O Brasil tem hoje uma população penitenciária feminina composta por cerca de 42 mil mulheres, sendo 14 mil grávidas ou mães de crianças pequenas
Em decisão histórica, o Supremo Tribunal Federal concedeu às detentas grávidas e mães de crianças com até 12 anos o benefício da prisão domiciliar.
O sistema carcerário no Brasil é composto por mais de 42 mil mulheres, dentre as quais, cerca de 14 mil são gestantes ou mães de crianças com até 12 anos de idade – segundo mapeamento do Coletivo de Advocacia em Direitos Humanos (CADHu). Conforme já mostramos aqui no Lunetas, as condições da maternidade no cárcere é alarmante.
Na maioria dos casos, jovens, negras, mães solo, de baixa renda, e presas provisoriamente suspeitas de crimes relacionados ao tráfico de drogas e contra o patrimônio – como mostra a pesquisa Dar à Luz na Sombra, realizada pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) em 2015. Foi olhando para esse cenário que ontem, 20 de fevereiro, o Supremo Tribunal Federal (STF) promoveu um julgamento histórico em favor dessas mulheres.
Por quatro votos a um, a Segunda Turma da corte, composta pelos ministros Edson Fachin, Celso de Mello, Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski e Dias Toffoli, acatou o habeas corpus coletivo 143.641-SP, que prevê o regime domiciliar a todas detentas provisórias que são gestantes, puérperas ou mães de crianças de até 12 anos, garantindo não só melhores condições às mulheres como também ao desenvolvimento e atendimento às necessidades das crianças.
“Dois mil pequenos brasileirinhos estão atrás das grades com suas mães sofrendo indevidamente contra o que dispõe a Constituição, as agruras do cárcere”
É o que afirma o ministro Ricardo Lewandowski. Em seu voto, com mais de 60 páginas, o relator aceitou o pedido coletivo e, a partir da decisão, os juízes de primeira instância terão até 60 dias para colocar em prática. A pedido de Gilmar Mendes, a prisão domiciliar será estendida também a mães de filhos com deficiência física ou mental, de qualquer idade.
A decisão não contemplará mulheres que praticaram crimes com violência ou grave ameaça, ou crimes contra os próprios filhos. Nos casos de negativa, o juiz deverá fundamentar sua justificativa e comunicar sua decisão ao Supremo.
O pedido foi requerido pelo Coletivo de Advocacia em Direitos Humanos (CADHu) em maio de 2017, após o ministro Gilmar Mendes autorizar a prisão domiciliar para Adriana Ancelmo, ex-primeira-dama do Rio de Janeiro, indicada na Operação Calicute (desmembramento da Lava Jato), que é mãe de duas crianças – uma de 11 e outra de 15 anos.
“O habeas corpus (votado ontem) ressalta a forma seletiva como a Justiça trata as mulheres presas (…) e o quão contratantes são as decisões envolvendo mulheres de diferentes classes sociais. Por essa perspectiva, oferece uma oportunidade para que o STF corrija injustiças e revogue a prisão de todas, e não apenas de um grupo seleto de mulheres”, defende o CADHu.
Uma pesquisa da Fundação Oswaldo Cruz, Nascer na prisão: gestação e parto atrás das grades no Brasil, levanta dados e revela parte do drama vivido pelas mulheres em situação de cárcere no país. Em relação ao parto, 36% das entrevistadas responderam que foram levadas ao hospital em viaturas policiais e quase 40% não receberam visitas de familiares ou amigos durante o trabalho de parto. Para 73% das delas, o motivo para a ausência dessas pessoas foi a proibição do sistema prisional.
Além disso, 16% relataram ter sofrido maus tratos ou violência verbal/psicológica durante a estadia nas maternidades por parte dos profissionais de saúde e 14%, de guardas ou agentes penitenciários. O uso de algemas em algum momento da internação por conta do parto foi relatado por 36% das gestantes, sendo que 8% delas disseram que permaneceram algemadas mesmo enquanto davam à luz.
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