Bebê arco-íris: o símbolo de esperança após gestações complicadas

Termo caracteriza nascimentos de crianças após perdas gestacionais, mortes prematuras ou mortes de recém-nascidos

Eduarda Ramos Publicado em 08.05.2023
Na imagem, um bebê é segurado no colo por sua mãe. A foto ilustra uma matéria sobre bebê arco-íris.
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Resumo

O nascimento de um bebê arco-íris simboliza a esperança de dias melhores após a perda de uma criança. Especialista reforça como cada gestação é única e que processos de luto requerem respeito e empatia.

O fenômeno que colore o céu com sete cores em dias de chuva e sol também “batiza” a chegada de um bebê arco-íris, que é um nascimento após a mãe ter vivenciado uma gestação marcada por abortos espontâneos, mortes prematuras ou mortes de recém-nascidos.

Com 24 semanas de gestação, Mayara Carvalho descobriu que sua filha tinha uma má formação no diafragma. Nascida prematuramente aos oito meses de gestação, Eva faleceu poucas horas após vir ao mundo por insuficiência respiratória. “Passei por muitos dias nebulosos e sombrios. Eu pedia pra Deus me deixar ir cuidar dela lá no céu”, diz Carvalho.

Em 2021, foram registrados 22.455 óbitos de bebês de 0 a 27 dias de vida no Brasil, segundo o Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM).

Já Cristina Dias descobriu a gravidez com três meses de gestação após uma criança da escola onde trabalhava ter batido em sua barriga. O episódio levou a um aborto.

“Com o aborto tive um sentimento de vazio, de que não tinha escolha, de que fiz algo errado”

Segundo dados do Ministério da Saúde, o Sistema Único de Saúde (SUS) registrou 180.644 internações por abortos, em 2021, sendo:

  • 77.841 espontâneos;
  • 100.761 registrados como “outras gravidezes que terminam em aborto”;
  • 2.042 realizados por razões médicas – em que o aborto é considerado legal.

No mundo, estima-se que 23 milhões de abortos espontâneos ocorram por ano e que aproximadamente 15% das gestações terminam em aborto espontâneo, de acordo com um estudo publicado na revista científica The Lancet, também em 2021.

A travessia do luto e a esperança de dias melhores

Como em geral não sabemos lidar com perdas e lutos, diz Tatiane Zaram, psicóloga e especialista em psicanálise, perinatalidade e parentalidade, é comum faltar apoio e compreensão em relação à dor dessas mães. Segundo a especialista, “a morte de um bebê pode causar manifestações como a perda de identidade, alterações dos hormônios, crises de ansiedade, angústia de separação e de morte, e estranheza em ver o corpo e o colo vazio, além de sentimentos de culpa, impotência, desânimo, estresse, insegurança, baixa autoestima e depressão”. Carvalho relata ter tido ideação suicida e dificuldade para dormir e comer após a morte de Eva. Essas implicações na vida dos pais podem inclusive “fazer com que a próxima gestação não vá adiante”, pontua Zaram.

“A cobrança por ter filhos pode muitas vezes levar a quadros emocionais extremos e atitudes de desespero, transformando o próprio desejo de ter outros filhos em sofrimento”

A especialista reforça que, mesmo que a mulher tenha outra gestação no futuro, nenhum bebê pode ser substituído. “Se perdemos algo de muito valor, mesmo tendo outro para colocar no lugar, o vazio da perda continuará existindo. Passar pelo processo de luto é poder recolocar a perda de forma consciente, dando a ela um novo significado”, finaliza.

“A dor será sentida e lembrada. O processo não é fácil, mas é possível recolocar a dor buscando pulsão de vida”

Naquele mesmo ano, Dias engravidou novamente, e sua filha Isabelle nasceu em abril de 2004. Apesar de uma gravidez saudável, ela relata ter tido medo que algo ruim pudesse acontecer de novo. Isabelle nasceu com um deslocamento do fêmur, mas a questão foi corrigida durante seu primeiro ano de vida.

Na segunda gestação de Carvalho, ela teve um descolamento de quase 60% do saco gestacional, passou por três crises de epilepsia, um episódio de colestase intra-hepática gestacional e um parto marcado pela negligência dos profissionais do hospital responsáveis por sua cesárea de emergência. Apesar disso tudo, “assim que ouvi o choro dele, o que era um sonho, já que não pude ouvir da minha primeira filha, fui tomada por um sentimento de que toda aquela dificuldade tinha valido a pena”, comenta.

Carvalho ainda precisou superar uma depressão pós-parto. “Depois de toda essa tempestade”, como ela diz, Miguel é realmente considerado um bebê arco-íris. “A vida dele me deu vida. A chegada dele aflorou um amor adormecido no meu coração que eu precisava compartilhar. Ter ele em meus braços me fez entender que eu sempre fui mãe, e que isso não iria mudar, independente de qualquer coisa”, diz a mãe de três – Miguel, 5, Kaleb, 1, e Eva.

“É possível amar a um céu de distância e ao mesmo tempo viver e ser feliz junto aos filhos que estão aqui comigo”

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