Como o Governo Lula pretende garantir os direitos das crianças?

Grupo do governo de transição voltado a crianças e adolescentes aponta urgência na recuperação de direitos básicos negligenciados ao longo dos últimos anos

Eduarda Ramos Publicado em 16.12.2022
Governo Lula: foto de uma sala de aula, em que uma menina negra de cabelos longos sorri enquanto escreve em um caderno.
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Resumo

As crianças enfrentam retrocessos na garantia dos seus direitos básicos: a articulação entre diferentes áreas do novo governo é essencial para que a pauta das infâncias seja tratada de maneira prioritária e alinhada com o Artigo 227 da Constituição Federal.

Quando o assunto é atuar na defesa dos direitos das crianças e adolescentes, o combate do aumento dos índices de fome, miséria, violências, evasão escolar e queda da cobertura vacinal são alguns dos desafios urgentes que o Governo Lula irá enfrentar. Esses e outros temas foram mapeados pelo subgrupo técnico de criança e adolescente criado para atuar no governo de transição. Mas como o mapeamento dos principais problemas enfrentados pelas infâncias brasileiras pode sair do papel e se tornar realidade?

Como o grupo é formado?

O subgrupo da criança e adolescente integra o Grupo Técnico de Direitos Humanos, coordenado pela deputada Maria do Rosário. O subgrupo foi composto por quatro membros: Ariel de Castro Alves (advogado e fundador da Comissão Especial da Criança e do Adolescente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil – OAB); Isabella Henriques (advogada e presidente da Comissão de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente da OAB-SP); Maria Luiza Moura Oliveira (psicóloga e ex-presidente do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente – Conanda); e Wellington Pereira da Silva (teólogo e ex-conselheiro do Conanda).

E contou com mais 29 colaboradores voluntários. O subgrupo ouviu aproximadamente 400 representantes de entidades da sociedade civil nas mais diversas áreas, operadores do sistema de justiça, conselheiros tutelares, representantes de núcleos de pesquisa e crianças e adolescentes, além de ter recebido mais de 140 contribuições escritas, entre os meses de novembro e dezembro.

Identificação dos principais problemas

O primeiro passo para definir as estratégias de atuação foi identificar os principais problemas enfrentados por crianças e adolescentes ao longo dos últimos anos. O Lunetas conversou com alguns membros do subgrupo, que apontaram a necessidade de atuação do Governo Lula para reverter o seguinte cenário:

  • 25,7% das famílias com três ou mais pessoas abaixo de 18 anos passaram fome em 2022;
  • O Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) sofreu com a falta de reajustes para repor perdas inflacionárias. Assim, diminuindo a qualidade e quantidade da alimentação das escolas do país e aumentando os índices de fome na infância;
  • 40% das crianças e dos adolescentes no Brasil viviam em pobreza monetária (quando o indivíduo vive com menos de US$ 5 dólares por dia, segundo o Banco Mundial) no início de 2020;
  • A média de cobertura vacinal no Brasil caiu para 60,8% em 2021, sendo que o número chegava a 95,1% em 2015. O atual Governo também promoveu a propagação de desinformação sobre as vacinas, desencorajando pais e cuidadores a vacinarem as crianças;
  • Negros e negras correspondem a 80% das mortes violentas intencionais de crianças e adolescentes de 10 a 19 anos ocorridas entre 2016 e 2020;
  • Meninas com até 13 anos correspondem a 35.735 vítimas dos casos de estupro de vulnerável registrados em 2021;
  • Aproximadamente 130 mil crianças e adolescentes brasileiras ficaram órfãs devido à covid-19, até julho de 2021.

Entendemos que o Brasil observou um retrocesso nunca antes documentado nas condições de vida e na garantia de direitos das crianças e adolescentes. O impacto foi particularmente significativo para aqueles que historicamente foram marginalizados e negligenciados pelo poder público”, afirma Ariel de Castro Alves, que coordenou o subgrupo.

Além das urgências já citadas, ele aponta que crianças e adolescentes em situação de rua (aproximadamente quatro mil, apenas na capital de São Paulo) e trabalho infantil (aproximadamente 1,7 milhão de crianças e adolescentes e 5 a 17 anos, segundo o Unicef) também são problemas a serem resolvidos com urgência na atuação do Governo Lula.

Cortes no orçamento

Segundo Alves, os recursos voltados ao Ministério dos Direitos Humanos em 2015 eram de R$ 1,1 bilhão, enquanto em 2022, no mesmo ministério, foram 332 milhões. A projeção para 2023 é ainda menor. São 326 milhões previstos no orçamento. 

A Secretaria Nacional da Criança e do Adolescente representava 33% (203 milhões) do orçamento do Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos (MMFDH) em 2018. Equanto agora, representa apenas 7% (54 milhões). A previsão orçamentária para 2023 é de 42 milhões, uma queda de 80% desde 2018.

Alves relata que além das perdas de orçamento, também é necessário recuperar as estruturas de gestão da Secretaria Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente que sofreram desmontes, lidar com a descontinuidade de programas, reverter o “apagão” de dados (como a falta de dados oficiais sobre crianças em situação de rua, que teve o último censo em 2011) e cercear a participação da sociedade na escuta de crianças e adolescentes. 

“Crianças e Adolescentes deveriam ser tratados como prioridade absoluta e as políticas públicas na área precisam ter destinação privilegiada de recursos”, diz Ariel de Castro Alves.

Desafios de articulação no Governo Lula

Para Isabella Henriques, relatora do subgrupo de criança e adolescente, com tantas urgências voltadas a este público, o que garante possibilidades de articulação é a atuação intersetorial entre os poderes, ou seja, promover políticas públicas relacionadas a crianças e adolescentes de maneira transversal, fazendo com que a atuação dos vários ministérios e instâncias do governo esteja alinhada e coordenada. “É essencial entrelaçar os direitos da criança e do adolescente com temas contemporâneos, como as pautas ambientais e o impacto da emergência climática em suas vidas”, exemplifica.

“São muitas as prioridades. Precisamos retomar a perspectiva de crianças e adolescentes como sujeitos de direitos, que devem ter suas necessidades atendidas pelo Estado, pelas famílias e pela sociedade, com prioridade absoluta, como prevê o artigo 227 da Constituição Federal”, finaliza Henriques. 

“Crianças e adolescentes não são só o futuro da nação, são o presente e têm pressa na garantia de seus direitos”, afirma Isabella Henriques.

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