Segundo especialistas, o ideal para os pequenos são produtos naturais e orgânicos, que inspiram conexão e não agridem o organismo ou o meio ambiente
Produtos naturais e orgânicos, longe de fórmulas sintéticas, são as melhores opções para bebês e crianças. Segundo especialistas, evitam alergias e doenças, criam conexão com a natureza e ajudam a preservar o planeta.
“Você pode substituir o creme hidratante do seu filho pelo ‘leite’ da aveia triturada no liquidificador.” Os memes à la Bela Gil têm feito sucesso não apenas na cozinha, mas na rotina de cuidado com o corpo e a casa. Eles costumam apresentar dicas de como transformar a rotina familiar, trocando produtos ultraprocessados por “comida de verdade” ou cosméticos comuns por fórmulas limpas. Mas, assim como no universo da alimentação, por que é mais saudável optar por produtos de higiene naturais?
A dermatologista Patricia Silveira explica que fórmulas com conservantes e fragrâncias sintéticas não são indicadas para bebês, gestantes, lactantes e crianças pequenas, pois atuam como disruptores endócrinos. “Elas causam exposição precoce e desnecessária a substâncias que podem interferir negativamente no funcionamento hormonal do organismo, como alterações nas glândulas tireoides”, afirma. Essas substâncias podem ser absorvidas por ingestão, absorção da pele ou inalação.
É muito comum que os cosméticos e produtos de higiene pessoal no Brasil contenham níveis altos de parabenos e benzofenonas, de acordo com um estudo realizado por pesquisadores da Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Ribeirão Preto, da USP, e publicado na revista Environmental International. A partir de 300 amostras coletadas entre 2012 e 2013, uma das principais descobertas do estudo foi a alta concentração dessas duas classes de disruptores endócrinos na urina de crianças entre seis e 14 anos, especialmente nas regiões Norte e Nordeste. Outra substância encontrada nas amostras foi o bisfenol A, utilizada em alguns plásticos e resinas. Apesar de também afetarem a saúde dos adultos, essa exposição é mais preocupante para crianças, que dependem do balanço hormonal para um desenvolvimento pleno e saudável.
Onde as substâncias são encontradas
Ftalatos – materiais de limpeza, tintas, carnes processadas, leite e derivados (em contato com embalagens e tubos plásticos)
Bisfenol – alimentos enlatados e bebidas em garrafas de policarbonato
Parabenos – cosméticos, produtos de higiene, papéis (higiênico, panfleto e jornais) e alimentos processados
Fonte: Estudo publicado na revista Environmental International
Profissional dedicada ao universo da dermatologia natural, Patricia também destaca a presença dos ftalalos, em fragrâncias de produtos como sabonetes, xampus e perfumes, além de serem usados como solventes na fabricação de plásticos mais resistentes para brinquedos e embalagens, por exemplo. Não por coincidência, os resultados do estudo da USP mostram que a substância está presente em 90% das amostras de urina das crianças. “Esses ingredientes estão envolvidos em vários problemas de saúde como obesidade, podendo agir como substâncias cancerígenas”, alerta Patrícia.
Nos últimos anos, grandes marcas passaram a se livrar de componentes como sulfatos e parabenos. O mercado industrial dos cosméticos e produtos de higiene naturais também tem crescido, mas ainda não é acessível para muitas famílias, como alerta Marcela Rodrigues, jornalista e designer em sustentabilidade. Mesmo com pessoas se interessando em fazer seus próprios produtos em casa, com receitas simples como mistura de óleo de coco e bicarbonato para desodorantes, para que esses processos artesanais sejam seguros, é preciso informação e resgate de saberes perdidos, que também tem um custo.
Como sugere Patricia, a melhor forma de escolher é observar a composição dos cosméticos e produtos de higiene, verificando se os ingredientes são seguros ou buscando por marcas que tenham a certificação limpa. “Cuidado para não comprar um ‘greenwash’, que são fórmulas que se dizem naturais, mas não são.” Outra dica da dermatologista é consultar um profissional que conheça bem esse mercado e que possa auxiliar na escolha de produtos mais saudáveis para as crianças, evitando problemas de pele como alergias.
Não se limite apenas em ler os rótulos, pesquise sobre os ingredientes
A dica de Marcela é para que as famílias, cada vez mais, possam ter autonomia em suas escolhas e, eventualmente, produções próprias. Para ela, as perguntas que devem ser feitas durante a escolha de um produto são: quem o fabricou?; onde?; quais os fornecedores?; que tipos de causa essa marca apoia?; ela é transparente sobre os impactos de sua cadeia produtiva? Isso porque, para além da preocupação com a saúde dos bebês e crianças, é preciso pensar na saúde do meio ambiente. “Um cosmético limpo não é apenas sobre uma fórmula livre de substâncias suspeitas. O termo limpo também é sobre transparência na cadeia, menos padrões estéticos e, sobretudo, respeito ambiental”, afirma Marcela.
Uma massagem corporal antes do banho com óleo de coco, banho à luz de velas, folhas e flores colhidas e espalhadas na banheira do bebê, até o ensino de como preparar suas próprias loções, misturando óleos vegetais e essenciais: para muitas pessoas que cresceram com a ideia de higiene como sinônimo de uma obrigação entediante, pode parecer estranho tentar ressignificar as pequenas ações do dia a dia. Mas essa tem sido, desde cedo, a tentativa da aromaterapeuta e artesã de cosméticos naturais Amanda Sérvulo, com sua filha Sol, 3.
Para as crianças, tudo é brincadeira. Quanto mais ela acessar esse universo lúdico e gostoso, mais ela vai ter o prazer de realizar aquela ação.
Amanda explica que, principalmente para crianças que vivem nas cidades, os produtos naturais ajudam a construir momentos relaxantes, em contato com aromas mais próximos ao que se encontra na natureza. “Como não possuem aromas sintéticos, os produtos naturais ajudam a preservar o sistema olfativo da criança, um dos principais caminhos de conexão com a natureza por meio dos instintos”, explica. Além disso, os óleos essenciais, por exemplo, que perfumam sabonetes, xampus e cremes naturais, personalizam os produtos para um determinado fim terapêutico.
Para Amanda e Sol, os momentos de autocuidado acabaram virando oportunidades de troca e fortalecimento de vínculo, em espécies de rituais diários. Dessa forma, até mesmo escovar os dentes, que muitas vezes se torna motivo de conflito ou fonte de exaustão entre cuidadores e crianças, podem adentrar o campo do prazer e do afeto.
“Quero que ela entenda que está sendo cuidada até que ela possa e queira se cuidar sozinha. Desde cedo, a criança pode entender que se cuidar é prazeroso e também é um caminho para fortalecer o amor próprio”, diz Amanda.
Qual a diferença entre óleos vegetais e óleos essenciais?
Óleos vegetais são gorduras extraídas de plantas, sementes, castanhas, frutos, raízes e grãos. Eles possuem proteínas, vitaminas, sais minerais e são umectantes, antioxidantes, além de outros benefícios. Alguns exemplos são os óleos de coco, amêndoas e semente de uva, ricos em ácido linoleico, mais adequados para massagem nos bebês. Muitos desses óleos são utilizados na aromaterapia como carreadores, isto é, veículos de diluição e condução de óleos essenciais no corpo.
Óleos essenciais são encontrados em folhas, flores, cascas de fruto, galhos, sementes, troncos e raízes. Eles ficam armazenados nos tricomas das plantas (pequenas bolsas) e são rompidos, naturalmente, por elas, liberando aroma. Apesar do nome, não são uma gordura, mas se solubilizam em fase oleosa, e não em água. Atuam nos níveis fisiológico e emocional.
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Impacto ambiental
Você já parou para pensar para onde vão o sabão, o xampu e todos os produtos derivados do petróleo e de outros compostos não biodegradáveis que são consumidos em casa? Não apenas as embalagens que geram lixo, mas também resíduos que descem pela água quando tomamos banho?
Consumidores mais exigentes com a preservação ambiental têm pressionado empresas a mudarem suas cadeias produtivas, optando por alternativas de produção de menos impacto. Uma delas, como explica Marcela, é não realizar teste em animais. Outro detalhe é, além de buscar produtos que preservem ao máximo a característica das matérias-primas, como plantas e argilas, compreender a origem dessa matéria-prima: uma planta utilizada na produção de um cosmético pode ser cultivada em um sistema de monocultura, com uso intenso de agrotóxicos ou em sistemas mais limpos, como orgânicos, agroecológicos e agroflorestais, sem contaminação de pessoas e do meio ambiente.