O desafio em manter o vínculo entre escola e família na pandemia

Educadores apontam caminhos para transformar a relação entre ambiente escolar e familiar em um processo mais colaborativo, no contexto presencial e remoto

Da redação Publicado em 27.01.2021
Mãe e filha estão sentadas, em frente a um computador e, através da dela, conversam com o professor.
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Resumo

Escola, família e comunidade precisam atuar juntas para proporcionar um desenvolvimento pleno da criança. Mas, no contexto de aulas presenciais e remotas imposto pela pandemia, como fortalecer este vínculo? Educadores apontam caminhos para este desafio.

De um lado, a família, que traz o significado de acolhimento, cuidado, afeto e transmissão de valores próprios. Do outro, a escola, como espaço de aprendizado, convívio com as diferenças e fortalecimento de valores universais. Duas partes de um todo essencial na vida das crianças. Quanto mais sinérgica for essa troca, mais efetiva ela será. Mas, com a pandemia do coronavírus, como é possível manter o vínculo entre escola e família? Além disso, como o ambiente escolar e familiar podem caminhar juntos, principalmente no processo de planejamento e retomada das aulas presenciais? Para especialistas, a resposta começa em entender o papel da escola. 

“Durante o enfrentamento da pandemia, ficou evidente que o papel da escola não é apenas cuidar dos aspectos cognitivos da criança, mas do coletivo”, explica Kátia Schweickardt, professora da Universidade Federal do Amazonas e ex-secretária municipal de educação de Manaus, em debate promovido durante o evento on-line No Chão da Escola, do Instituto Alana. 

A educadora aponta a confusão de papéis entre escola e família e que, com o passar do tempo, à instituição escolar foi delegada a função de preocupar-se com a alimentação, a segurança e os cuidados básicos das crianças. “Na pandemia, as escolas não conseguiram nem cuidar da aprendizagem, que é a essência da sua missão, muito menos das outras questões”, avalia. Segundo ela, é importante desmistificar a ideia de que o professor deve apenas transmitir conteúdo. 

“O educador deve ser, na verdade, um mediador da produção de conhecimento colaborativo e interativo, e não pode ter medo de mostrar as próprias fragilidades”

No Chão da Escola

Para inspirar e subsidiar a comunidade escolar frente aos novos desafios impostos pelo contexto da pandemia, o Instituto Alana realiza jornada formativa virtual destinada aos profissionais da educação. O evento acontece entre os dias 26 e 28 de janeiro, das 18h às 21h, com transmissão pelo canal do YouTube. Inscreva-se para receber mais informações.

Segundo a pesquisadora e professora Telma Vinha, doutora em Educação, a escola não deve ser vista como um serviço, mas uma instituição onde as crianças aprendem valores universais como inclusão e diversidade. “A família transmite os próprios valores às crianças. Já o ambiente escolar é rico em oferecer oportunidades de convivência em sociedade”, defende. 

Para ajudar nessa integração entre família e escola, a pesquisadora sugere a realização de assembleias, mediação de conflitos, fortalecimento do protagonismo dos jovens no processo de aprendizagem, formação continuada de professores e, principalmente, promoção de espaços de participação da comunidade escolar.

Nesse último aspecto, Katia compartilha a experiência de algumas escolas indígenas de Manaus.

“Nesses espaços, a comunidade não é um apêndice ou problema exterior à escola. Ambas são partes de um complexo único”

“Não é a comunidade que é da escola, é a escola que é parte da comunidade. O professor é também morador desse ambiente”, conta. Para tanto, ela destaca a importância de restabelecer o protagonismo do professor, com uma formação que contemple questões socioemocionais, habilidades parentais e acolhimento. Ela acredita que quando a escola se abre para uma parceria com as famílias, o processo torna-se mais empático, pois uma troca real é estabelecida. 

A mediação de conflitos entre escola, pais e filhos

“É comum que os educadores adotem o modelo de ‘terceirização’, repassando para a família o dever de ‘corrigir’ problemas do aluno”, afirma Telma Vinha.

A pesquisadora se baseia em estudos que avaliam a comunicação escola-família. Uma das questões abordadas nesses estudos foi a utilização de “bilhetes” de aviso para os responsáveis pela criança, que acabam funcionando como mecanismos de controle e produzem uma mudança temporária de comportamento. “Os bilhetes carregam o sentimento de fracasso e uma tensão entre pais e professores.

Os educadores nem sempre entendem que é por meio do conflito que se desenvolve a autorregulação e muitas habilidades emocionais”, explica Telma. “Os pais acabam legitimando as informações enviadas pelos professores e, ao mesmo tempo, sentem-se impotentes sobre o que fazer. Isso, por sua vez, gera angústia e desânimo na família, pois não há mudança real de comportamento”, conclui.

Dentro de casa começa a escola

A família é um elemento-chave nessa parceria. Porém, é preciso que os educadores realmente tenham interesse em contar com o apoio dos pais e responsáveis pelas crianças. “As famílias precisam participar da escola, mas o quanto esse é um ambiente que promove discussão? Será que a escola proporciona espaços controlados para debates ou há uma abertura para colaboração crítica nos processos de aprendizagem?”, provoca Kátia. 

Ela explica que a família tem um potencial educador, mas os professores precisam entender que, para cada tipo de ambiente ou realidade, há um tipo de interação. Questões como quem é o adulto de referência da criança, muito mais do que o responsável legal, são essenciais para uma troca efetiva.

Já Telma lembra que uma escola de qualidade tem participação e diálogo dos familiares, e que isso pode ser feito de modo individualizado e coletivo.  

“De maneira individualizada, a família pode atuar construindo um plano de ação junto com a escola para as necessidades do estudante, acompanhar as atividades e o processo de aprendizagem, compartilhar conhecimentos que possam auxiliar no desenvolvimento da criança”, sugere a pesquisadora. “De maneira coletiva, é importante que as famílias participem ativamente dos espaços de discussão e na busca por soluções dos desafios vivenciados pela comunidade escolar, por meio de eleições, conselhos, associações, unidades executoras ou outros órgãos colegiados à gestão.”

Permitir que a comunidade utilize o espaço escolar (para cursos, por exemplo) pode ajudar, segundo Telma, na resolução de conflitos coletivos. “A participação ativa nos encontros coletivos, eventos formativos, de finalização de projetos e festivos fortalece a parceria entre as duas instituições, principalmente quando ambas participam da construção desses encontros”, finaliza. 

Vínculo e acolhimento

Assista abaixo ao debate do primeiro dia do evento No Chão da Escola, “Vínculo – Desafios e Aprendizagem no Ensino Remoto e Presencial”, com Telma Vinha, Kátia Schweickardt e mediação de Tereza Perez. Na discussão, as educadoras sugeriram caminhos para que a escola e as famílias possam formar uma aliança em nome do melhor desenvolvimento intelectual, emocional e social das crianças. 

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