Acessível pelo SUS, exame preventivo é fundamental para impedir o desenvolvimento de doenças raras
Em 2022, passa a valer a lei que amplia para 50 o número de doenças rastreadas pelo teste do pezinho ofertado pelo SUS. Realizado nos primeiros dias de vida, o exame pode prevenir o desenvolvimento de deficiências intelectuais e evitar prejuízos na qualidade de vida.
O ano de 2022 pode simbolizar um avanço na luta contra doenças raras no país. A partir de maio, passa a valer a nova lei que amplia de seis para até 50 as doenças diagnosticadas pelo teste do pezinho. Realizado de forma gratuita pelo Sistema Único de Saúde (SUS), o exame alcança mais de 80% dos recém-nascidos no país, segundo o Ministério da Saúde. Apesar disso, barreiras como a desinformação ainda impedem o tratamento e acompanhamento de pacientes.
De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), as doenças raras afetam até 65 pessoas a cada 100 mil indivíduos ou 1,3 a cada dois mil. Essas patologias, catalogadas entre seis a oito mil, são caracterizadas por diferentes sintomas e sinais, que podem variar entre pessoas afetadas pela mesma condição.
Realizar o exame do pezinho em tempo hábil, antes do aparecimento dos sintomas de doenças graves, é fundamental para o sucesso da intervenção precoce.
Quem alerta é a supervisora do laboratório do Instituto Jô Clemente, Sônia Hadachi. Por serem doenças menos conhecidas e de baixa prevalência, podem passar despercebidas. No entanto, a investigação durante o período neonatal é a chave para evitar prejuízos no desenvolvimento intelectual e da qualidade de vida das famílias, garante a neuropediatra do Hospital Pequeno Príncipe, Mara Lucia Schmitz.
O Lunetas entrevistou as duas especialistas sobre mitos e verdades relacionados ao teste do pezinho. Confira.
O teste do pezinho é um exame de prevenção para diagnosticar e impedir o desenvolvimento de doenças raras genéticas, metabólicas e infecciosas, que podem levar à deficiência intelectual ou causar prejuízos à qualidade de vida. Ele é realizado por meio da coleta, com agulha bem fina, de algumas gotinhas de sangue do calcanhar do bebê transferidas para um papel de filtro, especialmente desenvolvido para esse procedimento. Depois disso, o material (sangue seco) é enviado para um laboratório de triagem neonatal, que realiza o Teste do Pezinho Básico (triagem para 6 doenças) ou Ampliado (triagem para pelo menos 50 doenças).
A coleta deve ocorrer após as 48 horas do nascimento (momento em que o bebê garante o metabolismo necessário), entre o 3º e o 5º dia de vida. Como alerta a supervisora do Laboratório do Instituto Jô Clemente, Sônia Hadachi, realizar o exame em tempo hábil, antes do aparecimento dos sintomas de doenças graves, é fundamental para o sucesso da intervenção precoce, tratamento e acompanhamento do paciente.
Nesses casos, é necessário realizar duas coletas de sangue, em momentos diferentes. A primeira deve acontecer 48 horas após o nascimento, e a segunda 120 dias após a data de nascimento ou da última transfusão. A neuropediatra do Hospital Pequeno Príncipe, Mara Lucia Schmitz, explica que o procedimento é necessário, pois tanto a prematuridade quando a transfusão podem interferir na identificação da anemia falciforme e de outras doenças que alteram a produção e hemoglobina (hemoglobinopatias).
O baixo peso também pode interferir nos resultados do exame. Portanto, bebês com menos de 1.500g devem realizar uma segunda coleta no 16º dia de vida para hiperplasia adrenal congênita.
Enquanto o teste do pezinho é realizado por meio da coleta de sangue para identificar a probabilidade de algumas doenças, o carimbo do pezinho se trata de um complemento para a documentação do registro civil, que é feito em cartório, a partir da Declaração de Nascido Vivo. O carimbo da planta do pé é colhido logo após o nascimento pela equipe de saúde para coletar as primeiras impressões biométricas do bebê, isto é, mais um elemento para a comprovação da identidade do recém-nascido.
O Teste do Pezinho Básico, contemplado dentro do Programa Nacional de Triagem Neonatal, disponibiliza gratuitamente o diagnóstico para 6 doenças: fenilcetonúria, hipotireoidismo congênito, síndromes falciformes, fibrose cística, hiperplasia adrenal congênita e deficiência de biotinidase. Em 26 de maio de 2021 foi aprovada a Lei 14.154, que determina a ampliação do Teste do Pezinho de forma escalonada nos próximos anos para todos os recém-nascidos via Sistema Único de Saúde (SUS), passando a abranger 14 grupos de doenças. Na rede privada, o Teste do Pezinho, básico ou ampliado, pode ser realizado na hora, bem como outros tipos modernos e abrangentes de triagem neonatal com custos mais elevados.
Este é um mito, mas a confusão ainda é comum, o que indica uma desinformação sobre o teste do pezinho. A síndrome de Down, diferente das doenças detectadas por meio da coleta de sangue durante a triagem neonatal, é identificada durante exame clínico, realizado por um médico que observa as características físicas do bebê.
Apesar de ter sido sancionada em maio de 2021, a Lei nº 14.154 passa a valer apenas em maio de 2022, tendo ainda quatro anos para ser executada. Mara Lucia Schmitz chama atenção para o processo de implementação integral do teste em todos os estados e municípios do país. A neuropediatra explica que, em muitos casos, dietas restritivas realizadas nas primeiras semanas de vida do bebê – como no caso da fenilcetonúria. Doença genética que envolve o metabolismo de proteínas e causa o acúmulo da substância fenilalanina, que é tóxica ao sistema nervoso, podem evitar graves consequências para o desenvolvimento cerebral. Os desafios, no entanto, são o custo dessas dietas, o acesso às fórmulas (de aminoácidos) oferecidas pela rede pública e a indisponibilidade de alguns medicamentos. “O sistema público de saúde deve garantir não apenas o diagnóstico, mas pensar em como prosseguir com tratamento e acompanhamento adequados”, diz.
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Como serão as etapas de identificação das doenças raras no teste ampliado?
Etapa 1:
a) fenilcetonúria e outras hiperfenilalaninemias;
b) hipotireoidismo congênito;
c) doença falciforme e outras hemoglobinopatias;
d) fibrose cística;
e) hiperplasia adrenal congênita;
f) deficiência de biotinidase;
g) toxoplasmose congênita;
Etapa 2:
a) galactosemias;
b) aminoacidopatias;
c) distúrbios do ciclo da ureia;
d) distúrbios da betaoxidação dos ácidos graxos;
Etapa 3:
a) doenças lisossômicas;
Etapa 4:
a) imunodeficiências primárias;
Etapa 5:
a) atrofia muscular espinhal.
(Fonte: Lei nº 14.154)