Segurança e infraestrutura adequada podem fazer com que os bebês e cuidadores tomem conta do espaço público
A plataforma Engatinhada Urbana discute mobilidade urbana na primeiríssima infância e propõe calçadas acolhedoras para todos. Conversamos com a urbanista criadora do projeto. Confira!
O cheiro de uma flor que surge, um aroma diferente, novas cores que chamam a atenção, sons e ruídos das ruas, a textura das pedrinhas da calçada. Um universo inteiro de possibilidade e análise científica pode acontecer numa calçada enquanto um cuidador passeia com um bebê no sling, no colo ou carrinho.
A urbanista Heloisa Barbeiro pôde viver estas sensações no pós-parto morando na cidade de São Paulo com o filho Francisco, hoje com um ano. “Via que ele aproveitava e conhecia cada detalhe do percurso. No entanto, ao mesmo tempo, percebi que esse trajeto também podia ser bastante cruel: as calçadas não são seguras, às vezes inexistentes, ainda existe bastante assédio (infelizmente), o que faz com que muitos cuidadores optem por deslocamentos motorizados, perdendo todas as maravilhas que existem em nos adaptarmos ao balanço do caminhar e ao ritmo da primeiríssima infância”.
Destes incômodos e questionamentos nasceu a Engatinhada Urbana, plataforma colaborativa que incentiva a mobilidade do ponto de vista da primeiríssima infância. “Isso significa que as cidades devem ser pensadas com o olhar dos bebês, porque, assim, elas abrangerão as necessidades e demandas de todas as pessoas de todas as idades”, defende a urbanista.
Na opinião de Heloisa, toda esta falta de acolhimento faz com que famílias com bebês acabem ficando restritas a “caixas”: a caixa da casa, depois a caixa do carro, depois a caixa do shopping, a caixa da casa de alguém.
“Isso fica muito claro quando olhamos os espaços públicos: cadê os bebês? Algumas ilhas de qualidade, com algumas praças em poucos bairros da cidade, concentram uma quantidade enorme de bebês e crianças, mas na verdade, a cidade inteira deveria ser deles. E não é necessário muito”
Só a segurança e a infraestrutura adequada são capazes de fazer com que bebês e cuidadores tomem conta do espaço público e possam usar a rua para se desenvolver e se relacionar, descobrindo todas as potencialidades de estar em comunidade.
Os eventos organizados pela plataforma têm o objetivo de trazer os bebês para as calçadas e discutir as necessidades e benefícios dos deslocamentos a pé (chamada carinhosamente de mobilidade doce) com os cuidadores. “Fazemos percursos entre praças ou ao redor de quarteirões em um cortejo musical, colocando os ‘curativos urbanos’ onde vemos que a ‘calçada está dodói’. É, ao mesmo tempo, lúdico, musical e crítico”, demonstra a urbanista.
Outra questão que impede o pensamento de uma cidade acolhedora para bebês é a percepção social de não considerar o bebê como cidadão que deveria ser “consultado”. Heloísa propõe que façamos o exercício de nos colocarmos com os olhos dos bebês. “Isso faz com que o planejamento urbano pare de pensar de forma tecnocrata e segregadora, que formula e promove espaços isolados, os ‘parquinhos’ – o local de bebês e crianças – controlados e higienistas”.
A Engatinhada Urbana propõe justamente o contrário, que a cidade inteira seja dos dos bebês. “Não se trata só de espaços de brincar, mas de trajetos, deslocamentos, descobertas e cidadania. Se entendemos que o olhar e necessidades dos bebês são a forma de planejar a cidade, todas as pessoas serão atendidas por elas”, finaliza.
A ideia da plataforma é que os resultados desses percursos sejam apresentados às subprefeituras e que e se incentive formas de remodelamento e reformas de calçadas.
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