Unesco recomenda que celulares fiquem longe da sala de aula

Relatório aponta que uso de smartphones por estudantes durante as atividades escolares prejudica a aprendizagem e a socialização

Célia Fernanda Lima Publicado em 05.09.2023
Imagem mostra um menino branco de cabelos cacheados vestindo camisa azul e usando um celular dentro de uma sala de aula, sentado na carteira.
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Resumo

O aumento do uso de celulares entre crianças e adolescentes nas escolas implica em falta de interação e alto índice de distração, diz o relatório da Unesco. Para proteger a aprendizagem, países começam a proibir os aparelhos nas escolas e a produzir regulamentações.

Celulares já estão proibidos em algumas escolas pelo mundo, sobretudo entre países considerados mais desenvolvidos no desempenho educacional. Segundo o Relatório Global de Monitoramento da Educação, da Unesco, a medida gerou uma melhora no nível de aprendizagem dos alunos.

Além de indicar que a escola é um lugar de potencial interação e que a exposição a telas atrapalha a socialização dos estudantes, o uso excessivo dos eletrônicos por crianças e adolescentes está diretamente relacionado à distração, baixa disciplina e instabilidade emocional. “A simples proximidade de um aparelho celular é capaz de distrair os estudantes e provocar um impacto negativo na aprendizagem em 14 países”, diz o texto, ao apresentar os dados do Programa de Avaliação Internacional de Estudantes (PISA).

Nesse sentido, a Unesco recomenda cautela no uso de novas tecnologias em sala de aula. Embora haja avanços de plataformas eletrônicas de ensino e de materiais didáticos digitais, não é possível garantir sucesso contínuo em escolas de realidades distintas. Por isso, o alerta: “ao mesmo tempo em que a tecnologia leva à superação de alguns problemas, ela traz os seus próprios”.

Cidades brasileiras já adotam a medida

Recentemente, por decreto da prefeitura, as escolas municipais do Rio de Janeiro proibiram celulares dentro das salas de aula. Os estudantes devem guardar os aparelhos no modo silencioso, nas mochilas. O uso só foi liberado em casos específicos para alguma atividade escolar ou quando o aparelho serve como apoio de aprendizagem. Por exemplo, para leitura ou tradução a alunos cegos, surdos e com o Transtorno do Espectro Autista (TEA). De acordo com a prefeitura, a medida segue a diretriz da Unesco.

Porém, a proibição pode ser entendida como algo arbitrário em um cenário onde há outras possibilidades para o uso de tecnologias nas escolas. Para Maria Mello, coordenadora do programa Criança e Consumo, do Instituto Alana, regular redes sociais e jogos acessados pelos estudantes seria mais interessante.

“As tecnologias podem ser muito úteis na vida escolar. Mas, diante da ausência de regulamentação, e olhando para a perspectiva da proteção de direitos de crianças e adolescentes, uma recomendação da Unesco é bem-vinda porque se baseia em vários estudos.”

No Rio Grande do Sul, uma escola municipal de Santiago preferiu estimular os alunos a controlar o próprio uso dos celulares nas escolas. Adolescentes do ensino médio confeccionaram uma “caixa coletora”, onde todos depositam os celulares antes da aula começar e só os resgatam na hora da saída. Segundo os professores, a iniciativa rendeu mais participação nas aulas.

De acordo com a Unesco, um a cada quatro países já proibiu por completo o uso de celulares nas escolas ou, então, aderiu a projetos nacionais de regulamentação. Um a cada três professores de sete países participantes de um estudo que avalia o conhecimento de tecnologia da informação e comunicação de alunos e professores em todo o mundo (ICILS), diz que limitar o uso dos celulares nas escolas beneficia o processo de aprendizagem. Para eles, “o uso das TICs [Tecnologia da Informação e Comunicação] em salas de aula distrai os estudantes”. Além disso, eles entendem “o uso de tablets e telefones como algo que prejudica a gestão da sala de aula.”

Como regulamentar a internet dos estudantes?

Enquanto a Unesco recomenda que cada país adote diretrizes próprias para o uso da tecnologia na educação, o Brasil ainda não possui uma regulamentação específica e unificada para todo o ensino escolar. Embora exista o Projeto de Lei 2630/2020, que propõe a Lei Brasileira de Liberdade, Responsabilidade e Transparência na Internet, ainda não há previsão para que a pauta entre em votação na esfera política.

Ainda assim, o relatório aponta que aparelhos eletrônicos devem ser apenas um recurso na aprendizagem. Nesse sentido, alguns países proibiram os celulares nas escolas também para garantir a segurança digital e a saúde mental dos estudantes. Em Portugal, a cidade de Almeirim vetou os aparelhos em sala de aula a partir de setembro, quando o ano letivo inicia. O objetivo, segundo o prefeito, é preservar o QI dos alunos e evitar a dependência. Outra justificativa foi barrar o cyberbullying e evitar casos de suicídio.

Mesmo a medida sendo uma tendência nas escolas, o uso de telas dentro ou fora de sala de aula levanta outras questões, afirma Mello. “Proibir não resolve uma série de problemas sobre o modelo de negócio proposto pelas redes sociais, por exemplo. Como o conteúdo está mais ligado ao lucro do que ao bem-estar das pessoas, o uso contínuo e descontrolado dos dispositivos pega nesse lugar de prender a atenção e até gerar um vício.”

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