Ideb e Saeb revelam queda no aprendizado durante a pandemia

Primeiro levantamento nacional após período de pandemia da covid-19 indica desafios relacionados à recuperação das aprendizagens e evasão escolar

Eduarda Ramos Publicado em 20.09.2022
Três crianças estão em uma sala de aula. Na frente, um menino negro sentado em uma cadeira de rodas escreve em um caderno. Atrás, um menino branco está com a cabeça apoiada nos braços, que estão em cima da mesa. No fundo, uma menina branca aparece desfocada, escrevendo em um caderno.
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Resumo

Como foi a aprendizagem das crianças nos últimos anos? O Saeb e o Ideb trazem dados sobre a necessidade da recuperação das aprendizagens devido a desafios causados pela pandemia.

O Ministério da Educação (MEC) e o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) apresentaram os resultados do Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) 2021 e do Saeb (Sistema de Avaliação da Educação Básica) 2021, que são feitos a cada dois anos, na última sexta (16). 

Os dados indicam que 92% das escolas de educação básica adotaram estratégias de ensino remoto ou híbrido e 72,3% das escolas recorreram à reorganização curricular para priorizar habilidades e conteúdos durante a pandemia de coronavírus. O MEC recomenda cuidado ao analisar tais achados, pois a educação foi atingida de maneira agressiva e desigual. Entre os principais desafios a serem enfrentados, especialistas e o próprio Ministério da Educação indicam a recuperação das aprendizagens agora em 2022 e trazer crianças e adolescentes de volta para a escola.

Conhecendo o Ideb e o Saeb
O Ideb funciona como um indicador nacional que possibilita o monitoramento da qualidade da educação pela população por meio de dados concretos, calculados a partir de dois componentes: a taxa de rendimento escolar (aprovação) e as médias de desempenho nos exames aplicados pelo Inep. Os índices de aprovação são obtidos a partir do Censo Escolar, que é realizado anualmente. Já o Saeb é uma avaliação para diagnóstico em larga escala com o objetivo de avaliar a qualidade do ensino oferecido pelo sistema educacional brasileiro, a partir de testes de português e matemática e questionários socioeconômicos.
Fonte: Ministério da Educação

O Inep aplicou o Saeb 2021 entre 8 de novembro e 10 de dezembro, em mais de 72 mil escolas públicas e privadas de todas as unidades da Federação. Aproximadamente 5,3 milhões de estudantes foram avaliados. Ao todo, 97,1% das 74.539 escolas previstas participaram. As públicas (com mais de 10 alunos) de 5º e 9º ano do ensino fundamental e de 3ª e 4ª série do ensino médio foram avaliadas em língua portuguesa e matemática. Essas mesmas etapas tiveram avaliação em formato amostral nas escolas privadas.

Vale ressaltar que o Saeb foi realizado em um período no qual nem todas as redes de ensino haviam retomado as aulas presenciais, aponta, em nota, Patrícia Mota Guedes, cientista política e gerente de pesquisa e desenvolvimento no Itaú Social. Nesse sentido, o resultado do Saeb pode mascarar lacunas ainda maiores de aprendizagem, se uma parte significativa dos estudantes mais vulneráveis acabou sendo sistematicamente excluída. “Os dados apresentados não devem ser usados para comparações, mas para que as redes busquem entender as lacunas de aprendizagem e como ocorreu o aprofundamento das desigualdades durante a pandemia”, explica. 

Como está o aprendizado de português e matemática das crianças?

2º ano

Enquanto o Saeb 2019 aplicado no 2º ano do ensino fundamental teve 750 pontos de proficiência média em língua portuguesa, a edição de 2021 atingiu 725,5 pontos. Dos 26 estados do Brasil e Distrito Federal, apenas sete estados ficaram acima da média nacional, sendo Santa Catarina o estado melhor avaliado, com 752,3 pontos. Em último lugar fica o Acre, com 694,4 pontos de proficiência. Em matemática as quedas foram menores, de 750 para 741.

5º ano

A evolução das proficiências médias no aprendizado de português crescia de maneira contínua até 2019, atingindo um pico de 215 pontos no último Saeb. Em 2021, o número caiu para 208, mesmo resultado da edição de 2015, apontando regressão no aprendizado. O Distrito Federal apresenta a melhor avaliação, com 228,3 pontos, enquanto o Pará apresenta a pior pontuação, com 183 pontos. O aprendizado de matemática também cresceu continuamente até 2019, mas ficou abaixo dos resultados de 2015 neste ano: 219 pontos contra 217.

Para Esmeralda Correa Macana, especialista em monitoramento e avaliação do Itaú Social, “em termos de alfabetização, estudantes do segundo ano conseguem ler palavras isoladas, mas não têm um processo de alfabetização concluído. Por conta da pandemia, aumentou o número em escalas de desempenho mais baixas, mas isso era esperado devido à falta de interação com colegas, professores e sem acompanhamento pedagógico”, diz.

Primeiros impactos

Os resultados do Ideb e Saeb neste ano estão pautados pela pesquisa “Resposta educacional à pandemia de covid-19 no Brasil”, realizada nas duas últimas edições do Censo Escolar (2020 e 2021) para compreender as consequências da crise sanitária na educação. Entre os dados da pesquisa, alguns podem ser destacados:  

  • 92% das escolas de educação básica adotaram estratégias de ensino remoto ou híbrido;
  • 14,45% ajustaram a data de término do ano letivo;
  • 72,3% das escolas recorreram à reorganização curricular para priorizar habilidades e conteúdos;
  • 17,2% das escolas adotaram o “continuum curricular”, estratégia que cria um ciclo de conciliação entre anos escolares com a devida adequação do currículo.

Segundo o Ministério da Saúde, a adesão ao “continuum curricular” foi recomendada pelo Conselho Nacional de Educação e reflete uma tentativa de evitar o aumento de reprovação e abandono escolar, cenários que tornariam ainda mais difícil a continuidade da vida escolar. 

Taxas de aprovação

Outro impacto identificado nas duas últimas edições do Censo foi o crescimento das taxas de aprovação da rede pública entre 2020 e 2021 quando comparadas com o período pré-pandemia (2019). Os aprovados do ensino fundamental passaram de 91,7% em 2019 para 98,4 em 2020, primeiro ano da pandemia, enquanto em 2021 a taxa caiu para 96,3%. Vale reforçar que, apesar dos dados melhorarem os resultados do Ideb, o indicador já considera que o aumento não associado a uma elevação da proficiência média nas avaliações pode não assegurar uma efetiva melhora no desempenho do sistema educacional. 

“Tem Estados que nos anos finais tiveram uma aprovação de 80% antes da pandemia, e em 2021 passou a ser 98%. Isso gera uma distorção nos dados do Ideb, por isso alertamos precaução na análise e olhar o contexto de cada rede, para poder avaliar as estratégias que foram adotadas nesse período”, explica Esmeralda.

Evasão escolar

“Os dados do Ideb e Saeb podem apoiar o planejamento das escolas, fazendo com que olhem suas especificidades e contextos e possam refletir sobre processos de evasão. Crianças mais vulneráveis que estão com maior dificuldade de aprendizado têm mais chances de evadir a escola, e é necessário priorizá-las para reduzir esse risco”, indica Esmeralda. Segundo o estudo “Educação brasileira em 2022 – a voz de adolescentes”, lançado pelo Unicef em setembro, cerca de 2 milhões de crianças e adolescentes não estão frequentando a escola.

Os motivos para desistir da escola apontados por crianças e adolescentes que saíram do ambiente escolar envolvem trabalhar fora (50%); não conseguir acompanhar as explicações ou atividades passadas pelos professores (30%); e a escola ainda não ter retomado atividades presenciais (29%). Entre os que pensaram em desistir da escola, não conseguir acompanhar as atividades (50%); sentir que a escola é desinteressante (38%); e não se sentir acolhido (35%) foram as principais causas.

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