Percepções equivocadas sobre custos e outras barreiras culturais dificultam transformações desejadas pela maioria dos brasileiros
Em comparação com outros países, o Brasil está atrasado quando o assunto é uma licença-paternidade ampla e justa. Barreiras culturais e políticas estão entre os desafios enfrentados para ter um tempo de licença maior.
De acordo com uma pesquisa realizada pelo Datafolha, 76% dos brasileiros concordam que o direito à licença-paternidade deveria ser maior. Assim, nesse período, o pai pode apoiar a mãe durante o parto, se conectar com o bebê e compartilhar os cuidados no dia a dia. Mas, apesar dos benefícios de mais tempo de licença, segundo a advogada Ana Carolina Caputo, ainda prevalece o entendimento de que cuidar dos filhos é responsabilidade só das mães.
Para Caputo, essa decisão pode abrir “uma janela de oportunidade crucial para avançarmos na construção de um país mais justo e igualitário”. Isso porque pode proporcionar “condições reais para a melhoria da saúde e do bem-estar dos pais, o desenvolvimento dos filhos e o crescimento da sociedade como um todo”. Ela faz parte da CoPai, uma coalizão formada por diversas organizações que defendem a licença estendida, remunerada e obrigatória.
Segundo a advogada da CoPai, a curta licença-paternidade no Brasil se deve a tradições culturais, a percepções equivocadas sobre seus custos e impactos sociais, e à falta do interesse político para legislar sobre o assunto. “Ao contrário de outros países, há pouco entendimento acerca de uma conclusão a que muitos já chegaram: a licença-paternidade é, na verdade, um investimento, uma das chaves para o desenvolvimento social.”
Quando empresários são os que menos concordam com a ampliação da licença-paternidade, somando 67%, segundo a pesquisa Datafolha, Ana Carolina Caputo comenta: “Muitos empresários e políticos ainda não enxergam o potencial transformador e os inúmeros benefícios decorrentes dessa regulamentação, inclusive para a própria economia e para o setor produtivo de modo geral.”
Para Caputo, uma abordagem colaborativa e mobilização popular podem ajudar o PL a avançar. “Coletivos, organizações não governamentais, sindicatos e outros grupos interessados na ampliação dos direitos dos pais (e também das crianças!) devem se unir”, diz. “Se os pais igualmente se conscientizarem da grandiosidade dessa implementação, para que possam assumir (por dever e por direito) o nobre papel de moldar uma vida, serão grandes aliados e protagonistas dessa mudança com a qual tanto sonhamos.”
Um levantamento da Organização Internacional do Trabalho (OIT), de 2022, mostra que 115 países oferecem licenças-paternidade, com duração média de 9 dias. Mas, apenas 102 têm licença remunerada.
Apenas 234 milhões de homens em idade reprodutiva, ou 11,8% de todos os potenciais pais (homens de 15 a 49 anos), residem em países com licença-paternidade superior a 10 dias. Desses, cerca de 10% vivem nos 36 países que oferecem licença-paternidade entre 10 e 15 dias.
Países como Chile, México, Nicarágua, Vietnã e Zâmbia também oferecem cinco dias de licença-paternidade.
Sim, isso acontece em Malta, Nigéria, Senegal, Angola e Barém.
Na Europa e na Ásia Central, 68,8% dos potenciais pais vivem nos 43 (de 53) países onde há pelo menos um dia de licença-paternidade. Já na Ásia e no Pacífico, apenas 18,4% dos potenciais pais vivem nos 18 (de 33) países onde há pelo menos um dia de direito à licença.
Desde 1988, a Constituição Federal garante o direito de licença para pais e mães. O prazo atual da licença-paternidade no Brasil é de cinco dias corridos, mas algumas empresas podem estender esse período para até 15 dias por meio do programa voluntário Empresa Cidadã, totalizando 20 dias de licença. No entanto, de acordo com um relatório do Instituto Promundo, de 2019, 68% dos pais não usufruíam nem do benefício previsto na lei. Agora, o Brasil está prestes a regulamentar a licença-paternidade. Nesse sentido, o Projeto de Lei 6216/2023 determina a ampliação gradual da licença-paternidade até se chegar a 60 dias.