Diante do incêndio que acometeu o Museu Nacional, conversamos com profissionais de diversas áreas sobre a importância dos museus para as crianças
Diante do incêndio que acometeu o Museu Nacional, conversamos com profissionais de diversas áreas sobre a importância de frequentar museus com as crianças como um exercício de cidadania e valorização da memória do país.
Aqui no Lunetas, acreditamos que cidades acolhedoras só acontecem quando a criança não enxerga a cidade como um mero caminho entre sua casa e a escola, e sim como um espaço vivo e potente, com aprendizados, memórias, ancestralidade e, claro, Cultura.
O incêndio que acometeu o Museu Nacional do Rio de Janeiro na noite deste domingo, 2, destruiu um acervo precioso que testemunhava e preservava a História brasileira. O espaço, localizado na Quinta da Boa Vista, em São Cristóvão, Zona Norte da cidade, era o maior acervo de antropologia da América Latina, com mais de 20 milhões de itens catalogados. Áreas como Arqueologia, Palentologia, Antropologia e outras foram parcial ou totalmente destruídos – dentre os itens perdidos, está Luzia, o mais antigo esqueleto humano do continente americano, com 12 mil anos de idade. Equipes ainda estão trabalhando no local e não se sabe precisar ao certo o tamanho do prejuízo.
Por isso, os lugares que escolhemos para passear com os pequenos diz muito sobre qual cidade queremos apresentar. Assim, diversificar a oferta cultural das crianças é um ato político, é exercer a cidadania no período da vida em que o ser humano constrói suas primeiras referências de mundo.
Para repercutir os impactos do incidente, precisamos (ainda mais) falar sobre a importância do repertório cultural na formação e no desenvolvimento das crianças. Convidamos diversos profissionais de múltiplas áreas de atuação para refletirmos juntos sobre o assunto. Dentre eles, o paleontólogo Luiz Eduardo Anelli, autor de uma série de livros infantis e infantojuvenis que apresentam o assunto preservação da memória às crianças a partir dos dinossauros brasileiros – clique aqui para conhecer os livros.
Também contatamos a escritora Goimar Dantas, autora do livro “Rotas Literárias“, que se dedica a mapear e apresentar espaços e personagens de São Paulo que dialogam com a literatura. Mãe de dois filhos, ela defende o esforço familiar de valorizar os espaços culturais nas horas de lazer.
“Passei a vida levando os dois em museus de todos os lugares que visitávamos, mesmo sendo muito agitados quando crianças. Mesmo assim eu fazia questão”, conta Goimar.
A professora Marina Fontanelli atuou como educadora no Museu Histórico Nacional, e divide com o Lunetas suas lembranças do período, junto às crianças que frequentavam o espaço.
“Pude experenciar como é transformador para uma criança uma visita ao museu. Na verdade, tudo é uma aventura, o ônibus, a escada rolante, passear com os amigos e amigas fora da escola. Durante a visita, a cada objeto mostrado e história contada é uma surpresa, um comentário com o colega, uma pergunta, momentos que ficam marcados para sempre na memória”, relembra.
Ouvimos também a arquiteta Simone Sayegh e a jornalista Bianca Antunes, autoras do livro “Casacadabra“, que traz o tema cidades educadoras para as crianças. “Fomentar a ida a museus desde a infância é garantir cidadãos de pensamento crítico”, defendem.
Em nota oficial à imprensa publicada na fanpage do Museu, Alexander Kelner, diretor do espaço, é fundamental que o Governo Federal apoie a instituição neste momento.
“É uma enorme tragédia. A hora é de união e reconstrução”
“Infelizmente, ainda não conseguimos mensurar o dano total ao acervo, mas precisamos mobilizar toda a sociedade para a recuperação de uma das mais importantes instituições científicas do mundo”, diz o texto.
Arquivo pessoal/Goimar Dantas
Sobre a importância de levar as crianças a museus e outros equipamentos culturais e históricos: a ampliação do repertório começa em casa.
*Clique nas setas do lado direito das declarações para avançar para a próxima.
“ O gestor público, vulgo político, busca público. Se não há, o orçamento sofre cortes sucessivos até que na condição de abandono uma catástrofe acontece. Então, reforço o recado para que valorizem os equipamentos e programas culturais de que já dispomos”
Crédito da foto: arquivo pessoal
Rafael Gonzalez, estudante de Letras
“Todo ano chamas atingem museus, institutos, cinematecas, memoriais. Durante alguns dias, imprensa e redes sociais repercutem a indignação geral, porém, semanas depois, outro escândalo imenso apaga “o fogo” do anterior e, quando a gente se dá conta, tudo continua igual. Dá um cansaço infinito disso tudo.”
Crédito da foto: arquivo pessoal
Goimar Dantas, jornalista, roteirista e escritora
“O esquecimento da história social e das vidas que a compõem é um projeto político. Não esquecer, lembrar e elaborar coletivamente, também é um processo político e terapêutico. Nossa história, nossas palavras, nossas imagens, nossos trabalhos, é por onde nossa vida psíquica circula. Preservar esse acervo é preservar nossa saúde. Evitar que os queimem, também.”
Clínica Pública de Pscinálise
Clínica Pública de Pscinálise
“Às vezes, os museus podem parecer intimidadores, principalmente para crianças de classes menos favorecidas, mas é muito importante que elas frequentem esses espaços, sobretudo públicos, pois é direito do cidadão refletir desde pequeno sobre a história do país em que nasceu – até para enfrentar melhor a realidade -, e usufruir das atividades financiadas com dinheiro público.”
Crédito da foto: arquivo pessoal
Marina Fontanelli, professora e mestranda em História.
“Museus são locais inspiradores, capazes de estimular a criatividade, ajudando as crianças a responder questões antigas e, mais importante, a elaborar novas perguntas. Museus aumentam o seu repertório e ampliam a visão que têm do mundo.”
Crédito da foto: arquivo pessoal
Luiz Eduardo Anelli, palentólogo e escritor
“Eles apresentam à criança experiências e pontos de vista desconhecidos, onde ela protagoniza seu aprendizado. São uma oportunidade de entender o que vimos e vivemos hoje como parte de uma história; e que somos parte e construtores desse processo. Fomentar a ida a museus desde a infância é garantir cidadãos de pensamento crítico.”
Crédito da foto: arquivo pessoal
Bianca Antunes e Simone Sayegh, autoras do livro "Casacadabra"
“Atualmente, com todos os estímulos digitais e virtuais, temos uma observação passiva do mundo e a degeneração da expressão criativa. Levar uma criança ao museu amplia o repertório de imagens e contribui para o desenvolvimento de um olhar mais atento.”
Crédito da foto: arquivo pessoal
Carol Mattos, historiadora da arte e pesquisadora
“No Brasil, possuímos a formação da identidade do nosso povo com as culturas africanas e europeias, o que denota uma grande riqueza e diversidade. Para alcançarmos o exercício pleno da cidadania é preciso montar um currículo oculto que contemple a história do indivíduo com o país que habita. Assim, os Museus Nacionais se tornam ferramentas fundamentais nesse processo.”
Crédito da foto: arquivo pessoal
Ana Alice Barcelos, professora de História no Rio de Janeiro
“Museus são tecnologias de preservação e produção de memória e cultura a qual todxs, incluindo as crianças, deveriam ter acesso. Eles são uma forma alternativa àquela da escola para aprender, criar e promover sociabilização.”
Crédito da foto: arquivo pessoal
Lucas Oliveira, pesquisador, educador e artista visual
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