Especialistas explicam quando faz sentido mudar de escola, quais sinais observar e como apoiar a criança em cada etapa da transição escolar
Mudar de escola pode gerar insegurança, tanto na criança quanto na família. Especialistas explicam os sinais de que o ambiente escolar deixou de ser um lugar saudável, como envolver a criança na escolha da nova instituição, e a melhor forma de fazer essa transição.
A escola é o lugar onde as crianças experimentam o mundo, aprendem o significado de pertencer e vivem “o principal laboratório social da infância”, como define a psicóloga Cristiane Feitoza. “É uma extensão do lar, onde as amizades são construídas, laços se fortalecem e o caráter e a personalidade começam a ser formados.”
Por isso, mudar de escola pode gerar medo e muitas dúvidas. Nesse momento, é comum a insegurança na família, porque todos perdem a previsibilidade e o controle. De acordo com Cristiane, a preocupação nasce de um instinto de proteção, mas também porque, para além da proposta pedagógica, a nova escolha pode reforçar ou desafiar seus próprios valores e referências culturais.
Para que a transição seja tranquila, a pedagoga Denise Mineiro orienta que o momento seja vivido em conjunto com a criança, sem mentiras e com explicações claras. “Quando menores, cabe aos pais tomar a decisão, mas conforme crescem, é importante incluir a criança ou adolescente no processo, conversando e escutando suas percepções”, afirma. “Porém, em qualquer idade, é preciso um preparo emocional para o novo ambiente.”
“Quando a ruptura é brusca, as chances de uma reação emocional intensa são grandes”, explica Cristiane. Por isso, antes de decidir, a família precisa observar não apenas o rendimento escolar, mas sobretudo o bem-estar emocional da criança.
Muitos motivos podem levar uma família a trocar uma criança de escola: questões práticas, como mudança de bairro ou cidade e valor da mensalidade; discordâncias com a metodologia ou com o alinhamento ideológico; dificuldades comportamentais e de aprendizagem; até situações mais graves, como racismo, bullying ou violência.
A decisão deve sempre ser ponderada, considerando o custo-benefício em relação ao que a escola entrega e se a cultura familiar condiz com a escolar. Porém, em alguns casos, é a própria criança que dá os sinais.
Cristiane explica que a escola pode falhar em atender às necessidades emocionais básicas da criança. Assim, ela sugere atenção especial para:
• Recusa em ir à escola: é o sinal mais claro de que algo se tornou doloroso ou ameaçador. Pode vir acompanhado de choro, queixas físicas ou medo;
• Alterações fisiológicas: sono irregular, fome desregulada, irritação ou cansaço extremo após as aulas indicam que o corpo está em estado de alerta;
• Retraimento social: quando a criança deixa de contar como foi o dia, perde interesse por atividades ou passa a evitar pessoas e brincadeiras;
• Irritabilidade e explosões: crises de raiva podem surgir quando a criança não dispõe de um ambiente seguro para expressar o que sente.
“A mudança é necessária quando a escola deixa de ser um lugar de desenvolvimento e passa a ser uma fonte de sofrimento.” – Cristiane Feitoza
Para ajudar famílias que estão passando por esse momento, Lunetas organizou um guia a partir das reflexões da psicóloga Cristiane Feitoza, especialista em transições e recomeços.
Trocar de escola é uma transição cultural, não apenas de endereço. Portanto, a recomendação é refletir sobre os seguintes pontos:
• A necessidade é da criança ou dos responsáveis? Mães e pais podem estar insatisfeitos por motivos próprios — como questões éticas, valor da mensalidade, conteúdo pedagógico —, mas é essencial diferenciar suas expectativas do bem-estar do filho;
• Temos condições emocionais e tempo para acompanhar a adaptação? A mudança exige presença, paciência e um processo ativo de acolhimento;
• Haverá choque cultural? Diferenças de método, rotina e valores podem exigir preparo extra. Assim, uma solução é buscar escolas que demonstrem sensibilidade para acolher as diferenças e que valorizem a identidade de cada criança. Dessa forma, a decisão deve ser tomada em um momento de calma, e não no auge da crise.
Se não existe risco à segurança, vale tentar ajustes antes da troca:
• Converse com a escola: marque uma reunião com a coordenação e compartilhe os sinais ou problemas observados e peça um plano de ação conjunto. Dessa forma, algumas vezes, pequenos ajustes, como mudança de turma ou adaptações no dia a dia, resolvem a questão;
• Pondere o que é essencial: avalie se é possível flexibilizar algo que não agrada na escola, mas que não é fundamental para o bem-estar da criança. Lembre-se que a perfeição não existe;
• Busque alternativas: de acordo com o problema, tente opções como reforço escolar, terapia psicopedagógica ou atividades culturais e esportivas que fortaleçam habilidades socioemocionais.
Toda mudança de instituição envolve uma ruptura e, para a criança, esse momento funciona como um luto simbólico. “É a perda de um lugar conhecido, das relações já estabelecidas, do ambiente seguro”, explica Cristiane. “Portanto, quando esse luto não é validado, podem surgir sintomas de ansiedade ou depressão.”
Ela reforça a importância de acompanhar de perto as reações da criança e, quando necessário, buscar orientação de um profissional habilitado. E, principalmente, com a decisão tomada, focar no acolhimento e na preparação da criança.
• Inclua a criança no processo, nas pesquisas e nas visitas às escolas;
• Permita que a criança opine sobre prós e contras. Isso aumenta a sensação de controle e diminui a ansiedade;
• Converse sobre temores e expectativas;
• Evite verbalizar os seus medos na frente da criança. Ela precisa sentir que a família está segura;
• Mantenha a rotina: sono e alimentação devem estar o mais estável possível, porque o corpo e a mente da criança precisam de previsibilidade, especialmente em momentos de mudança;
• Envolva a criança em cada etapa: matrícula, compra do material, escolha das peças do uniforme.
• Incentive despedidas da escola anterior, dos professores e dos amigos. Isso ajuda no processo do luto. Por exemplo: escrever cartinhas ou organizar um piquenique para ritualizar o momento;
• Reforce que as amizades podem permanecer fora dos muros da escola e ajude a criança a manter essa relação;
• Não minimize a dor, mas ofereça ferramentas para lidar com as emoções. Use frases de validação, como “eu entendo que você está triste por sentir falta dos seus amigos”;
• Controle também a sua ansiedade. Em vez de dizer “espero que você faça amigos logo”, diga “estou animado para saber sobre as novidades”;
• Visite a nova escola com a criança antes do início das aulas. Tire fotos dos locais importantes, como sala, refeitório, pátio;
• Se a nova escola permitir, marque uma imersão de um dia ou mais antes das aulas começarem. Muitas instituições fazem isso no final do ano, quando é comum receber novos alunos para o ano seguinte.
• Organize a rotina (horários, transporte, lição de casa) para dar previsibilidade e diminuir a insegurança;
• Reforce sempre que a família é a base segura;
• Lembre para a criança que é normal sentir-se ansioso nos primeiros dias;
• Ensine uma técnica de “respiração de emergência” para momentos de medo ou muita ansiedade. Por exemplo, a “respiração da flor e da vela”: inspirar profundamente como se estivesse cheirando uma flor e expirar lentamente como se estivesse apagando uma vela.
O sentimento de pertencimento se consolida ao longo do período de adaptação ativa. Portanto, a criança só vai se sentir parte quando criar intimidade com os professores e tiver um grupo de amigos, tornando-se um membro integrado nessa nova “sociedade” que é a escola. Durante esse período, a família pode ajudar da seguinte forma:
• Facilite vínculos: promova encontros com os novos colegas de classe fora do ambiente escolar, como em praças e parques. Isso aumenta a chance de criar conexões;
• Estimule a cultura escolar: ajude a criança a entender e a se engajar nos valores e nas tradições da nova escola. Se ela se sentir reconhecida, validada e respeitada, o pertencimento será mais rápido;
• Promova uma inclusão ativa: participe de atividades, como reuniões, feiras e eventos. Isso faz com que a família seja conhecida e facilita o convite para eventos sociais fora da escola.
A troca entre as redes pública e particular envolve uma transição cultural ainda mais acentuada. Esse momento pode incluir diferenças na estrutura física, no método pedagógico, na diversidade socioeconômica e nas expectativas de participação das famílias. Então, nesses casos, a orientação é:
• Tenha um plano de mudança: reúna informações detalhadas da escola nova, a previsão de desafios, como maior número de alunos por sala ou menos recursos tecnológicos, e pense em soluções para eles;
• Foque nos ganhos: destaque os pontos positivos da mudança. Na escola pública, pode ser a maior diversidade social, que favorece a empatia. Na particular, pode ser o foco em um método de ensino específico ou em atividades extracurriculares.
A pedagoga Denise Mineiro indica uma lista com questionamentos para ajudar na escolha da escola que mais se adapta ao perfil e aos valores de cada família. A ideia é selecionar critérios que orientem uma decisão segura, consciente e também afetiva.
1. Reflita sobre o que a escola representa para a família
O que esperar da escola?
2. Observe a estrutura e o ambiente
Um espaço acolhedor, limpo e iluminado contribui para o aprendizado e para a segurança emocional.
3. Avalie o projeto pedagógico
A proposta revela como a escola lida na prática com o aprendizado e o desenvolvimento infantil.
4. Observe quem cuida das crianças
O relacionamento entre equipe e alunos diz muito sobre o clima escolar.
5. Considere a localização e a rotina
O tempo de deslocamento diário pode impactar o bem-estar da criança e a dinâmica familiar.
6. Converse com outras famílias
Trocar experiências com mãe, pais e alunos já adaptados pode esclarecer dúvidas e trazer percepções valiosas.
7. Não escolha apenas pelos rankings
Indicadores podem ser úteis, mas não contam toda a história.
“Um espaço seguro permite que a criança se sinta tranquila, consiga se expressar e se sentir parte do todo. Por isso, a melhor escola é aquela onde a criança é feliz e se desenvolve física e emocionalmente.” – Denise Mineiro