O recorde de focos de incêndios de agosto alerta para a má qualidade do ar nas cidades e os impactos na saúde das crianças; saiba como evitar complicações
A saúde da população de dezenas de cidades paulistas e outras capitais ficou comprometida com os incêndios florestais dos últimos dias. Saiba o que foi feito para evitar os danos da contaminação do ar e como proteger crianças e adolescentes dentro de casa e nas escolas.
Desde o início do ano, mais de cinco mil focos de incêndio foram registrados no país inteiro. O último fim de semana atingiu marcos históricos, com mais de dois mil registros de fogo em matas e canaviais somente no estado de São Paulo. Foram 48 cidades em alerta máximo de fogo alto e perigo à população. Por isso, rodovias foram fechadas, famílias tiveram que deixar suas casas e as aulas em vários municípios foram suspensas até o controle total dos incêndios e da fumaça.
Como os ventos fortes podem levar a fumaça dos incêndios florestais a viajar quilômetros de distância e a chegar próximo de casas e escolas, a saúde das crianças e adolescentes fica ainda mais exposta. Então, Raquel Baldaçara, médica da Comissão de Biodiversidade, Poluição e Clima da Associação Brasileira de Alergia e Imunologia, recomenda “buscar abrigo em outro local, manter as crianças hidratadas e, se necessário, usar máscara N95”. Além de poder agravar alergias e doenças respiratórias, como asma e fibrose cística, por exemplo, “a exposição à poluição também piora a qualidade de vida, aumenta o estresse e compromete a saúde mental das crianças”.
Ribeirão Preto, uma das cidades no interior paulista mais afetadas, ficou coberta por uma fumaça densa e tempestade de areia. Foram 14 focos de incêndio em dois dias. Além de faltar abastecimento de água e energia elétrica para parte da população, a rede municipal de saúde teve uma sobrecarga de 60% no pronto-atendimento.
De acordo com a Secretaria de Estado da Saúde, as salas de medicação, inalação e nebulização das Unidades de Pronto Atendimento (UPAs) ficaram lotadas no fim de semana. Assim, para conter os danos à saúde da população, a prefeitura anunciou uma série de ações emergenciais:
Nas últimas semanas, além de São Paulo, a fumaça de incêndios florestais também atingiu outras capitais brasileiras, como Brasília, Goiânia e Belo Horizonte. Diante da falta de explicação natural para a proporção das chamas, o governo acionou então a Polícia Federal para apurar as suspeitas de ação criminosa em queimadas tanto no interior paulista quanto no sul da Amazônia e arredores.
Todas as escolas municipais de Ribeirão Preto e unidades de ensino de mais 11 cidades do estado de São Paulo iniciaram a semana sem aulas. Para Raquel Baldaçara, essa foi a medida mais prudente a ser tomada. Como a fuligem e as cinzas entraram nos prédios, são necessárias providências para evitar a contaminação. Afinal, substâncias tóxicas como o monóxido de carbono e outras micropartículas podem atingir a corrente sanguínea. Portanto, segundo ela, “as escolas devem manter uma higienização rigorosa das salas de aula e manter a limpeza adequada dos aparelhos de ar-condicionado.”
Outra preocupação deve ser a umidificação das salas de aula. Isso porque não é bom ter um ambiente com excesso de umidade, pelo risco de proliferação de fungos, nem que fique abaixo de 40%. Então, “o ideal é que a umidade do ar permaneça entre 40 a 60%”, explica a médica.
Após comparar os planos de emergência apresentados por nove países (Brasil, Chile, Colômbia, Equador, Estados Unidos, México, Espanha, França e Inglaterra), o estudo “Qualidade do ar em alerta”, realizado pelo Instituto Alana e pelo Instituto Ar, mostrou que fechar as escolas que estão em zonas críticas de poluição é uma das medidas mais eficazes para proteger a saúde de crianças e adolescentes.
Embora as prefeituras optaram por suspender as aulas desta vez, não existem “recomendações ou protocolos do que fazer em episódio crítico de poluição do ar no Brasil”, diz JP Amaral, gerente de Natureza do Instituto Alana. O país ainda segue padrões de qualidade do ar estabelecidos em 1990.
Ou seja, mesmo os índices atuais de poluição serem cinco vezes mais altos do que o de outros países da pesquisa, o alerta demora a acontecer oficialmente por causa dessa defasagem. Consequentemente, a população fica mais tempo exposta à poluição sem intervenção adequada, em especial as crianças, que são mais vulneráveis.
No Brasil, só em maio deste ano foi instituída a Política Nacional de Qualidade do Ar (Lei 14.850). Nesse sentido, o Governo Federal, junto ao Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), deve garantir um ar mais limpo para a população. Para isso, a partir de janeiro de 2025, vai atualizar os limites máximos para a emissão de poluentes e monitorar a qualidade do ar em todos os estados.
Existe um plano de ação quando a contaminação do ar atinge o nível limite estabelecido pela legislação do país. Isso envolve, por exemplo, a suspensão das aulas em toda a área exposta aos poluentes e, em alguns casos, a evacuação da população afetada.
Os primeiros sinais de alerta acontecem quando a qualidade do ar está no modo “moderado”. Assim, logo se recomenda a redução gradativa de tempo e intensidade das atividades ao ar livre. Em níveis mais altos, a recomendação é não realizar atividades externas e controlar as atividades em ambientes fechados. Já as escolas devem prestar atenção em possíveis sintomas em estudantes que são mais sensíveis às consequências da poluição.
Os “programas estratégicos horizontais” visam a melhoria constante da qualidade do ar a partir de pesquisas.
Ações como reduzir o tráfego de veículos, construir ciclofaixas, áreas verdes e parques fazem parte da rotina das pessoas. No entorno das escolas, sensores monitoram os índices de poluição do ar.
Fonte: Comissão de Biodiversidade, Poluição e Clima da Associação Brasileira de Alergia e Imunologia (ASBAI)
Conforme o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), o mês de agosto atingiu um volume de registros dez vezes maior em relação ao mesmo período do ano passado. De acordo com o instituto, a combinação do tempo seco na Amazônia e no Pantanal, junto às altas temperaturas no Centro-Oeste e os incêndios em São Paulo fazem aumentar consideravelmente as estatísticas.