No chão da escola, podemos eliminar tradições racistas e honrar TODAS as infâncias brasileiras, incluindo igualmente meninas e meninos negros
A terceira edição da jornada formativa “No chão da escola” destaca o papel da educação para relações antirracistas e um país que honre todas as infâncias.
O nosso país multirracial é também marcado pelo racismo estrutural. Neste país, apesar de todas as crianças terem o direito ao desenvolvimento integral, falhamos com Kailane Santos, agredida após sair de um culto religioso; com Miguel Otávio, morto ao cair do prédio à procura de sua mãe; e com Lucas, Fernando e Alexandre, desaparecidos em Belford Roxo.
Em comum, a cor da pele. Meninas e meninos negros são também maioria entre 1,5 milhão de crianças e adolescentes fora da escola, a quem se somaram outros 4 milhões, com a pandemia.
São séculos de racismo construindo oportunidades desiguais em território nacional. Para romper com essa tradição, a terceira edição do evento on-line “No Chão da Escola”, promovido pelo Instituto Alana, debate a “Educação para relações antirracistas”, destacando o importante papel da escola na construção de um país que honre a pluralidade das infâncias brasileiras e onde a igualdade racial seja realidade.
Para abrir o primeiro dia de evento, nesta terça-feira (27/7), os convidados Alexsandro Santos, presidente da Escola do Parlamento da Câmara Municipal de São Paulo, e Nilma Lino Gomes, ex-ministra dos Ministérios das Mulheres, Igualdade Racial, Juventude e Direitos Humanos, debateram como a educação pode contribuir para o enfrentamento do racismo e o avanço da democracia no Brasil.
Para que o racismo deixe de ser invisibilizado, Alexsandro diz ser importante que as questões raciais venham à tona, como uma oportunidade de desfazer essas construções históricas e refazê-las de um modo mais justo.
“Quando os adultos não discutem os conflitos raciais que estão instalados ali, quem paga a conta são as crianças”
Nilma lembra que, quanto mais frágil a democracia, maior a possibilidade de acontecerem fenômenos perversos como racismo, machismo, LGBTfobia, fascismo. Por isso, defende ela, “temos que lutar por uma democracia real, a partir de uma proposta pedagógica antirracista”.
Num segundo momento, Jaqueline Santos e Suelaine Carneiro, educadoras do Geledés – Instituto da Mulher Negra, apresentaram os resultados da pesquisa “Direito à educação em tempos de pandemia“, realizada no município de São Paulo entre setembro e novembro de 2020, para investigar as desigualdades da educação de meninas negras. Se as pessoas não-brancas são as mais afetadas pelo aprofundamento das desigualdades no contexto pré-pandemia, como estaria então hoje a realidade de meninas negras já tão vulnerabilizadas? Suelaine lembra que elas são “as principais vítimas do trabalho infantil doméstico, da exploração sexual infantil, da gravidez na adolescência, do casamento infantil – violações que se agravaram durante a pandemia”.
A partir do recorte em raça/cor e gênero, o estudo do Geledés revela que 100% dos meninos brancos tiveram acesso a material didático pedagógico durante a pandemia contra apenas 60,9% das meninas negras. Dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – PNAD-COVID-19, também realizada em 2020, mostraram que estudantes negros e indígenas sem atividade escolar são o triplo de estudantes brancos: 4,3 milhões de crianças e adolescentes negros e indígenas da rede pública e 1,5 milhão de adolescentes brancas, respectivamente.
A pesquisa do Geledés também apresenta os impactos do isolamento social e do afastamento da escola na vida de estudantes da Educação Infantil, Ensino Fundamental e Médio, e mostra os problemas relacionados ao acesso, à permanência e à realização dos percursos educativos diante da modalidade EaD, sendo que os estudantes têm dificuldades para acessar as plataformas digitais, não possuem dispositivos eletrônicos ou tampouco acessam a internet.
Mighian Danae, doutora em educação e pesquisadora do GROPEAFRO, responsável pela mediação desta terceira parte do evento, comentou o racismo como “uma experiência que nos impede de viver uma completude com o nosso corpo em espaços como a escola, nos violentando fisicamente e, muitas vezes, também simbolicamente”.
Para Maria Lúcia da Silva, integrante do instituto AMMA Psique e Negritude, “pensar os efeitos psíquicos do racismo é pensá-lo como elemento estruturador da sociedade, mas também das percepções dos afetos e da forma de pensar o mundo”. Já Júlio Cezar de Andrade, especialista em direito da criança e do adolescente, reforça como o racismo traz dores à subjetividade ao ferir “a capacidade de autoestima e ferir, todos os dias, os corpos das crianças e dos adolescentes negros”.
Para assistir ao segundo dia do evento “No Chão da Escola”, desta quarta-feira (28/7), basta acessar aqui. Os temas das mesas foram “Educação para relações étnico-raciais” e “Branquitude e racismo: o papel das escolas”.
Hoje, às 18 horas, no canal do Instituto Alana no YouTube, acontece a última rodada de debates sobre “A representatividade e o protagonismo negro no currículo”, “Recriar a escola sob perspectivas afro-brasileiras” e um encerramento musical.
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Assista a transmissão do evento na íntegra: