"Se queremos um mundo melhor para os nossos filhos, é preciso mostrá-los ao mundo sem receio", defende Luísa Alves, do Guia Fora da Casinha
Transporte compartilhado ou público: mais do que ferramentas de mobilidade, estes espaços são verdadeiros símbolos de convivência urbana e mobilidade. Como eles recebem as crianças?
Na era da economia compartilhada e das alternativas colaborativas e coletivas para usufruir da cidade, o uso do transporte público ou compartilhado – como o Uber Pool, por exemplo -, são ótimas formas de economizar. Porém, uma reflexão é urgente: será que esses espaços estão preparados para receber crianças pequenas e bebês?
O incentivo à ocupação da cidade e à consciência sobre o direito à mobilidade começa na infância, mas como fazer isso se a própria postura dos usuários desses meios não for acolhedora e inclusiva?
Pensando nisso, o Guia Fora da Casinha, site que dá dicas de roteiros para fazer com as crianças em São Paulo, publicou um texto que é uma verdadeira defesa da ocupação do transporte público pelas crianças e os bebês, não só como espaços de locomoção, mas como símbolos do respeito ao outro e da participação ativa na sociedade: “Do metrô lotado ao Uber Pool: crianças não são empecilho para o transporte compartilhado”.
“Se queremos um mundo melhor para os nossos filhos, é preciso mostrá-los ao mundo sem receio. Talvez essa possa até ser nossa maneira de resistir ou protestar por visibilidade. Por direitos”, defende Luísa em texto publicado no site Guia Fora da Casinha.
“Cada vez que a gente sai de casa com a bebê de pouco mais de um ano, colecionamos histórias para contar sobre convivência de uma criança na “sociedade dos adultos”, ressalta Luísa Alves, editora do site e mãe da pequena Aurora.
“Com raras exceções gentis, ainda há quem enxergue crianças como algo incômodo. No fundo no fundo, pensam que lugar de pais com bebê é em casa. Pois quando se quer desconstruir essa ideia, nada mais coerente do que ocupar todo e qualquer espaço com um bebê.
“Não há outra forma de ser aceito ou promover reflexão que não seja problematizar ativamente”
No texto, Luísa atenta para o preconceito que deve ser combatido diariamente. Segundo ela, para os pais e mães que utilizam metrô e ônibus todos os dias, é natural se deparar com olhares de reprovação quando uma criança está chorando.
“É duro sermos julgados por pessoas que acreditam piamente que há um botão de liga e desliga nos sentimentos, nas vontades, nas dores das crianças. É cruel sermos apontados como pessoas que não são capazes de fazer os filhos pararem de chorar, de gritar ou mesmo de rir alto.
“É triste saber que muitas pessoas não lembram o que é ser criança”
A fala de Luísa faz pensar no próprio conceito de educação, já que muitas pessoas tendem a achar que uma criança é responsabilidade apenas da família, deixando de lado o fato de que um ambiente acolhedor às crianças é um lugar melhor para todos. Uma ‘cidade educadora’, afinal, é feita de pessoas acolhedoras.
Cada dia no transporte público é uma forma de mostrar o mundo para a criança e uma lição sobre convivência urbana.
Uma alternativa cada vez mais utilizada nas grandes cidades, o Uber se tornou uma facilidade na rotina de quem tem se locomover todos os dias com pouco tempo e recursos disponíveis. A versão colaborativa, o Uber Pool, no entanto, pode apresentar algumas barreiras quando se tenta utilizar com bebês ou crianças, já que o transporte é dividido com outras pessoas.
“Outro dia, ao entrar no Uber Pool com a Aurora no sling, o próprio motorista apontou para a bebê com desconfiança e disse: – A senhora sabe que pediu Uber Poll, né? Carro compartilhado. – completou. Eu só respondi um sim sorridente, sentei e abri um livrinho com a Aurora no colo. Não se pode haver drama onde não há. Eu que já ouvi tantas histórias dos motoristas reclamando do comportamento dos passageiros do pool: paqueras, bêbados espaçosos, falta de educação, sujeira. Pessoas adultas que não sabem compartilhar um percurso. Um bebê, curioso com o mundo, sedento por descobertas, deve ser “bonzinho” de calar-se, desaparecer enquanto for bebê?”, problematiza Luísa.