Para a pediatra Ana Escobar, sim. Em seu novo livro, “Meu filho tá online demais” ela compartilha dicas e orientações para as famílias
Como estabelecer uma relação saudável com a tecnologia, já que é bem difícil viver sem ela? A pediatra Ana Escobar responde às principais dúvidas das famílias e traz algumas possibilidades de equilíbrio em entrevista exclusiva ao Lunetas, sobre seu novo livro “Meu filho
As horas escoam pelos dedos ágeis enquanto adultos e crianças navegam entre aplicativos e redes sociais. Afinal, os dispositivos digitais vieram para ficar. Por isso, a pediatra Ana Escobar esclarece as principais dúvidas e angústias relacionadas ao seu uso, nos 20 capítulos de “Meu filho tá online demais: equilibrando o uso das telas no dia a dia familiar” (Manole).
O texto didático e bem-humorado é um convite para que os adultos tomem as rédeas da situação, que em muitas famílias está fora de controle, e busquem maneiras de tornar a relação com as telas saudável para suas crianças (e também para si). Mas, antecipa o alerta: educar filhos nunca foi e nem será uma tarefa fácil.
“Não existe segredo nem mágica. Uma relação de confiança e segurança com os filhos se constrói com pequenas atitudes do dia a dia. O uso de eletrônicos é uma enorme oportunidade para que vocês possam construir um dos pilares desta relação”, destaca Escobar, em um trecho do livro.
Como encontrar o equilíbrio entre o domínio da tecnologia e uma vida física e mentalmente saudável é a grande busca dos adultos, para si e para seus filhos. No livro, Ana Escobar traz informações e reflexões importantes para esse equilíbrio. Além disso, divide conselhos de como lidar com problemas específicos na sala de aula ou em casa, como cyberbullying e uso excessivo de telas, por exemplo.
Em entrevista exclusiva ao Lunetas, a doutora Ana Escobar, que é também comunicadora em saúde e membro do Conselho Diretor do Centro de Desenvolvimento da Infância da Faculdade de Medicina da USP, esclarece algumas das principais dúvidas das famílias e dá dicas valiosas para colocar em prática quando o assunto é encontrar equilíbrio na relação das crianças com as telas.
Lunetas – O livro aborda aspectos positivos do mundo digital e também alguns desafiadores. O que fazer para que crianças e adolescentes tenham uma relação saudável com as telas e seus conteúdos?
Ana Escobar: O mundo digital veio para facilitar a vida das pessoas. Com ele, a gente teria mais tempo para fazer o que gostamos. Porém, acabou nos ocupando com coisas não tão boas. E isso chegou até as crianças. Por isso, é preciso aprender a dosar e a única forma é ensinando as crianças a usar de forma consciente. A relação saudável com as telas se constrói em casa, por meio de exemplos, regras e combinados: depois de fazer a lição, da refeição ou de acordo com a dinâmica de cada família. Assim como tem hora de entrar e sair da escola, dormir e comer, deve-se estabelecer um momento para usar as telas de modo recreativo.
O celular na escola é a questão do momento. Qual o papel da escola na construção de uma relação saudável com as telas?
AE: Eu particularmente acho que criança não tem que levar celular para a escola. Isso porque é um espaço de convivência, que possibilita momentos de troca, olho no olho, experiências e brincadeiras. Quando o celular está presente, todos pegam na hora do recreio e aí acaba a conversa. A vida escolar é um momento de ouro para incentivar a integração de todos. Esse espaço pode, então, contribuir para esclarecer entre crianças e adolescentes o que tem de bom e de ruim no mundo digital.
A vida escolar é um momento de ouro para incentivar a integração de todos.
Uma das principais dúvidas é a idade adequada para ter um celular. É possível pensar em uma idade mínima do ponto de vista médico/científico ou isso é uma decisão que cabe a cada família?
AE: A discussão sobre uma idade adequada ainda merece mais estudos científicos. No entanto, o que percebo é que as crianças estão ganhando celular cada vez mais cedo, em torno de 10 anos e até antes. Acredito que por volta de 12 anos seria a idade mais adequada para ter o seu próprio celular.
E para acessar as redes sociais?
AE: Para as redes sociais é outra situação. Segundo as próprias plataformas, a idade mínima para ter um perfil cadastrado é 13 anos. Alguns autores apontam que é inadequado antes dos 16 anos, o que fica bem difícil porque todo mundo tem, ninguém quer ficar de fora. É fundamental o uso regrado e com supervisão de adultos.
Cuidar da relação das crianças com as telas e os conteúdos consumidos traz ganhos no futuro?
AE: As crianças e os adolescentes têm que ser orientados sobre o uso de dispositivos digitais, quais conteúdos, canais, aplicativos podem ou não usar. Desse modo, na hora que a gente ensina a usar, isso é positivo para o futuro, ajuda a desenvolver a maturidade. No caso das crianças, entra também a supervisão indireta: elas devem usar as telas em locais em que estejam outros adultos, jamais sozinhas no quarto ou de fones de ouvido. Por exemplo, é importante saber o que estão vendo, o que assistem ou jogam e com quem falam para prevenir o contato com conteúdos inadequados e gente mal intencionada.
Além do WhatsApp, aplicativos como TikTok, Instagram e YouTube estão entre os mais usados por crianças e adolescentes. Que armadilhas esses apps e seus conteúdos podem apresentar e como as famílias podem se precaver?
AE: Para se precaver das armadilhas, os adultos precisam deixar claro os combinados, como os canais que podem ser vistos, e avisar que terão acesso a tudo que as crianças e os adolescentes consomem. A senha dos aparelhos também deve ser conhecida pelos responsáveis, até que haja mais maturidade ou a depender da relação de confiança que se constrói.
[O uso de apps] é uma liberdade vigiada e, sobretudo, supervisionada e orientada.
Quais são os sinais de alerta de que algo está errado com o consumo de conteúdos digitais?
AE: Os sinais de alerta são comportamentos que fogem do padrão e que podem significar ansiedade ou depressão. Entre eles, não querer mais sair com a família para jogar, não ter mais amigos, ficar isolado dentro do quarto, não querer conversar, não tomar banho ou trocar de roupa.
Quando detectados esses sinais de alerta, o que as famílias podem fazer?
AE: É preciso buscar ajuda. O primeiro contato pode ser com o pediatra, que já acompanha e conhece a criança ou o adolescente. Se há acompanhamento com outro profissional, como um psicólogo, é importante reportar essas mudanças para que juntos possam entender o que está acontecendo e como ajudar.
Além dos impactos dos conteúdos na saúde mental dos mais novos, o uso excessivo de telas também gera impactos à saúde física. Quando se preocupar e como encontrar o equilíbrio?
AE: Isso é fato, o uso excessivo de telas têm impacto nesses dois âmbitos da saúde. No corpo, porque leva ao sedentarismo e a uma alimentação inadequada, podendo ter como consequência a obesidade e doenças que se relacionam. Na mente, leva a um maior isolamento em uma fase em que a convivência coletiva é importante. Esse contato olho no olho ajuda a entender os sentimentos do outro, refletir sobre os seus e conversar. Outro aspecto impactado é a autoestima, porque nas redes sociais é tudo perfeito, bonito. Todos são como super-heróis. Nesse sentido, as crianças e os adolescentes veem aquilo que não têm e sua autoestima vai para o espaço.
Para equilibrar saúde física e mental e o uso das telas, a conversa é o melhor caminho.
Não é proibir, é ensinar a usar
“Não adianta proibir, porque vivemos no mundo digital e as telas fazem parte da vida de todos”, afirma a pediatra Ana Escobar. Mas, é importante ensinar às crianças e aos adolescentes a usarem as telas de forma consciente. Como? Ela indica três passos fundamentais: