O novo Plano Nacional de Educação quer combater as desigualdades e melhorar a qualidade de ensino para todos. Como o “GPS do ensino” impacta escolas e famílias?
Um novo Plano Nacional de Educação (PNE) está tramitando no Congresso. Entenda qual o impacto do PNE na comunidade escolar, inclusive na vida dos estudantes, e como participar desse projeto de lei que define os rumos do ensino no país.
Apesar do sonho de uma educação de qualidade e acessível para todos, poucos sabem que o principal mecanismo para elevar os níveis de ensino no Brasil chama-se Plano Nacional de Educação (PNE). Com força de lei, o plano impacta a vida da população ao regular toda a rede de ensino nacional, pública e privada. Assim, direciona as ações relacionadas ao ambiente escolar, formação dos professores, vagas para os estudantes, financiamento da educação, entre outras questões.
O atual PNE 2014-2024 venceu, mas sua vigência foi prorrogada até o final de 2025. Desse modo, estamos em fase de transição para um novo plano. Em junho, o Ministério da Educação e Cultura (MEC) apresentou ao Congresso o PNE 2024-2034. Com 18 objetivos apoiados em 58 metas em resposta aos maiores desafios da educação, “esse projeto demanda uma discussão com qualidade, mas o mais rápido possível”, diz Brenda Prata, especialista de advocacy do Instituto Ayrton Senna.
“É um plano de Estado, não de governo. É um consenso nacional do que se espera da educação”, Luis Marcio Barbosa, diretor do Colégio Equipe
A novidade mais marcante, que atravessa todo o novo PNE, está no empenho em ofertar uma aprendizagem com equidade. Além de mirar a redução das diferenças de acesso à educação entre grupos socioeconômicos, um objetivo inédito trata da desigualdade étnico-racial e regional. Assim, visa à melhoria das condições de ensino dos indígenas, quilombolas e da população do campo. A proposta ainda amplia a meta voltada para o público da educação especial, que já está na edição vigente.
Sobre a universalização da educação infantil e a valorização da creche como espaço que exige profissionalismo e método, Luis Marcio Barbosa, diretor do Colégio Equipe, em São Paulo, diz ser benéfica, pois já está comprovado que as crianças que entram mais tarde na escola costumam ter mais dificuldades de aprendizagem. “Sabemos que, se as crianças não são acolhidas no contexto escolar nessa faixa etária [até cinco anos], é muito difícil que elas consigam ter uma escolaridade adequada depois”, diz.
Uma alteração substancial do novo Plano é o objetivo de alfabetizar as crianças até o 2º ano, e não mais até o 3º. Outras novidades são os parâmetros de qualidade definidos para a educação infantil, para a Educação Profissional e Tecnológica (EPT), para o ensino superior e para a formação dos docentes.
Também se propõe a ampliação da oferta de educação em tempo integral na rede pública. Ou seja, aumentar o número de escolas públicas que oferecem mais carga horária com base em um currículo construído para desenvolver habilidades de forma intencional. “A educação integral desenvolve o estudante para múltiplas dimensões, não só a dimensão cognitiva”, afirma Brenda.
Outro ponto – que aparece pela primeira vez – fala sobre ampliar a conexão das escolas à internet e garantir aos alunos uma educação digital, com visão crítica, reflexiva e ética.
Essas propostas passarão por avaliação até o fim de 2025 e poderão ser — em maior ou menor medida — alteradas. Para isso, o MEC pede a promoção de um amplo debate com a participação da sociedade, envolvendo todas as regiões do país.
Para Brenda Prata, além de falar mais sobre a importância do PNE, seria interessante que o Congresso criasse mecanismos de consultas e audiências públicas. Isso para que “os educadores não sejam só os aplicadores de políticas públicas, mas também participem do planejamento, assim como as famílias”.
Nesse sentido, para quem deseja participar dos debates, a pedagoga Indira Castellanos, que contribuiu ativamente na elaboração do atual PNE, sugere encontrar um movimento social com o qual cada um se identifique e que esteja engajado no processo. “É preciso fazer parte de um grupo para se envolver na elaboração dos Planos. Mas essa mesma estrutura, que dificulta a participação de forma independente, é fundamental para garantir que tudo se desenvolva com regras claras e iguais para todos”, afirma. Segundo ela, todo mundo precisa jogar o mesmo jogo: apresentar propostas, defendê-las com argumentação e se articular.
Com o plano para os próximos 10 anos já encaminhado, agora, o espaço para a participação da sociedade em geral vai depender da abertura que o Congresso der na etapa de ajustes finais do projeto, antes que vire lei.
Embora apenas quatro metas do PNE 2014-2024 tenham chegado a 100%, boa parte do total de 56 metas impulsionou avanços significativos. Dessa forma, 26 metas ficaram em 80% ou mais do objetivo final, outras 14 ficaram entre 50% e 80%, e nove alcançaram menos de 50%. Entre os principais entraves estão a falta de acompanhamento do andamento do plano e a falta de responsabilização dos gestores públicos, caso se desviem da rota.
Ao descrever os 18 novos objetivos de forma ainda mais generalista, com objetivos menos precisos e difíceis de mensurar, tais questões permanecem na proposta do futuro PNE.
Cada um dos objetivos gerais traz estratégias que devem ser implementadas e metas a serem cumpridas no prazo de 10 anos. Isso permite atravessar, pelo menos, três mandatos sem que o PNE fique atrelado a nenhum governo ou partido político. Desde os anos 1960, com a criação do primeiro Plano, o debate para a sua formulação é um marco democrático para o Brasil. Isso porque o documento-base teve ampla participação da sociedade civil a partir do Fórum Nacional de Educação e das etapas locais e final da Conferência Nacional de Educação (Conae). A implementação depende da ação articulada entre as instâncias municipal, estadual, nacional e do Distrito Federal.