Marco Legal dos Games esconde riscos a crianças e adolescentes

Marco legal para a indústria de jogos eletrônicos expõe crianças e adolescentes a apostas on-line e jogatina em dinheiro

Emanuella Halfeld Jéssica Costa Publicado em 20.09.2023
Um menino de pele clara joga em um notebook. A imagem ilustra uma matéria sobre Marco Legal dos Games.
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Resumo

O Projeto de Lei 2796/2021, que pretende criar o marco legal para a indústria de jogos eletrônicos e jogos de fantasia, traz riscos que envolvem expor crianças e adolescentes a conteúdos impróprios e potencialmente danosos, entre outras violações de direitos.

Mais da metade dos jovens brasileiros (58%), entre 9 e 17 anos, participa de jogos on-line, segundo a pesquisa TIC Kids Online 2022. Quando olhamos apenas para os meninos, eles são 75%. Portanto, políticas nacionais que afetam seus direitos precisam considerar o melhor interesse desse público e garantir prioridade absoluta, como diz o artigo 227 da Constituição Federal. Porém, esse não é o caso do Marco Legal dos Games (Projeto de Lei 2796/2021), que visa criar diretrizes para a indústria de jogos eletrônicos e jogos de fantasia.

A crescente presença de jogadores mais novos no mundo virtual e todo ecossistema ao redor do interesse por esse tema trazem uma série de desafios não apenas para famílias e cuidadores, mas também para autoridades e empresas. Os riscos envolvem o aumento da presença desse modelo de negócio em escolas para fins de recreação e didáticos sem quaisquer diretrizes ou filtros de entrada, a exposição a conteúdos impróprios e potencialmente danosos, além de algumas categorias de jogos poderem estimular um comportamento de vícios e de apostas e receberem Classificação Indicativa Livre.

Quais são os pontos de atenção do Marco Legal dos Games?

Apesar de crianças e adolescentes que participam de jogos eletrônicos desenvolverem habilidades para a vida on e off-line, não podemos esquecer que o ambiente digital também os deixam expostos à discriminação, a discursos de ódio e à exploração comercial, que pode ganhar força com a transmissão de partidas por influenciadores mirins a outras crianças e adolescentes, por exemplo. Por isso, é fundamental combater os riscos para que os benefícios dessas interações se sobreponham e potencializem os seus direitos.

A elaboração de um jogo e o gerenciamento de suas comunidades oficiais deve considerar, em todas as etapas, o melhor interesse de crianças e adolescentes. Ou seja, cada decisão dos jogos que eles podem facilmente acessar – desde notificações, layout, moderação de chats, mecanismos de interação, gerenciamento de fóruns oficiais, ações de educação e de conscientização – deve ter como norte o bem-estar, a saúde e a garantia de direitos dos mais novos.

Esse princípio do melhor interesse não pode ficar de lado especialmente quando é uma possibilidade levar os jogos eletrônicos para as escolas, tanto para fins didáticos ou recreativos. Portanto, o Marco Legal do Games deve considerar a necessidade de uma avaliação cuidadosa dos riscos e oportunidades envolvidos nessa inclusão dos games no ambiente escolar.

Além disso, a introdução de jogos na rotina educacional de crianças e adolescentes precisa vir junto de discussões que promovam um pensamento crítico em relação à tecnologia. Afinal, estamos falando de um ambiente que pode contar com mecanismos que estimulam comportamentos viciosos e que induzem ao consumo, seja pela publicidade explícita ou mascarada presente nesses espaços ou por conta de transações financeiras, como a compra de acessórios ou melhoria de habilidades de personagens, que acontecem dentro do próprio jogo.

Qual é o perigo dos jogos de fantasia?

O atual texto do Marco Legal dos Games pode abrir espaço para que jogos de fantasia ou fantasy game sejam facilmente acessados por crianças e adolescentes. Essa modalidade de jogo se baseia em uma lógica de competição de apostas esportivas, na qual usuários podem atuar como técnicos de equipes esportivas. Assim, o desempenho do seu time fica atrelado ao desempenho dos atletas reais. Embora alguns desses jogos sejam gratuitos, é possível receber dinheiro da plataforma, conforme a premiação ou recompensas diárias.

Estudos realizados nos Estados Unidos revelaram uma correlação preocupante entre a prática desses jogos e problemas relacionados a apostas, especialmente quando envolvem prêmios em dinheiro. Estimular comportamentos de apostas na infância pode gerar sérios problemas de vício na idade adulta, um risco que não pode ser subestimado. Na forma como o texto está escrito, há margem para que esse modelo de negócios receba Classificação Indicativa Livre.

É fundamental que, movidos pelas discussões promovidas por esse projeto de lei, a indústria de jogos eletrônicos e os legisladores busquem respostas para os desafios impostos e garantam que crianças e adolescentes possam desfrutar de um ambiente digital seguro e enriquecedor.

* Emanuella Halfeld é analista de Relações Governamentais do Instituto Alana; Jéssica Costa é analista de Comunicação no Eixo Digital do Instituto Alana.
** Este texto é de exclusiva responsabilidade dos autores e não reflete, necessariamente, a opinião do Lunetas.

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