de que o ambiente escolar deixou de ser um lugar saudável, como envolver a criança na escolha da nova instituição, e a melhor forma de fazer essa transição.

A escola é o lugar onde as crianças experimentam o mundo, aprendem o significado de pertencer e vivem “o principal laboratório social da infância”, como define a psicóloga Cristiane Feitoza. “É uma extensão do lar, onde as amizades são construídas, laços se fortalecem e o caráter e a personalidade começam a ser formados.”

Por isso, mudar de escola pode gerar medo e muitas dúvidas. Nesse momento, é comum a insegurança na família, porque todos perdem a previsibilidade e o controle. De acordo com Cristiane, a preocupação nasce de um instinto de proteção, mas também porque, para além da proposta pedagógica, a nova escolha pode reforçar ou desafiar seus próprios valores e referências culturais.

Para que a transição seja tranquila, a pedagoga Denise Mineiro orienta que o momento seja vivido em conjunto com a criança, sem mentiras e com explicações claras. “Quando menores, cabe aos pais tomar a decisão, mas conforme crescem, é importante incluir a criança ou adolescente no processo, conversando e escutando suas percepções”, afirma. “ Porém, em qualquer idade, é preciso um preparo emocional para o novo ambiente.” 

“Quando a ruptura é brusca, as chances de uma reação emocional intensa são grandes”, explica Cristiane. Por isso, antes de decidir, a família precisa observar não apenas o rendimento escolar, mas sobretudo o bem-estar emocional da criança.

Sinais de que talvez seja hora de mudar de escola

Muitos motivos podem levar uma família a trocar uma criança de escola: questões práticas, como mudança de bairro ou cidade, por exemplo. Além disso, pode ser o valor da mensalidade; as discordâncias com a metodologia ou com o alinhamento ideológico; dificuldades comportamentais e de aprendizagem; até situações mais graves, como racismo, bullying ou violência.

A decisão deve sempre ser ponderada, pois existem considerações do custo-benefício em relação ao que a escola entrega e se a cultura familiar condiz com a escolar. Porém, em alguns casos, é a própria criança que dá os sinais.

Cristiane explica que a escola pode falhar em atender às necessidades emocionais básicas da criança. Assim, ela sugere atenção especial para:

  • Recusa em ir à escola: é o sinal mais claro de que algo se tornou doloroso ou ameaçador. Além disso, pode vir acompanhado de choro, queixas físicas ou medo;
  • Alterações fisiológicas: sono irregular, fome desregulada, irritação ou cansaço extremo após as aulas indicam que o corpo está em estado de alerta;
  • Retraimento social: quando a criança deixa de contar como foi o dia, perde interesse por atividades ou então passa a evitar pessoas e brincadeiras;
  • Irritabilidade e explosões: crises de raiva podem surgir quando a criança não dispõe de um ambiente seguro para expressar o que sente.

“A mudança é necessária quando a escola deixa de ser um lugar de desenvolvimento e passa a ser uma fonte de sofrimento.” – Cristiane Feitoza

Para ajudar famílias que estão passando por esse momento, Lunetas organizou um guia a partir das reflexões da psicóloga Cristiane Feitoza, especialista em transições e recomeços.

O que observar antes da decisão de mudar de escola

Trocar de escola é uma transição cultural, não apenas de endereço. Portanto, a recomendação é refletir sobre os seguintes pontos:

• A necessidade é da criança ou dos responsáveis? Mães e pais podem estar insatisfeitos por motivos próprios — como questões éticas, valor da mensalidade, conteúdo pedagógico —, mas é essencial diferenciar suas expectativas do bem-estar do filho;

• Temos condições emocionais e tempo para acompanhar a adaptação? Isso porque a mudança exige presença, paciência e um processo ativo de acolhimento;

• Haverá choque cultural? Diferenças de método, rotina e valores podem exigir preparo extra. Assim, uma solução é buscar escolas que demonstrem sensibilidade para acolher as diferenças e que valorizem a identidade de cada criança. Dessa forma, a decisão deve ser tomada em um momento de calma, e não no auge da crise.

Caminhos possíveis

Se não existe risco à segurança, vale tentar ajustes antes da troca. Portanto:

• Converse com a escola: marque uma reunião com a coordenação e compartilhe os sinais ou problemas observados e peça um plano de ação conjunto. Dessa forma, algumas vezes, pequenos ajustes, como mudança de turma ou adaptações no dia a dia, resolvem a questão;

• Pondere o que é essencial: avalie se é possível flexibilizar algo que não agrada na escola, mas que não é fundamental para o bem-estar da criança. Lembre-se que a perfeição não existe;

• Busque alternativas: de acordo com o problema, tente opções como reforço escolar, terapia psicopedagógica ou atividades culturais e esportivas que fortaleçam habilidades socioemocionais.

Como ajudar a criança: antes, durante e depois da transição

Toda mudança de instituição envolve uma ruptura. Por isso, para a criança, esse momento funciona como um luto simbólico. “É a perda de um lugar conhecido, das relações já estabelecidas, do ambiente seguro”, explica Cristiane. ” Então, quando esse luto não é validado, podem surgir sintomas de ansiedade ou depressão.”

Ela reforça a importância de acompanhar de perto as reações da criança e, quando necessário, buscar orientação de um profissional habilitado. E, principalmente, com a decisão tomada, focar no acolhimento e na preparação da criança.

Antes da decisão

Inclua a criança no processo, nas pesquisas e nas visitas às escolas;
Permita que a criança opine sobre prós e contras. Desse modo, a sensação de controle aumenta e diminui a ansiedade;
Converse sobre temores e expectativas;
Evite verbalizar os seus medos na frente da criança. Ela precisa sentir que a família está segura;
Mantenha a rotina: sono e alimentação devem estar o mais estável possível, porque o corpo e a mente da criança precisam de previsibilidade, especialmente em momentos de mudança;
Envolva a criança em cada etapa: matrícula, compra do material, escolha das peças do uniforme.

Durante o processo

Incentive despedidas da escola anterior, dos professores e dos amigos. Isso ajuda no processo do luto. Por exemplo: escrever cartinhas ou organizar um piquenique para ritualizar o momento;
Reforce que as amizades podem permanecer fora dos muros da escola e ajude a criança a manter essa relação;
Não minimize a dor, mas ofereça ferramentas para lidar com as emoções. Use frases de validação, como “eu entendo que você está triste por sentir falta dos seus amigos”;
Controle também a sua ansiedade. Portanto, em vez de dizer “espero que você faça amigos logo”, diga “estou animado para saber sobre as novidades”;
Visite a nova escola com a criança antes do início das aulas. Tire fotos dos locais importantes, como sala, refeitório, pátio;
Se a nova escola permitir, marque uma imersão antes das aulas começarem. Muitas instituições fazem isso no final do ano, pois é uma época comum para receber novos alunos para o ano seguinte.

Depois da mudança

  • Organize a rotina (horários, transporte, lição de casa) para dar previsibilidade e diminuir a insegurança;
  • Reforce sempre que a família é a base segura;
  • Lembre para a criança que é normal sentir-se ansioso nos primeiros dias;
  • Ensine uma técnica de “respiração de emergência” para momentos de medo ou muita ansiedade. Por exemplo, a “respiração da flor e da vela”: inspirar profundamente como se estivesse cheirando uma flor e expirar lentamente como se estivesse apagando uma vela.

Como ajudar a criança a se sentir parte da nova escola

O sentimento de pertencimento se consolida ao longo do período de adaptação ativa. Portanto, a criança só vai se sentir parte quando criar intimidade com os professores e tiver um grupo de amigos, tornando-se um membro integrado nessa nova “sociedade” que é a escola. Durante esse período, a família pode ajudar da seguinte forma:

• Facilite vínculos: promova encontros com os novos colegas de classe fora do ambiente escolar, como, por exemplo, em praças e parques. Isso aumenta a chance de criar conexões;

• Estimule a cultura escolar: ajude a criança a entender e a se engajar nos valores e nas tradições da nova escola, pois, se ela se sentir reconhecida, validada e respeitada, o pertencimento será mais rápido;

• Promova uma inclusão ativa: participe de atividades, como reuniões, feiras e eventos. Isso faz com que a família seja conhecida e facilita o convite para eventos sociais fora da escola.

Mudar de escola pública para particular (ou vice-versa)

A troca entre as redes pública e particular envolve uma transição cultural ainda mais acentuada. Isso porque pode incluir diferenças na estrutura física, no método pedagógico, na diversidade socioeconômica e nas expectativas de participação das famílias. Então, nesses casos, a orientação é:

• Tenha um plano de mudança: reúna informações detalhadas da escola nova, a previsão de desafios, como maior número de alunos por sala ou menos recursos tecnológicos, e pense em soluções para eles;

• Foque nos ganhos: destaque os pontos positivos da mudança. Desse modo, compreenda que, na escola pública, a vantages pode ser a maior diversidade social, que favorece a empatia, por exemplo. Na particular, o foco pode ser em um método de ensino específico ou em atividades extracurriculares.

Como encontrar a escola ideal para sua família

A pedagoga Denise Mineiro indica uma lista com questionamentos para ajudar na escolha da escola que mais se adapta ao perfil e aos valores de cada família. Nesse sentido, a ideia é selecionar critérios que orientem uma decisão segura, consciente e também afetiva.

1. Reflita sobre o que a escola representa para a família

O que esperar da escola?

  • Preferem uma proposta tradicional ou mais liberal?
  • Buscam ensino religioso, bilíngue, internacional, mais conteudista ou com formação humanista?
  • Os valores da instituição estão alinhados aos da família?
  • Há atenção para a diversidade?

2. Observe a estrutura e o ambiente

Um espaço acolhedor, limpo e iluminado contribui para o aprendizado e para a segurança emocional.

  • Há espaços para brincar e para convivência? E áreas verdes?
  • Os espaços externos são bem aproveitados?
  • Há acessibilidade e segurança (escadas protegidas, pisos antiderrapantes, redes nas piscinas)?
  • Tem biblioteca, quadra, laboratórios?
  • O número de alunos por sala é adequado?

3. Avalie o projeto pedagógico

A proposta revela como a escola lida na prática com o aprendizado e o desenvolvimento infantil.

  • Qual é o sistema de avaliação (bimestral, trimestral, semestral)?
  • Como é a escolha do material pedagógico (livros, apostilas, jogos, aparelhos eletrônicos)?
  • Há aulas de apoio ou recuperação?
  • Como a escola lida com projetos interdisciplinares, excursões, viagens e estudos de campo?
  • O ritmo de ensino respeita o tempo de cada criança?
  • Como é a comunicação com as famílias?

4. Observe quem cuida das crianças

O relacionamento entre equipe e alunos diz muito sobre o clima escolar.

  • Os professores e coordenadores demonstram empatia e respeito?
  • Há formação continuada e estabilidade entre os profissionais?
  • Você pode visitar as salas e observar a interação com os estudantes?

5. Considere a localização e a rotina

O tempo de deslocamento diário pode impactar o bem-estar da criança e a dinâmica familiar.

  • O trajeto é viável e seguro?
  • A rotina da família comporta o deslocamento?
  • Há alternativas de transporte escolar confiáveis?

6. Converse com outras famílias

Trocar experiências com mãe, pais e alunos já adaptados pode esclarecer dúvidas e trazer percepções valiosas.

  • Pergunte “o que você mais gosta nessa escola?” — a resposta costuma revelar o que mais pesa na decisão.

7. Não escolha apenas pelos rankings

Indicadores podem ser úteis, mas não contam toda a história.

  • Visite a escola focando não apenas na estrutura mas perceba se o ambiente é humano e se há um bom clima de convivência.
  • Escolha o lugar que melhor combina com seus valores e com o que acredita ser melhor para o seu filho aprender e vivenciar.

“Um espaço seguro permite que a criança se sinta tranquila, consiga se expressar e se sentir parte do todo. Por isso, a melhor escola é aquela onde a criança é feliz e se desenvolve física e emocionalmente.” – Denise Mineiro

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