‘Kwat e Jaí’ levam mitos indígenas às crianças por meio da arte

Com 1,7 milhão de indígenas no Brasil, meninos e meninas dessa população também precisam de representatividade sem estereótipos

Célia Fernanda Lima Publicado em 09.08.2023
quatro crianças indíegas estão em pé brincando de arco e flecha
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Resumo

Curta-metragem e espetáculo musical apresentam as infâncias indígenas do alto Xingu com canções e poesias de histórias ancestrais para todas as crianças. Além de incluírem crianças indígenas nas artes, as produções ajudam a valorizar os saberes dos povos originários.

Como garantir que as infâncias indígenas sejam representadas nas artes sem que suas imagens estejam atreladas a violências históricas e a questões sociais como o marco temporal? Essa foi a motivação para o curta-metragem “Kwat e Jaí – os bebês heróis do Xingu”.

Em formato live-action com animação em 2D, a produção está concorrendo ao Japan Prize 2023, na Categoria de filmes para idade Pré- Escolar. O curta mostra as aventuras de Kwat e Jaí, dois irmãos indígenas procurando pela mãe. A dupla, que representa o sol e a lua, elementos presentes na cosmologia dos povos originários, passeia por paisagens do Parque do Xingu, no Mato Grosso. Nessa cenário, o enredo reconta histórias dos ancestrais da comunidade Hiulaya que ali habitavam.

É por meio da força da mitologia Kamayurá que a diretora Clarice Cardell pretende conduzir crianças a um universo particular e ancestral embaladas por canções de ninar. Ela, que trabalha com teatro para bebês há 20 anos, adaptou o curta em um espetáculo com música e poesia visual.

Ao contar para mais gente uma história da cultura originária, a arte também é uma forma de fortalecer um grupo que teve um aumento de 89% nas autodeclarações do último Censo do IBGE, de 2022.

Segundo o IBGE, a variação em relação aos registros de 12 anos atrás se deu por novas metodologias aplicadas ao mapeamento. Desta vez, as equipes chegaram a lugares mais remotos e comunidades indígenas afastadas. Os primeiros resultados mostraram que as crianças indígenas representam quase 1% da população brasileira, que soma aproximadamente 1,7 milhão de indígenas em todo o país.

Um encontro entre crianças indígenas e não indígenas

A atriz Yawi Kamayurá, que cresceu nas terras do alto Xingu, participa do musical em algumas canções e é a narradora do curta. Para ela, “a produção é muito significativa porque leva para o mundo uma história que era contada para nós na aldeia quando éramos crianças. Agora, ela é contada para outras crianças sob o ponto de vista indígena.”

O filme já teve uma primeira mostra para um grupo de crianças brancas, em Brasília. O produtor executivo, Leonardo Hernandes, lembra como foi curioso ver a surpresa delas ao descobrirem como as crianças das comunidades indígenas estavam livres.

“É importante alimentar a alteridade e a empatia entre as crianças e fazer com que elas se identifiquem nessa diversidade”, diz Hernandes. Embora ainda sejam pouco vistas ou estereotipadas em filmes, desenhos e animações, crianças indígenas são guardiãs do conhecimento ancestral. Elas aprendem ouvindo os mais velhos e exploram a natureza por meio do brincar livre.

“A ideia era justamente fugir de um ambiente fantasioso ou colorista. As imagens são de um lugar real dos indígenas Kamayurá, que também fizeram parte do elenco”, conta o produtor. Para Kamayurá, essa é uma alternativa de mostrar os povos originários e as crianças sem estereotipar suas imagens a algo distante ou sempre ligados a conflitos. “É importante que as crianças de hoje entendam que somos protetores de nossas terras, das culturas e das comunidades. E que somos brasileiros, vivemos nesse cotidiano da natureza, aprendendo muito com ela”.

Crianças indígenas presentes nas artes

Manter o distanciamento de crianças indígenas nas representações culturais é como não considerar que elas fazem parte das múltiplas infâncias do país. Pensando nisso, o aplicativo Bebe Lume, destinado a famílias com crianças de zero a cinco anos, apresenta a diversidade das identidades brasileiras em um formato interativo com jogos, poesia, músicas e personagens indígenas.

Cardell, idealizadora do aplicativo, explica que essa experiência a fez perceber que “crianças na primeira infância veem poesia nas imagens do mundo real”. Por isso, foi importante incluir nos vídeos elementos simples da cultura brasileira, como rede, panelas, tambores, misturados a mitos das culturas indígenas.

O aplicativo Bebe Lume segue as brincadeiras de Makuru, um bebê que pode ter a cor da pele ou o penteado mudado, de acordo como a criança se identifica. O conteúdo tem canções populares e de ninar, séries de vídeos e jogos simples. Há um tempo limite de tela determinado pelos pais e não permite conteúdos de publicidade. Disponível para download gratuito na Apple Store e na Google Play Store.

Além de estar disponível em mostras de cinemas pelo país, o curta “Kwat e Jaí – os bebês heróis do Xingu” deve chegar ainda este mês no aplicativo, dividido em cinco episódios.

Onde mais assistir?

  • Quarta-feira, 9/8, às 20h, no Theatro Municipal de São Paulo – sessão do filme “Kwat e Jaí – os bebês heróis do Xingu” e roda de Conversa com Clarice Cardell, Fernanda Cabral e Yawi Kamayurá sobre infância na cultura indígena e a produção do curta.
  • Sábado, 12/8, às 11h e às 14h30, no Theatro Municipal de São Paulo – espetáculo musical “Kwat e Jaí- acalantos indígenas para bebês”.

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