‘Meu filho ficou de recuperação’: o que fazer?

Entre a ansiedade e as cobranças do fim do ano letivo, especialistas defendem que famílias acolham e motivem as crianças que ficam de recuperação

Célia Fernanda Lima Publicado em 03.12.2025
Imagem de capa para matéria sobre recuperação escolar mostra uma mão de criança com um lápis e um papel rascunho.
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Resumo

A recuperação escolar causa medo e ansiedade nas crianças e adolescentes. Mas especialistas afirmam que o momento não deve ser entendido como uma punição e que as famílias e as escolas precisam acolher e motivar os estudantes.

“Como ele se perdeu durante o ano?”, “Por que tirou nota baixa se só estuda?”, “Parece que não aprende nada na aula”. Essas são as frases que a professora Jamile Moraes mais escuta antes das provas finais. Ela, que dá aulas particulares para crianças e adolescentes, nota que as queixas e os pedidos dos pais são frequentes. “Eles chegam aflitos, precisando de alguém que ajude o filho a passar de ano”. Ou seja, nessa reta final, todo mundo tenta fugir da recuperação escolar.

Para a cirurgiã dentista Danielle Augusta, buscar aulas particulares para a filha Katarina, 7 anos, foi um modo de deixá-la mais confiante para as avaliações ao longo do ano. “Ela nunca ficou de recuperação, mas, quando tirou as primeiras notas baixas, ficou tão apreensiva a ponto de pedir para sair da escola.”

A recuperação não deveria ser um momento de medo, e sim de esperança, já que representa uma nova chance de o estudante aprender o que ainda não conseguiu. No entanto, ainda costuma ser vista como consequência de um erro ou até como sinônimo de fracasso, como explica a psicopedagoga Marina Tiso. “A nota é apenas o reflexo de um momento, e não a definição do estudante, porque cada criança tem um ritmo de amadurecimento. Por isso, é natural precisar de tempos diferentes para consolidar o que aprende na escola.”

Como a pressão por notas e recuperação afeta as crianças?

A transição do ensino infantil para o fundamental, com uma dinâmica de tarefas e provas valendo nota, causou estranhamento em Katarina. A mãe lembra que a menina teve episódios de ansiedade, alergias emocionais e acordava com medo de ir para a aula. “Foi um trabalho de formiguinha, conversando, acalmando até conseguirmos ajuda profissional”, conta Danielle. “Nunca cobramos dela em casa, mas percebemos que a pressão vinha da antiga escola.”

A professora Jamile Moraes relata que encontra alunos ansiosos nessa época do ano. “É uma mistura de expectativa e preocupação porque alguns têm receio de decepcionar a família ou de levar broncas, mas também sentem vergonha dos amigos.”

Esse impacto emocional causado por notas baixas e recuperação pode ser profundo, afirma Marina Tiso. Por isso, a psicopedagoga aponta que, tanto a família quanto os professores, precisam rever a forma como falam sobre desempenho. “Quando um estudante demonstra sofrimento emocional relacionado à recuperação, o foco deve ser acolher, escutar e validar os sentimentos.”

Em casos de crises ou de ansiedade, Marina aconselha oferecer escuta e presença acolhedora. “Pergunte como a criança está se sentindo, valide a emoção e não minimize a reação dela porque isso aumenta o distanciamento.”

Imagem mostra Daniele, uma mulher branca de cabelo preto liso, sentada à mesa ao lado de Katarina, uma menina branca, de cabelo liso preto. As duas estão estudando com livros e canetas na mesa.
Katarina, 7 anos, sentiu a cobrança da antiga escola ao passar para o ensino fundamental. Apesar do diálogo constante com a mãe, Danielle Augusta, a menina só ficou menos ansiosa quando iniciou as aulas particulares.

Na recuperação escolar, acolher e motivar funciona melhor do que punir

Jamile Moraes reforça que não são apenas as crianças que precisam encarar a recuperação com calma, mas principalmente os pais. “A recuperação pode ser um alerta para reorganizar a rota e focar nas dificuldades. Por isso, a aula particular não deve ser apenas um salva-vidas na reta final, porque o aluno precisa de acompanhamento contínuo.”

Se a família não puder contar com a ajuda de um professor particular, o ideal é acompanhar os estudos com paciência e planejamento. Desse modo, os adultos responsáveis precisam dedicar um tempo de qualidade às crianças sem pressionar, mas se mostrando disponível para ajudar.

“Esses momentos são oportunidades para desenvolver habilidades de regulação emocional, autoconhecimento e construção de confiança que vai além da recuperação”, aponta Marina Tiso. Ela recomenda criar um ambiente calmo para o estudo e combinar um plano ou rotina com tarefas divididas em partes. “As famílias têm um papel fundamental para que as crianças entendam a recuperação como um momento de fortalecimento, não como punição.”

O planejamento, a presença da família e o ambiente escolar saudável fazem toda a diferença na aprendizagem das crianças. A psicopedagoga destaca que o apoio e a linguagem adequada ajudam na autoestima e na confiança para enfrentar a recuperação — ou o medo dela.

“Mais do que corrigir uma nota, a recuperação pode ser o momento em que a criança descobre que é capaz. E isso transforma sua relação com o aprender.” – Marina Tiso, psicopedagoga

Como lidar com as notas baixas e a recuperação na prática?

O que fazer?

  • Substitua críticas por escuta ativa;
  • Reforce a ideia de que errar faz parte do processo de aprender;
  • Crie rotinas leves de estudo, com pausas e incentivos;
  • Valorizem os avanços, mesmo que pequenos;
  • Demonstre confiança.

Como abordar?
Tente:

  • “Me conta como você está se sentindo com isso?”
  • “Entendo que parece difícil, mas você pode melhorar e vamos fazer isso juntos.”
  • “Você vai ter um tempo extra para aprender melhor.”

Evite:

  • “Você ficou de recuperação porque não estudou.”
  • “Isso não é nada.”
  • “Mas é tão fácil, como você não sabe?”

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