Seminário debate o papel da educação integral em tempos de pandemia e sugere saídas para o futuro
A 6ª edição do SIEI refletiu sobre o desafio de implantar os conceitos da educação integral em um contexto de pandemia que escancara as desigualdades do país.
Questões da rotina educacional brasileira ganham ainda mais urgência no contexto presente em que escolas na quarentena tentam se adaptar para seguir o processo de ensino e aprendizagem a distância durante a pandemia de coronavírus. Para ajudar a refletir sobre elas, a 6ª edição do Seminário Internacional de Educação Integral (SIEI) destacou pontos como a precarização docente, a naturalização das desigualdades, o uso democrático das tecnologias, a importância da ciência, e a construção de um modelo de trabalho coletivo e colaborativo. Como será a educação pós-pandemia?
Com o tema central “Como ensinar e aprender neste período de pandemia: qual o papel da educação integral?”, o SIEI foi adaptado à nova realidade de distanciamento social imposto pela Covid-19 e aconteceu de forma on-line, com transmissão ao vivo, na terça-feira (19/5).
Com mediação de Pilar Lacerda, diretora da Fundação SM, e participação das convidadas Tereza Perez, diretora-presidente da Comunidade Educativa CEDAC; Natacha Costa, diretora da Associação Cidade Escola Aprendiz; e Anna Helena Altenfelder, presidente do conselho de administração do Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária, o evento contou ainda com depoimentos de estudantes, familiares, professores e gestores escolares, de diferentes lugares do Brasil, sobre como a crise tem afetado a rotina educacional no país. O debate focou em três questões principais, sempre comentadas pelas convidadas:
Para as convidadas, a educação integral em tempos de pandemia envolve acolher e cuidar de alunos, famílias, professores. A escuta e a autoescuta foram destacadas como pontos mais ou tão importantes quanto trabalhar os conteúdos. Ou seja, as emoções devem ser consideradas pelos educadores, junto do conteúdo pedagógico, para os novos formatos de planejamento que, devido às condições imponderáveis, precisam ser agora dinâmicos, sujeitos a riscos e descobertas.
Ainda, sugerem pensar a educação como direito a partir da escuta dos territórios e de uma construção coletiva dos sujeitos que participam ativamente do processo educativo, para então construir propostas pertinentes que valorizem a conexão, o diálogo. Assim, consideram que precisamos mais do que nunca humanizar a conversa sobre educação, ouvir experiências e construir saídas, juntos. Devemos usar “óculos humanizadores” para olhar o outro e entender o que está acontecendo de fato. A palavra-chave desse período é parceria.
A pandemia expôs a brutal desigualdade em que vivemos e tomamos consciência da fragilidade de muitas crianças e jovens, o que reforça os questionamentos da educação integral, consideram as convidadas. Embora estejamos separados fisicamente, a gente tem buscado uma proximidade para construir uma rede colaborativa. Ninguém sozinho vai vencer o desafio. A experimentação rica que vem acontecendo apesar dos problemas e dificuldades, dizem, pode ajudar a constituir escolas mais enraizadas, verdadeiras e coletivas.
Além disso, é impossível pensar educação na vida contemporânea e no pós-pandemia sem considerar o acesso à internet de forma democrática. As tecnologias devem estar presentes, à serviço de uma educação integral, em parceria com as famílias, mas levadas pelos professores e tomando ação no espaço público da escola. Isso em oposição ao homeschooling, por exemplo, que acarretaria um esvaziamento da escola como espaço social, de efetivação da educação, de convivência com as diferenças e construção de laços sociais.
Refletindo sobre qual é a função da escola na sociedade contemporânea e da educação no pós-pandemia, indicam que devemos focar na oportunidade de consciência coletiva e sistêmica a partir dessa crise para criar um novo mundo, em que a política educacional tenha compromisso absoluto e inegociável com a superação das desigualdades e que fortaleça processos de forma a atender a todos satisfatoriamente.
Para elas, não faz sentido manter o calendário do Enem, pois significaria negar o acesso à informação e a possibilidade de inscrição a muitos alunos que dependeriam da escola para essas ações, o que vai acirrar as desigualdades. E mais, não adiá-lo é a expressão de zero escuta, não entender a realidade e não conseguir dialogar.
Após o encontro, nesta quarta-feira, 20/5, o Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas educacionais) anunciou o adiamento das datas da prova de 30 a 60 dias. Com essa decisão, o Enem deve ocorrer em dezembro ou janeiro.
“Nesse momento terrível, estamos aprendendo a fazer diferente”, reflete Pilar. “Somos capazes de aprender e inovar. É hora de levar isso para a escola, para experimentarmos e produzirmos novos conhecimentos”.
“Vamos sair da inércia e perceber a importância de políticas públicas que coordenem as ações, fortalecer vínculos e partilhar as experiências”
Ao encerrar, Pilar dedica o Seminário ao jovem João Pedro, de 14 anos, que foi assassinado esta semana dentro de casa, em uma comunidade de São Gonçalo (RJ), revelando o lugar de extrema vulnerabilidade que essas crianças ocupam.
“Meninos e meninas que estão em comunidades pobres do Brasil, vamos continuar a trabalhar para que esse país seja mais amável com vocês”
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Em linhas gerais, a educação integral visa garantir que todas as crianças dominem as capacidades básicas para se desenvolver em sujeitos por inteiro, observando suas demandas biológicas, materiais, sociais e emocionais. De acordo com esse conceito, cada território que a criança habita (escola, cidade, família, espaços culturais e de convívio social) simboliza experiências potentes de aprendizado. A educação integral é um direito básico e elementar, presente inclusive na Constituição Federal Brasileira.