Segurança nas redes sociais é menor para crianças do sul global

Relatório “Plataformas globais, proteções parciais” mostra divergências em políticas de privacidade no uso de redes sociais voltadas a crianças e adolescentes

Eduarda Ramos Publicado em 15.07.2022
Duas crianças negras estão sentadas em um sofá bege. Elas brincam com um notebook e um celular. A imagem possui intervenções de rabiscos coloridos.
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Resumo

Políticas de privacidade das redes sociais no sul global e Estados Unidos são mais inseguras quando comparadas às aplicadas na Europa. A pesquisa “Plataformas globais, proteções parciais” mostra detalhes das diferenças na segurança das redes em diversos países.

Qual é a sua percepção sobre segurança nas redes sociais quando acessadas por crianças e adolescentes? De acordo com a pesquisa “Plataformas globais, proteções parciais: discriminações de design em plataformas de mídia social”, crianças europeias estão mais protegidas no TikTok, WhatsApp e Instagram do que as demais crianças ao redor do mundo. O relatório destaca uma série de disparidades preocupantes nos recursos das plataformas para jovens usuários de 14 países, principalmente para países do sul global, como o Brasil e Indonésia, e Estados Unidos – os países de maior mercado do TikTok.

“O TikTok, por exemplo, oferece uma ‘experiência adequada à idade’ às crianças europeias, na qual alguns dos recursos que podem representar maiores riscos a sua segurança e privacidade, como a possibilidade de fazer lives, ficam desativados por padrão. O Instagram, em alguns países da Europa, define como privadas por padrão as contas criadas por adolescentes de até 17 anos, o que não se verifica aqui”, diz João Francisco Coelho, advogado do programa Criança e Consumo. Em outros lugares, no entanto, os usuários menores de 18 anos não recebem as mesmas proteções, o que gera dúvidas sobre a disposição das redes sociais em oferecer um design inapropriado para outros países. 

O que o relatório analisou?

A pesquisa analisou requisitos de idade mínima, políticas de privacidade, se os aplicativos forneciam menus e suporte em línguas oficiais, variações nas configurações padrão para jovens de até 17 anos e demais variações em termos e condições de uso voltados a crianças e adolescentes. Para isso, pesquisadores de diversas partes do mundo criaram contas experimentais no Instagram e TikTok, sem realizar contato com crianças ou adultos nestes canais, e excluíram as contas ao final do experimento.

No requisito “idade mínima”, foram notados processos inadequados de estimativa e verificação de idade, pois crianças abaixo dessas idades estão usando as plataformas. As políticas de privacidade, mesmo quando disponíveis na língua materna da criança, não estão escritas em formato e linguagem acessível, levando muitos jovens com diferentes necessidades de comunicação a não conseguirem acessá-las. 

É importante reforçar que os jovens têm direito ao acesso de serviços e informações e de utilizarem plataformas de mídia social, contudo, esses serviços precisam ser desenvolvidos e prestados de forma a respeitar e promover seus direitos. O relatório também destaca o problema da falta de transparência para os usuários jovens quanto aos requisitos regionais, e recomenda que os legisladores de todos os países afetados, como o Brasil, adotem leis que exijam que as plataformas implementem configurações e políticas com mais proteção e privacidade a crianças e adolescentes.

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Perspectivas brasileiras

João Francisco Coelho explica que, para além das discrepâncias de design das plataformas, “há estudos que indicam que a maior parte das crianças e adolescentes brasileiros se conectam à internet pelo celular e não por meio de computadores, o que favorece a utilização dessas aplicações e redunda em um uso menos qualificado das redes”. Segundo levantamento realizado pela Faculdade Getúlio Vargas, jovens de 16 a 24 anos passam em média 4h14 por dia nas mídias sociais – segundo maior tempo no mundo, atrás apenas das Filipinas com 4h27 de uso diário.

O Brasil também possui diversas possibilidades de pacotes sem limite de dados para redes sociais, chamados de “zero-rating”. João enfatiza que os obstáculos relativos à ausência de compreensão acerca dos termos de uso e políticas de privacidade das plataformas digitais, muitas vezes, impedem mães e pais de auxiliar os seus filhos na navegação das redes de maneira adequada.

O que está sendo feito?

Com base nas informações fornecidas pelo documento, 37 organizações de advocacy de todo o mundo enviaram uma carta para o CEO do TikTok, Shou Zi Chew, solicitando providências quanto às discriminações de design destacadas no relatório. Entre os signatários da carta estão o Instituto Alana, DataPrivacy Brasil, 5Rights Foundation (Inglaterra) e Asociación por los Derechos Civiles (Argentina).

Em diversos lugares do mundo, já foram aprovadas leis que protegem, de fato, crianças e adolescentes em redes sociais, como o Age Appropriate Design Code (Código de Design Apropriado para a Idade, em tradução livre), do Information Commissioner’s Office. O Brasil, apesar de contar com a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) e o Marco Civil da Internet, que conferem certas proteções a crianças e adolescentes no ambiente digital, ainda carece de uma regulamentação desse tipo, definitivamente protetiva. 

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