Cadê a vacina? Ela foi aprovada, mas ainda não chegou aos bebês

Aprovada em setembro, vacina contra covid-19 ainda não está integralmente disponível para crianças de até 2 anos; Brasil vive nova onda com o aumento de casos

Eduarda Ramos Publicado em 09.11.2022
Um bebê de pele clara está deitado. Ele usa um capuz laranja.
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Resumo

Com falta de imunizantes, a vacinação contra covid-19 de crianças menores de dois anos é prejudicada; entre crianças de 3 e 4 anos, também são baixos os níveis de adesão à vacinação.

Em 2020, no início da pandemia e sem vacina, Larissa, 26, pegou covid-19 enquanto estava grávida de sua primeira filha e ficou com a saúde bastante debilitada. Em novembro de 2022, Larissa está vacinada, mas ainda não há previsão para que Sofia, hoje com dois anos de idade, receba a sua dose em Cachoeiro do Itapemirim (ES). A vacinação infantil contra covid-19 voltada às crianças de até dois anos ainda não tem calendário estipulado pelo Ministério da Saúde.

O caso de Larissa não é isolado e reflete uma série de atrasos na imunização infantil contra a covid-19 no país. A vacina da Pfizer voltada a crianças de 6 meses a 4 anos foi aprovada pelo Ministério da Saúde em 16 de setembro, mas o primeiro lote chegou ao Brasil em 27 de outubro. A princípio, as vacinas desta faixa etária podem ser aplicadas apenas em crianças com comorbidades, porém a decisão contraria especialistas do próprio Ministério da Saúde, que recomendam a vacinação imediata de todas as crianças. 

O Lunetas convidou Renato Kfouri, médico pediatra da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) e especialista em neonatologia e infectologia pediátrica para responder sobre o atraso na vacinação infantil, sintomas relatados nos consultórios e demais questões associadas a uma nova onda de casos de covid-19 com o aumento de testes positivos nesta semana e subvariantes da cepa ômicron no Brasil. Confira!

Bate-papo com Renato Kfouri

Lunetas – O atraso na vacinação infantil pode influenciar no surgimento de novas ondas de covid-19?
Renato Kfouri – O surgimento de novas ondas acontece em função do aparecimento de uma nova variante sobre uma população suscetível ao vírus, como pessoas não imunizadas. As crianças representam uma parcela pequena e podem até ter um grau de comprometimento, mas não é apenas isso que faz surgir uma nova onda. 

Que sintomas têm sido mais relatados pelas crianças com covid nos consultórios?
R.K. – Os sintomas são indistinguíveis de outras síndromes respiratórias, como tosse, febre, coriza, dor de garganta. Por isso, pode-se confundir o quadro com gripe, resfriado, bronquiolite, e atribuir os sintomas a outros vírus respiratórios.

A variante BQ.1 tem alguma diferença notável das variantes anteriores? Como ela expõe ainda mais crianças que ainda não foram vacinadas?
R.K. – A BQ.1 é mais transmissível por ter adquirido uma capacidade de escapar da vacina e por isso causa novas ondas da doença, mas assim funcionam as variantes: uma substitui a outra. Hoje, o protagonismo é das variantes B4 e B5, mas a entrada da BQ.1 deve substituir a circulação dessas variantes, assim como aconteceu em outros países.

Quais são os dados mais recentes de internações e óbitos entre as crianças?
R.K. – Em relação ao último boletim, temos só em 2022 mais de 14 mil hospitalizações em crianças menores de 5 anos por covid-19 e 450 óbitos. A cada dois dias uma criança menor de 5 anos é vítima fatal da covid-19 e nenhuma outra doença infecciosa faz tantas vítimas como a covid, sem contar as consequências a longo prazo, como covid longa ou síndrome inflamatória.

Segundo levantamento realizado pela Folha de S. Paulo, apenas 13,4% das crianças brasileiras de 3 a 4 anos iniciaram a imunização contra a covid-19, ou seja, uma em cada dez. Os números são extremamente menores comparados à imunização de crianças de 5 a 11 anos, faixa etária que possui adesão de 91,01% para a primeira dose dos imunizantes disponíveis, segundo o Portal G1. Além da covid-19, surtos de doenças como sarampo e hepatite, e risco de retorno da poliomielite são alguns prejuízos à saúde infantil decorrentes do baixo índice vacinal.

A vacina já foi aprovada para crianças a partir de seis meses. A que se deve o atraso para que ela chegue de fato ao grupo?
R.K. – A vacina da Pfizer foi aprovada a partir dos seis meses e a da Coronavac a partir dos três anos, mas falta vontade política – foi postergada a vacinação dos adolescentes, de crianças de cinco a 11 anos, e de novo isso se repete. A vacina para crianças a partir de seis meses foi aprovada no dia 16 de setembro pelo órgão regulatório, estamos prestes a completar dois meses da aprovação e só foram adquiridas 1 milhão de doses – o correspondente a pouco mais de 300 mil crianças imunizadas completamente, considerando que cada uma precisa tomar três doses (duas e um reforço).

Com a queda da obrigatoriedade do uso de máscaras, além da vacinação, o que mais deve ser feito para cuidar das crianças neste período?
R.K. –  Além de faltarem campanhas oficiais do governo que convoquem as pessoas a se vacinarem, fazendo mutirões, campanha à noite, nos fins de semana, vacinação domiciliar, busca ativa… os cuidados se mantêm: crianças e adultos sintomáticos devem usar máscara e manter isolamento; pessoas imunocomprometidas devem evitar aglomerações. 

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