Mariana Sá, mãe e fundadora do Milc – Movimento Infância Livre de Consumismo – foi uma das convidadas que ressaltou a questão do autocuidado das mães. “Como a criança vai ser, se você não for”?, questionou. A paternidade apareceu com muita força em todas as falas. Para o terapeuta de família e colunista do Lunetas Alexandre Coimbra Amaral, a desconstrução do machismo estrutural não acontecerá facilmente. “Os homens foram iludidos pelo patriarcado e, por conta disso, vivem a vida pela metade”, disse. Respondendo a pergunta guia do evento, a jornalista Lorena Ifé trouxe uma provocação para os presentes: “Quando a gente fala de liberdade para crianças, é preciso fazer recorte da questão racial. Liberdade para quem”?
Partindo da ideia de que é necessário rever o modelo de escola que está posto, as falas propuseram saídas para transformar o espaço escolar. Para Maria Thereza Marcilio, fundadora da Avante – Educação e Mobilização Social, a escola precisa de apoio de outros atores para se rever. Dentro dessa perspectiva, Sonia Dias, coordenadora pedagógica da Escola Comunitária Luiza Mahin defendeu que dentro da escola é possível construir estruturas saudáveis para que as próprias crianças expressem suas vontades. Tudo isso anda de mãos dadas com a questão do território. “Para a escola ser um espaço de existência, ela precisa estar inserida em um lugar que permita isso”, defendeu Maria Thereza. Como se não bastasse todos os desafios que se impõem a educadores, a escola também se tornou um espaço em que as marcas e empresas elegeram para vender seus produtos. “O que a gente quer é que a criança SEJA em todas as suas questões, dúvidas, contribuições. E não que fique vulnerável ao estímulo consumista dentro das escolas”, pautou Ekaterine Karageorgiadis, advogada e coordenadora do programa Criança e Consumo.
A falta de espaços públicos para as crianças brincarem nos centros urbanos é uma realidade de todas as cidades do Brasil. As falas trouxeram a necessidade de organização para ocupar os lugares, no sentido literal da palavra. Foi assim que nasceu o projeto Crianças na UFBA – que tem por objetivo a ocupação do espaço universitário por crianças e suas famílias. “Temos a desinstitucionalização e o ‘não-consumismo’ como princípio. Ninguém vende nada e nem propomos atividades para que as crianças aprendam algo”, exemplificou Juliana Prates, fundadora do projeto. A ocupação, o ato de trazer vida a alguns espaços contribui para diminuição da violência, além de ser uma oportunidade de adquirir outros saberes e fortalecer laços comunitários de famílias e crianças.
O Lunetas Avista surgiu a partir de uma vontade de ampliar os olhares, ser plural, conhecer de perto as infâncias do Brasil, e fazer a conversa que o portal faz virtualmente, porém ao vivo. O objetivo é reunir qualquer pessoa interessada na temática da infância, conversar e compartilhar experiências, em um espaço de acolhimento e trocas.
Não é uma palestra convencional e sim um diálogo onde todo mundo tem tempo para falar e ser ouvido.
Hoje em dia fala-se muito das crianças como um símbolo do futuro, como a possibilidade de transformação da sociedade. Sim, é claro que elas são os adultos de amanhã. Mas é também verdade que muitas vezes essa afirmação faz com que nos esqueçamos de suas necessidades, vontades e sua potência de transformação no presente. Elas são o presente.
Como nós, adultos, a aldeia inteira necessária para cuidar de uma criança, podemos propiciar um ambiente seguro para que elas apenas “sejam”?