‘Quer brincar comigo?’: crianças fazem amizades mais facilmente

Mais disponíveis para fazer novos amigos, crianças que cultivam amizades são menos ansiosas, mais empáticas e têm a oportunidade de aprenderem com seus pares

Célia Fernanda Lima Publicado em 20.07.2023
Duas crianças negras de cabelos cacheados se abraçam e sorriem no meio de um campo com árvores
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Resumo

Quando começam a fazer amigos, crianças desenvolvem suas habilidades sociais, melhoram a autoestima e até controlam a ansiedade. Famílias podem facilitar a construção das relações de amizade na infância.

Amizades de infância dão às crianças a oportunidade de aprenderem juntas, se apoiarem nas dificuldades e celebrarem as conquistas. Nesse sentido, a ciência confirma: ter amigos faz bem à saúde física e mental. Isso porque a imunidade aumenta, as habilidades emocionais e sociais melhoram, e o risco de doenças, como estresse e depressão, diminui.

Além disso, a amizade proporciona o manejo de sentimentos como empatia e a lidar com as diferenças e frustrações. “Nessa troca, as pessoas se identificam com as outras e se interessam pela interação. Então, isso aumenta também a capacidade comunicativa da criança, mesmo com aquelas mais tímidas”, diz a psicóloga infantil e educadora parental Thaís Lobato. Segundo ela, não é necessário ter muitos amigos, mas boas referências. “Ter uma pessoa de confiança faz parte do desenvolvimento infantil e de suas necessidades sociais como pessoa.”

Escola: um bom lugar para fazer amigos

Nas histórias de Denise Monteiro, 35, e Marina Barros, 34; e de Arthur, 5, e Heloísa, 5, a escola foi um espaço propício à amizade. Entre elas, bastou que uma chamasse a outra para sentar pertinho no primeiro dia de aula, há quase 30 anos, para a amizade acontecer.

Já para Arthur, ir para a escola significou ter mais contato com outras crianças além do irmão, mas foi Helô quem o acolheu logo de cara, desde o primeiro dia de aula. Então, depois de um simples convite do tipo “vamos brincar lá em casa?”, a amizade se concretizou, com direito a vídeo viral nas redes sociais.

“Ela insere o Arthur nas brincadeiras, valida todos os sentimentos e vontades dele. Já que a Helô o enxerga como uma criança, antes de ter uma deficiência, isso gera mais empatia também por parte das outras crianças. “, explica Laura Nascimento, mãe de Arthur, que tem paralisia cerebral.

Para ela, a conexão dos dois “parece ser de outras vidas”. A presença da menina deixou a rotina de Arthur, simplesmente, mais feliz. “Ele vai superanimado para a escola, porque sabe que ela está lá”, conta Nascimento.

É mais fácil fazer amigos na infância?

Saber os motivos que levam uma criança a se identificar pela outra ainda é complexo para a ciência, já que há muitas variáveis. Mesmo assim, é notório que elas conquistam amizades em um processo espontâneo, que requer mais curiosidade e menos expectativas. “As crianças são muito puras. Os adultos é que criam preconceitos”, destaca Nascimento.

A iniciativa em se aproximar de seus pares é despreocupada de julgamentos, pois as crianças só querem se divertir juntas. Nesse processo, é importante o envolvimento das famílias para mediar a interação, principalmente entre crianças mais reservadas, diz Lobato. “Os pais precisam estar presentes, levar os filhos para brincar, se reunir com outras famílias, descer para o playground.”

Cultivar amizades traz benefícios para a vida

Nos anos 1990, as amigas Monteiro e Barros passavam as tardes juntas e adoravam dublar músicas e cenas de novela. Atualmente, mesmo com as rotinas intensas com seus trabalhos e famílias, elas ainda mantêm contato e multiplicam o afeto da amizade com seus filhos. “Quando compartilhamos uma situação difícil e passamos por ela juntas, conseguimos até sorrir. A Denise é a pessoa mais engraçada que eu conheço e ela sempre foi assim”, conta Barros. “Já tivemos altos e baixos e sempre uma estava ali, dando forças para a outra. Isso ajudou no nosso crescimento pessoal, sempre nos apoiando em todos os momentos da vida”, afirma Monteiro.

A amizade entre elas reflete os resultados da pesquisa da Child Health and Human Development, dos Estados Unidos, que acompanhou por quase dez anos 169 adolescentes para mostrar a força da amizade na infância e os benefícios para a vida adulta. Quem mantinha laços afetivos desde pequeno, apresentava “menos ansiedade, mais autoestima e menos sintomas de depressão“.

Nesse sentido, Lobato percebe como a inquietação é minimizada quando crianças com ansiedade e depressão estão com seus amigos, compartilhando brincadeiras e outras situações. “A presença de outra pessoa querida as motiva e isso favorece muito a saúde mental. Vejo como crianças podem ser salvas por uma amizade.”

A amizade também marca o desenvolvimento

É lá pelos três e quatro anos que meninos e meninas começam a entender que cada um é diferente. Esse marco no desenvolvimento é conhecido como “teoria da mente” e é o que influencia na construção dos laços de amizade, explica o livro “Cultivando amizades: um guia das crianças para fazer e manter amigos”, escrito pela psicóloga americana Eileen Kennedy-Moore. Segundo ela, nessa relação, “as crianças aprimoram a percepção da perspectiva de outra pessoa e isso alimenta amizades mais íntimas”. Para Lobato, “é mais fácil estabelecer esse vínculo na infância, pois é uma necessidade social e, naturalmente, as crianças têm curiosidade em brincar com as outras”. Já um adulto leva mais de 200 horas para considerar outra pessoa como melhor amiga, diz um estudo da Universidade do Kansas, nos Estados Unidos.

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