É imperativo unir a agenda climática com a agenda da infância, pois crianças e adolescentes estão entre as populações mais vulneráveis às mudanças climáticas
O advogado Danilo Farias reflete sobre a importância da cooperação intersetorial e da destinação de recursos da governança do clima para priorizar a agenda da infância, pois crianças e adolescentes são as populações mais vulneráveis à crise climática.
Muitos são os problemas enfrentados pela agenda da infância no que se refere à garantia de direitos frente à emergência climática, que tem apresentado inúmeros desafios para o desenvolvimento integral de crianças e adolescentes.
A crise climática é uma preocupação para todo o planeta, pois o cenário de indução das mudanças climáticas causado pelo homem tem alcançando níveis inimagináveis e acentuado as consequências socioambientais desiguais e prejudiciais aos direitos à vida, à saúde, à alimentação e ao meio ambiente saudável de crianças e adolescentes.
Algumas pesquisas têm mostrado como a infância é mais vulnerável às mudanças climáticas. A Organização Internacional Terre des Hommes apresentou, em 2012, um estudo que reporta o quadro preocupante de que as mudanças climáticas afetam cerca de 175 milhões de crianças no mundo.
O Fundo das Nações Unidas para a Infância destacou em seu relatório intitulado “Limpe o ar para as crianças” que a poluição do ar é uma das causas desse cenário, contribuindo para o agravamento das mudanças climáticas e impactando crianças e adolescentes com problemas respiratórios, gerando doenças vetoriais e cardiovasculares para a vida adulta.
Um recente estudo da Universidade de Lancaster, no Reino Unido, indicou três principais consequências da crise climática a gestantes e bebês:
Com esse panorama complexo e desafiador, observa-se a imperiosa atenção e priorização a ser dada na conjugação de esforços da agenda climática com a agenda da infância.
O Marco Legal da Primeira Infância (MLPI), nesse contexto, torna-se instrumento relevante para união dessas áreas e fortalecimento de políticas públicas eficazes para o enfrentamento da emergência climática, uma vez que a primeira infância é cercada de influências socioambientais que definem sua qualidade de vida e seu bem-estar.
Os artigos 3º e 12º do MLPI catalisam a disposição constitucional da prioridade absoluta, na incumbência do Estado, sociedade e família na promoção de direitos para a primeira infância assegurados a partir de políticas públicas com destinação ao desenvolvimento integral. Tais políticas tornam-se inerentes à problemática de enfrentamento dos efeitos gerados pela crise climática que impactam a infância e violam inúmeros direitos de crianças e adolescentes.
As áreas prioritárias elencadas pelo MLPI na execução das políticas públicas estão assimiladas aos efeitos negativos das mudanças climáticas, como: saúde, alimentação e nutrição, educação infantil, convivência familiar e comunitária, assistência social à família da criança, cultura, brincar e lazer, espaço e meio ambiente, bem como proteção contra toda forma de violência e de pressão consumista, prevenção de acidentes e adoção de medidas que evitem a exposição precoce à comunicação mercadológica.
Outra questão que o MPLI suscita é a criação da Política Nacional Integrada, vislumbrando elementos de execução intersetorial, com o alinhamento das políticas setoriais já existentes aos direitos atrelados à primeira infância, o que significa uma cooperação articulada entre áreas que deverá passar a considerar a emergência climática como desafio urgente a ser superado.
Essa articulação necessária do MLPI como instrumento de defesa dos direitos da primeira infância em face da emergência climática significa a destinação de recursos da governança do clima para priorizar a agenda da infância, com especial enfoque na injustiça climática pertinente aos efeitos desiguais das mudanças climáticas às crianças e adolescentes.
Essa interação entre o MLPI e a emergência climática suscita o tratamento estratégico, preconizando o alinhamento humanista, ético e político com evidências científicas e prática profissional multidisciplinar e a conferência da participação da sociedade através de rede e coalizões que apresentem profissionais capacitados, organizações representativas, pais interessados e crianças e adolescentes.
Nessa conexão entre os atores-chaves é que se poderá tangenciar soluções contundentes ao aprimoramento da qualidade das ações, oferta de serviços e tomada de decisões consciente e qualificada sobre o assunto.
A dinamização da agenda do clima deve ser pensada e gerida entendendo as necessidades da agenda da infância para enfrentamento da emergência climática como pauta de alta prioridade. Esta dinâmica motiva priorizar as crianças quando o assunto for a crise climática, uma vez que a ciência tem atribuído maiores impactos à infância.
Este deve ser o foco dos esforços que pretendem transformar o mundo em um lugar mais resiliente, climaticamente estável e humanamente possível.
* Danilo Ferreira Almeida Farias é advogado no projeto Justiça Climática e Socioambiental do Instituto Alana, mestrando em Direitos Humanos e Meio Ambiente da Universidade Federal do Pará (UFPA), especialista em Direitos do Povos e Comunidades Tradicionais, Youth Climate Leaders Fellow, Climate Reality Líder 2020, membro da Latin American Climate Lawyers, bolsista do Programa Ponte de Talentos da Fundação Lemann e Education USA.
** Este texto é de exclusiva responsabilidade do autor e não reflete, necessariamente, a opinião do Lunetas.
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O MLPI foi regulamentado pela Lei nº 13.257 de 8 de março de 2016 e prevê normativas e princípios imbuídos de fomentar a implementação de políticas públicas com direcionamento para a fase inicial da criança com até seis anos de vida, e com a premissa de salvaguardar os direitos da infância com prioridade absoluta tal qual preconiza o artigo 227 da Constituição Federal, as normas da Convenção Internacional sobre os Direito da Criança e do Adolescente e o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).