Um olhar para as infâncias conectadas

Publicado em: 26.06.2020
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Um mundo hiperconectado dá as boas-vindas às novas gerações. Recebidas à luz deste ambiente digital e nele se desenvolvendo, crianças entram em contato cada vez mais cedo com a tecnologia como extensão de si mesmas.

Para entender como as múltiplas infâncias brasileiras se relacionam com o meio virtual e como podem atuar ativamente na construção desse espaço, o Lunetas conversou via plataformas digitais com 32 crianças de todos os Estados, de diferentes classes sociais e etnias, com e sem deficiência. Foi interessante e até surpreendente perceber a disponibilidade das crianças em compartilharem suas percepções sobre o tema e a vontade de serem ouvidas. 

O resultado dessas conversas você confere em uma série de vídeos e infografias. O material mostra como as crianças pensam e sentem sobre o ambiente digital, quais são as oportunidades e os desafios do espaço virtual e como é possível usar a internet para expressarem suas individualidades e opiniões. Trazemos também reportagens para discutir mediação parental, o impacto das telas no desenvolvimento infantil, a tecnologia como aliada no aprendizado de crianças com deficiência, exemplos de jovens que usam plataformas digitais para gerar impacto social e um olhar sobre as infâncias que não acessam o direito à internet.

Uma vivência plena da infância é corresponsabilidade de famílias, educadores, empresas, plataformas de tecnologia e governos, mas também envolve a livre manifestação das crianças em relação aos assuntos que lhes afetam. Só assim podemos contribuir de fato com uma experiência digital ética, segura, inclusiva e criativa para todos.

(Imagem de um mapa do Brasil com fotos do rosto de crianças em cada Estado brasileiro) Título: Quem são as crianças que conversaram com o Lunetas sobre ambiente digital? Citações das crianças destacadas no mapa: “A internet é como um carrossel, porque um carrossel roda e a internet também roda para todos os lugares do mundo” - Isabelly Beatriz da Luz, 12 (Piauí) “A internet é tipo um cubo mágico! É difícil de mexer, mas quase todo mundo tem” - Amanda Sayuri Pereira Sato, 11 (São Paulo) “Se a internet fosse um brinquedo, poderia ser um aviãozinho para deixar as crianças felizes ou um robô para ajudar o planeta” - Lucca Pietro dos Santos e Silva, 8 (Santa Catarina) “A internet pode atrapalhar se a gente ficar muito tempo na tela e não se fixar no mundo real” - Gabriel Nunes das Chagas, 11 (Amapá)

O mundo digital e o imaginário infantil

Além de reunir, aproximar e divertir as pessoas, a internet também está presente no dia a dia das crianças brasileiras como um espaço dedicado à aprendizagem, à descoberta, ao entretenimento e à interação com amigos e familiares. Tudo isso mediado, principalmente, por um celular – a primeira imagem que vem à mente para a maioria das crianças quando pensa em internet. Mas, e se a internet acabasse? Ah, a vida seria de repente “horrível, difícil, impossível” ou uma oportunidade para brincar mais, conversar, olhar no olho e “prestar atenção no mundo em si”. Para elas, a internet também é um lugar de possibilidades infinitas, como “um brinquedo bem grande”, com o qual todos podem brincar, ou um carrossel “que roda para todos os lugares”.

Sentimentos e expectativas das crianças sobre a internet

Internet não é só joguinho e vídeos, não. Embora o entretenimento mediado por telas esteja presente na vida de muitas crianças brasileiras, elas também usam a internet para se informar, tirar dúvidas e aprender coisas novas. Entre as possibilidades, as crianças destacam a internet como espaço para pesquisar “tudo o que você precisa”, conectar-se com outras pessoas que moram longe, um meio de te “levar para outros lugares” e uma forma de comunicar causas ambientais, promover a solidariedade e combater o racismo. Os pequenos também têm muita consciência sobre os malefícios do ambiente digital, viu? Questões como o excesso de publicidade, imagens de violência, pornografia, notícias falsas e cyberbulling foram discutidas por eles em conversa com o Lunetas.

Como as crianças usam a internet e a mediação dos pais

Agenda cheia não é exclusividade dos adultos. Muitas crianças têm tantos compromissos que já não sabem lidar muito bem com o ócio. “Não sei o que fazer nessas horas vagas”. O tempo livre precisa ser preenchido com atividades e o recurso mais à mão é o celular. “A internet me ajuda a me divertir”. Algumas reconhecem que podem ficar viciadas e revelam que passam muitas horas, “quase o dia todo”. Outras conhecem os limites e usam a internet só “depois de terminar os exercícios”. Mas vale a presença dos pais nesta mediação, para deixar claro que não pode “ver coisa errada” nem “usar o celular na hora de comer”, e “desligar os eletrônicos” ajuda a “descansar a cabeça e ter um sono melhor”. Se ficam muito tempo sem acessar a internet, podem se sentir entediadas, ansiosas, desconectadas do mundo ou, veja só, disponíveis para brincadeiras. A criança costuma copiar o comportamento que identifica nos pais, como um espelho. “Eu fico no computador o dia inteiro, eles também podem ficar no telefone o dia inteiro”, assim “eles não podem me julgar”. Mas a maioria se sente incomodada com o fato de os pais usarem muito a internet. “Quando eles estão no celular, eles praticamente ficam surdos”, “fico chocado quando eles não me respondem”. Pode ser que as crianças queiram mesmo só um pouquinho mais de atenção…

A participação das crianças no mundo digital

“Quero mostrar o meu talento para o público na internet”. “Tenho o sonho de ser famosa quando crescer”. “Eu inventei minha exposição de Lego e mostro no meu canal”. “Eu fiz um vídeo sobre a semana do meio ambiente”. “Posso ganhar seguidores e ser quem eu quiser”. Expressar opiniões, sentimentos e brincadeiras em canais ou redes sociais se tornou parte da rotina de muitas crianças. Mais que isso: pode ser até sinônimo de carreira, sonho de vida, desejo de ser reconhecido. Contudo, receber afirmação pelo olhar do outro merece atenção. A criança está em pleno processo de desenvolvimento da personalidade, da identidade, do “eu”. Ao mesmo tempo, a internet pode ser espaço de criatividade e participação cidadã. Como lidar com comentários de seguidores ou “fãs”? Como conviver com a identidade criada no mundo digital? Como tornar esse ambiente uma ferramenta de expressão? São muitas as perguntas que tanto crianças, nativas digitais, quanto nós, adultos, estamos juntos tentando entender, para então viver este novo universo de maneira equilibrada, segura e saudável.

Comportamento em relação ao ambiente digital

Apesar de oferecer oportunidades, a internet não é um ambiente completamente seguro. As crianças poderão se proteger melhor se conhecerem os riscos a que estão expostas. Sobre segurança de dados, elas acham chato “se alguém hackear ou pegar a senha”, por exemplo. Por isso, se defendem contra vazamento de informações ao manter a privacidade, bloquear seguidores indesejados, “porque existem muitas pessoas ruins na internet”, recorrer aos pais e responsáveis ou até mesmo à denúncia, caso façam “memes ruins meus”. Outra forma de exposição é a publicidade infantil, anúncios dirigidos às crianças com alto potencial de influenciá-las e que podem inclusive atrapalhar a experiência na internet. “Fica, sei lá, com muita propaganda e não dá nem pro cara falar direito”. Entre os produtos que dão vontade de comprar, elas destacam “aqueles iluminadores de led que as blogueiras usam”, “slime, pijama de unicórnio, paleta de canetas”, “um moletom da banda Now United, que eu sou fã. Eu não tinha dinheiro suficiente, mas agora eu estou juntando”. Mas a avaliação crítica também aparece em reflexões como: “A gente tem que observar se tá precisando muito daquilo”, o que vale para qualquer um, crianças e adultos, não é mesmo?

Um infográfico com os seguintes resultados: Quando você pensa em internet ou tecnologia, qual a primeira imagem que vem à sua cabeça? Celular 33% Vídeos, filmes, desenhos e séries 12% Notebook, computador, tablet 10% Jogos 7% Aplicativos 5% Robôs 5% Sites de pesquisa 2% Outros 14% Não opinou 12% Para qual finalidade você mais usa a internet? Vídeos, filmes, desenhos e séries 26% Estudar, pesquisar e aprender 22% Jogar 15% Usar redes sociais/plataformas de criação de conteúdo 14% Falar com pessoas 11% Ouvir música 6% Ocupar o tempo 3% Fazer compras 2%
Como você se sente se ficar muito tempo sem internet? Triste, chateado, entediado 25% Livre, disponível para brincadeiras 25,0% Preocupado, apreensivo, ansioso 8% Bravo, com raiva, mal 8% Isolado, desconectado do mundo 8% Não opinou 25% O que você não acha legal no ambiente digital? Notícias falsas 11% Cyberbullying e hating 11% Propaganda 6% Imagens de violência 6% Roubo, hackeamento de informações 3% Racismo 3% Pornografia 3% Outros 14% Não opinou 43%