Filme discute masculinidade e opressão emocional. 'O homem reage ao desamparo com violência', diz o sociólogo Túlio Custódio em documentário inédito
Que tipo de homens formamos quando oferecemos aos meninos uma educação que não ensina a chorar, ser sensível ou demonstrar vulnerabilidade? Confira o filme "O silêncio dos homens".
“Você precisa ser forte”, “menino não chora”, “isso é coisa de menina”. Os estímulos (ou desestímulos) que as crianças recebem na infância compõem os seus primeiros referenciais de mundo. É na fala e no comportamento dos adultos que os pequenos aprendem o que é permitido, bem visto, socialmente aceitável, certo e errado. O documentário brasileiro “O silêncio dos homens” estreou ontem, está disponível online na íntegra, e surgiu para discutir essas questões a partir dos modelos de masculinidade aprendidos na infância.
O intuito do longa, produzido pelo Papo de Homem e realizado pela Monstro Filmes, com pesquisa do Instituto PdH e apoio institucional da ONU Mulheres e da Campanha Eles por Elas, é refletir sobre como as masculinidades são construídas nos primeiros anos de vida, e reverberam muitas vezes de modelos nocivos que prejudicam não só a autoimagem dos homens, mas também as relações que ele cria.
Que tipo de homens formamos quando oferecemos aos meninos uma educação que não ensina a chorar, ser sensível ou demonstrar vulnerabilidades? Assim, a produção demonstra quais os impactos que a educação pautada em desigualdade de gênero sobre a identidade dos homens, e como essas consequências contribuem para a permanência da cultura de violência que afeta homens e mulheres.
“O silêncio dos homens” traz depoimentos de homens e profissionais ligados à saúde mental e sociologia, além de dados de uma pesquisa do Consórcio de Informações Sociais (CIS) da USP (Universidade de São Paulo). que ouviu mais de 40 mil pessoas em questões relacionadas à masculinidade.
“O homem não pode agir como ele gostaria de ser, por conta de tudo o que foi ensinado a ele de como um homem deve ser”, afirma o sociólogo Túlio Custódio, pesquisador da curadoria de conhecimento Inesplorato.
“Ele [o homem] reage ao desamparo com a violência”
O impacto da masculinidade desconectada da educação socioemocional também aparece no filme atrelada à paternidade, em depoimentos que contam como isso afeta a relação com os filhos. O agricultor José Antônio Ciríaco Neto compartilha que se tornar pai trouxe a percepção de como sua própria educação foi baseada em exemplos de autoridade excessiva e violência.
“Tudo isso me oprimiu até eu ouvir minha esposa dizer ‘estou grávida’. Eu quero para o meu filho coisas diferentes das que o meu pai fez comigo”, conta Ciríaco.
O filme provoca também uma reflexão sobre o fato de que a masculinidade não está cultural e historicamente ligada ao cuidado, o que começa na educação infantil, considerando que há poucos homens na profissão de pedagogo – leia a matéria do Lunetas sobre o porquê de haver tão poucos homens na educação infantil.
Desde a primeira infância, os meninos crescem praticamente sem ver os homens exercendo o papel de cuidador. Segundo o Censo do Professor, do Inep, somente 2% de professores homens ocupam vagas na educação infantil. Tudo isso impacta a forma como as crianças percebem o que é o modelo de masculinidade vigente, e como elas devem reproduzi-lo.
Raquel Franzin, coordenadora de Educação do Instituto Alana, trabalhou como professora de creche e traz exemplos de como a diferenciação entre meninos e meninas acontece na prática, na própria percepção do que é o cuidado e de quem tem prioridade sobre ele.
“A gente aceita os meninos sujos, com o nariz escorrendo, com a troca de fraldas demora. Já com as meninas temos uma tolerância menor. E com os bebês e meninos negros, deixamos ainda mais para o final da fila. Eles são os últimos a serem cuidados”.
Assista ao filme “O silêncio dos homens na íntegra”, e aproveite para compartilhar com os homens que você conhece:
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