7 a cada 10 vítimas de estupro são crianças ou adolescentes

Número de estupros e estupros de vulnerável bate recorde em 2022; mais de 60% das vítimas tem até 13 anos de idade

Eduarda Ramos Publicado em 24.07.2023
Imagem em preto e branco de uma menina sentada no chão com as mãos na cabeça. A foto ilustra matéria sobre vítimas de estupro e estupro de vulnerável.
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Resumo

Número de casos de estupro e estupro de vulnerável no Brasil bate recordes, com alta de 8,2% quando comparado a 2021. A maior parte das vítimas (61,4%) são crianças entre 0 e 13 anos de idade.

O ano de 2022 registrou o maior número de estupros da história do Brasil. Foram 74.930 vítimas de estupro e estupro de vulnerável (que atinge principalmente crianças), um dado 8,2% maior quando comparado a 2021, mostrou o Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2023, recém-publicado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Além da maior parte ser do sexo feminino (88,7%) e negras (56,8%), quase um terço dos casos foi contra meninas de 10 a 13 anos. A faixa etária de 0 a 17 anos de idade representa 69,3% das vítimas.

A publicação chama a atenção para as subnotificações: quando apenas 8,5% dos estupros no país são reportados às polícias e 4,2% pelos sistemas de informação à saúde, estima-se que o número total de estupros e estupros de vulnerável chegue a aproximadamente 822 mil.

O perigo costuma estar dentro de casa

A violência sexual contra crianças e adolescentes acontece em sua maioria dentro de casa (68,3%), cometida por parentes da vítima (64,4%), ou seja, tem caráter essencialmente intrafamiliar. Enquanto 53,3% dos casos de estupro ocorrem à noite ou na madrugada, 65,1% das ocorrências de estupro de vulnerável ocorreram ao longo do dia, das 6h às 11h59, ou entre meio-dia e 17h59, período em que a mãe ou cuidadora da criança costuma estar trabalhando fora de casa.

O estudo aponta ainda que o crescimento do número de casos e a maior vulnerabilidade de crianças e adolescentes pode estar associado ao fechamento das escolas durante a pandemia. Mariana Zan, advogada no Instituto Alana, comenta que o aumento da violência contra este grupo nos últimos anos também está relacionado com “a redução progressiva e sistemática do orçamento destinado a políticas públicas e programas de promoção, proteção e defesa dos direitos de crianças e adolescentes”.

“Esses números revelam uma sociedade marcadamente racista, machista e que ainda enxerga e compreende crianças e adolescentes como mero objetos, e não como sujeitos de direitos”

O estudo também traz informações do relatório Child Maltreatment 2019, produzido pelo Child Welfare Information Gateway, que aponta os profissionais vinculados à educação (21%) como os que mais reportam episódios de maus-tratos e abusos contra crianças nos Estados Unidos, seguidos das polícias e demais agentes da lei (19,1%), e os serviços de saúde (11%).

“A escola tem um papel fundamental para identificar episódios de violência, mas, principalmente, em fornecer o conhecimento necessário para que as crianças entendam sobre abuso sexual e sejam capazes de se proteger”, diz o estudo

“Os dados reforçam a necessidade de investir no sistema de prevenção e garantia de direitos, construindo fluxos e protocolos de atendimento adequados a cada caso. Também é importante uma rede de proteção fora do ambiente doméstico (na escola ou serviços de assistência social, por exemplo), que seja amigável, sensível e acessível para crianças e adolescentes”, recomenda Zan. “Garantir com prioridade absoluta os direitos de crianças e adolescentes, para que tenham uma vida digna e livre de violências, é responsabilidade de todas e todos nós.”

Por que é difícil para a criança reconhecer um abuso?

Segundo a publicação, é comum que a criança não consiga reconhecer nem revelar o abuso sofrido por razões como:

  • falta de conhecimento sobre o tema;
  • vínculo com o agressor;
  • manipulação sofrida com ameaças e subornos;
  • sentimentos de culpa ou vergonha.

Os sistemas de justiça e de proteção social também enfrentam dificuldades em lidar com estes casos. Após a denúncia, a criança costuma voltar a conviver com o agressor, que raramente é punido.

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