"A natureza tem a força necessária para despertar um campo simbólico criador na criança”, disse Gandhy Piorski
Do ponto de vista da criança, a natureza é o meio no qual ela poderá estar mais livre e conectada com sua essência.
Evidências científicas apontam que a natureza é importante para o desenvolvimento infantil em todos os seus aspectos: intelectual, emocional, social, espiritual e físico. A natureza educa.
Ao que parece, o contato com a natureza na infância (assim como em todas as outras etapas da vida) pode reduzir significativamente os sintomas de Transtorno do Deficit de Atenção e Hiperatividade.
“Os pediatras estão entre os profissionais de saúde mais abertos à ideia de atividades na natureza como uma forma de terapia e prevenção de problemas de saúde. Eles estão começando a “prescrever” a natureza”, comentou Richard Louv em entrevista ao Lunetas. Ativista, autor de nove livros, e fundador da Children & Nature Network, Louv cunhou o termo ” transtorno de deficit de natureza”, se referindo aos impactos negativos causados pela vida distante de meios mais naturais.
No livro “Vitamin N: The Essential Guide to a Nature-Rich Life“, em tradução livre: ‘Vitamina N: um guia essencial para uma vida mais rica em natureza”, o autor apresenta dicas simples e criativas para estar com as crianças ao ar livre, e assim criar uma ligação duradoura com o mundo natural.
Confira algumas:
Do ponto de vista da criança, a natureza é o meio no qual ela poderá estar mais livre e conectada com sua essência. “Quando a imaginação da criança encontra a natureza, ela se potencializa e se torna imaginação criadora. A natureza tem a força necessária para despertar um campo simbólico criador na criança”, disse Gandhy Piorski, artista plástico que pesquisa as práticas da criança e a relação entre criança e natureza.
É galho que vira espada e folha que vira um barquinho. Os materiais da natureza também podem se transformar nos mais diferentes brinquedos e objetos:
Além de uma possibilidade mais ativa de brincadeira, e também uma forma da criança se aproximar e aprender sobre o ciclo de vida dos seres vivos no planeta -e consequentemente sobre sua própria alimentação – estudos indicam que a brincadeira ao ar livre – por proporcionar mais movimento – também está associada à menores índices de obesidade infantil.
Uma vida mais ativa, que inclua subir em árvores, correr para todo canto e dar cambalhota na grama traz possibilidades para a criança se conhecer, gastar energia e usar seu corpo, mas também traz oportunidades para a criança avaliar e a correr riscos, cair e levantar, se machucar e curar. São momentos para desenvolver a autonomia de escolher os riscos que quer correr, gerenciá-los e aprender sobre eles.
Motivos para aproximar crianças da natureza não faltam. “É de graça, é saudável e você não precisa viajar para um parque nacional”, argumenta Lais Fleury, coordenadora do projeto Criança e Natureza do Instituto Alana. Nutrindo um olhar mais sensível e atento, rapidamente a natureza passa a fazer parte da rotina das famílias. Seja por meio de passeios em praças e parques ou por meio de momentos dedicados à olhar as estrelas.
Diversos estudos científicos propõem-se a investigar os impactos da presença e ausência da natureza no ambiente escolar. Em artigo publicado no Oxford Journal pesquisadores defendem, por exemplo, que nas áreas verdes da escola as crianças brincam de forma mais criativa e cooperativa.
Um outro estudo realizado nos Estados Unidos mostra que, em escolas que usam a natureza como sala de aula, há uma melhora significativa no desempenho dos alunos em estudos sociais, ciências, artes da linguagem e matemática.
Em países como Dinamarca, Suécia e Noruega, as escolas e o ensino infantil são pensados e estruturados para priorizar a brincadeira livre e o contato das crianças com a natureza.
Conhecidas como “Escolas da Floresta”, essas escolas, cada vez mais comuns em países como Canadá, Estados Unidos, Inglaterra, Dinamarca, Suécia e Noruega – não têm salas de aulas e as atividades acontecem no meio da floresta.
Aqui no Brasil também há escolas com práticas pedagógicas que reconhecem a importância da natureza no aprendizado das crianças. Em Novo Hamburgo, no Rio Grande do Sul, a rede de ensino infantil traz uma experiência inspiradora -posteriormente transformada em política pública – nesse sentido.
Fruto de um processo de oito anos, a experiência deu origem a um roteiro de composição dos pátios escolares que está presente em todas as 32 escolas da rede.”O pátio da escola precisa ser rico de natureza e de possibilidades para o desenvolvimento integral da criança”, disse a bióloga Rita Jaqueline Morais, assessora pedagógica de Educação Infantil da Secretaria Municipal de Educação da cidade.
As hortas também ganham destaque como espaço de aproximação da natureza e aprendizagem. As escolas municipais do Embu das Artes, na grande São Paulo, implementaram um projeto de “Hortas Educativas”, e com ele transformaram a relação das crianças com os alimentos.
“Eles colhem, levam para a cozinha da escola e fazem com a professora uma receita. Depois, recebemos os relatos das mães dizendo que as crianças pediram em casa para repetir a receita da escola, com legumes e verduras”, disse a diretora da E.M. Maria Iluminata, Maria de Lourdes Ferreira, sobre o projeto.
Criar crianças conectadas com a natureza é uma uma questão, também, de manutenção do futuro do planeta. A criança que convive com o meio natural e desenvolve afinidade em relação à natureza aprecia e zela pelo mundo à sua volta porque o respeita e o reconhece como seu ambiente de pertencimento.
O distanciamento das crianças da natureza é uma realidade cada vez mais preocupante, com a avalanche de opções tecnologias de lazer e a escassez de áreas verdes nas cidades. Por isso, é importante criar mecanismos de reaproximação. Uma iniciativa importante de destacar neste sentido é o Movimento Slowkids. Periodicamente, o movimento leva à praças e parques de grandes cidades um dia com atividades 100% gratuitas que integram natureza, brincar livre, e família.
Veja vídeos gravados com cenas das últimas edições do Slowkids:
Outro projeto importante de destacar é o “Natureza em Família”, iniciativa do projeto “Criança e Natureza”, do Instituto Alana, que lançou um manual gratuito para que as pessoas possam organizar passeios e atividades em praças e parques. Além de proporcionar às crianças os benefícios da experiência do livre brincar e contato com a terra e as plantas, a iniciativa propicia também uma abertura para uma conversa urgente no ambiente escolar e familiar: como podemos melhorar o uso do espaço público e gratuito?
“O objetivo do clube é fazer com que as pessoas sintam a importância do momento desse convívio com a natureza e extraiam dessa experiência tudo de positivo que ela pode trazer. Entre os benefícios, estão o aumento da sensação de segurança por estar em companhia de outras pessoas, a motivação por ter a presença de outros adultos e crianças e o baixo custo, pois as áreas verdes urbanas, em sua maioria, não têm taxa de acesso”, explica Laís Fleury, diretora do Instituto Alana no Rio de Janeiro.
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