Ellen Tadd: ‘A situação pede que trabalhemos para o bem comum’

A educadora traz reflexões sobre a importância de valorizar a comunidade e a coletividade neste momento de crise imposto pela pandemia

Ellen Tadd Publicado em 05.05.2020
Imagem de quatro crianças de etnias e raças diferentes (um menino negro, uma menina branca e loira, um menino asiático e outra menina de origem indígena) estão segurando uma mudinha de planta e sorrindo. A imagem mostra a construção do bem comum.
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Resumo

Ellen Tadd reflete sobre a importância de valorizarmos o senso de coletividade e de bem-estar comum para atravessarmos este momento de pandemia e criarmos um nova possibilidade de futuro para as próximas gerações.

Quando tinha meus 20 e poucos anos, eu morava em uma república, em um antigo casarão, com espaço suficiente para sete pessoas viverem confortavelmente. Havia muitos aspectos da vida nessa pequena comunidade, como cozinhar uns para os outros, tocar música juntos e as conversas que atravessavam a noite. Os problemas começaram quando muitas das responsabilidades e tarefas da casa eram negligenciadas. A situação não melhorou com as reuniões e os planos coletivos, porque muitas vezes faltava prática e implementação.

Eu senti muito quando tive de mudar de casa mas, com o passar do tempo, meus ressentimentos cresceram e, eventualmente, o lado negativo pesava mais que o positivo. Eu lembro claramente de meditar sobre o meu dilema e vir à mente esta frase: “a comunidade que você deseja não será uma realidade até que ela seja uma necessidade”. Eu me lembro disso agora que todos nós estamos diante de uma pandemia global. Nesse momento, comunidade se tornou algo essencial. A situação pede que sejamos flexíveis e trabalhemos juntos para o bem comum.

O novo coronavírus está avisando que somos todos conectados, e que dependemos uns dos outros para sobreviver e adquirir os itens básicos para viver, comer, termos saúde e mantermos nossas relações sociais.

Minha esperança é que esse vírus – que está causando uma tremenda quantidade de sofrimento e nos deixou vulneráveis – eventualmente contribua para uma reestruturação positiva no mundo inteiro. Nossa prioridades podem mudar, movidas por um novo entendimento de que se não cuidarmos dos mais vulneráveis, todos estarão em risco. Apesar de existirem fronteiras entre os países, um vírus não reconhece essas barreiras e, portanto, todas as nações precisam trabalhar juntas pela segurança humana e pelo bem-estar global. Um vírus é cego em relação à nacionalidade, raça, religião e classe econômica.

Esse evento repentino, perigoso e assombroso é um alerta para direcionarmos as nossas preocupações para o mundo inteiro e para a cooperação global, em vez de focar na competição e na valorização de bens materiais acima de princípios espirituais.

Muita gente está acostumada a se pressionar e se orientar por meio de objetivos, somente tentando satisfazer e expressar os seus desejos, sem nenhuma consideração para os outros. Ao meu ver, o bem-estar individual deve honrar as interconexões e é uma dança entre qualidades orientadoras – como empenho, diálogo, iniciativa e liderança – e qualidades receptivas – como permissão, flexibilidade, escuta e paciência. A falta de cultivo e apreço pelos princípios receptivos e pelo bem comum é uma das grandes causas por trás do desequilíbrio e da turbulência do nosso mundo. Agora as circunstâncias nos forçam a aprender as qualidades receptivas.

Muitos estão refugiados dentro do lar, com dificuldades para conseguir o básico, trabalhando em casa e, ao mesmo tempo, se desdobrando para cuidar dos filhos. Podemos usar esse tempo para a reflexão, inovação, e o cultivo da aceitação. Podemos simultaneamente dar atenção aos detalhes sem se apressar, como ter de lavar as mãos por 20 segundos, higienizar as embalagens e guardar a comida com cuidado, enquanto lidamos com toma lá, dá cá necessário para que as relações com nossas famílias permaneçam em harmonia.

A vida se tornou mais preciosa, assim como comida, água, casa e nossos relacionamentos. Podemos aprender a consumir menos coisas e descobrir novos meios para sermos criativos e nos sentirmos realizados. Tenho ouvido cada vez mais histórias de famílias cantando com as crianças, lendo juntas, e inventando brincadeiras. Vejo pais e filhos que estão trabalhando lado a lado na cozinha ao mesmo tempo em que transformam a casa em escola e escritório.

Minha cunhada está costurando máscaras para o hospital local e a feira está permitindo que as pessoas paguem pela internet quando retornam às suas casas para, assim, manterem uma distância segura. No meio de tanto sofrimento existe confiança, cuidado, coragem e dedicação. Sempre que a humanidade se depara com um grande desafio, em um momento em que o medo impera, existe também a oportunidade para elevar as nossas vidas ao bem comum.

Não há dúvidas de que essa pandemia será mais difícil para uns do que para outros, mas todos nós podemos aprofundar a nossa compaixão, fazer a nossa parte e trabalhar por uma comunidade global cooperativa.

De um desafio humano compartilhado pode surgir um desejo mais forte de servir a humanidade e ajudar a fazer do mundo um lugar melhor. Quando o medo e a dor se expandem, surge uma compreensão mais profunda do quão difícil a vida pode ser. Porém, o lado bom é o desenvolvimento de almas solidárias que desejam aliviar as dificuldades e o sofrimento em todas as suas manifestações.

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