Lábio leporino e fissuras faciais: famílias trocam apoio online

A cada três minutos nasce uma criança com fissura em algum lugar no mundo

Da redação Publicado em 24.03.2015
Fissuras faciais: foto de uma mulher com bebê com lábio leporino abraçado ao ombro.
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Resumo

"As fissuradas" é uma rede de apoio para as famílias com filhos que nasceram com fissuras e outras imperfeições da face. Veja entrevista com a fundadora!

As redes sociais se tornaram grandes ferramentas para lutar em prol de uma causa ou reunir informações sobre determinado assunto. É assim também com a página no Facebook “As fissuradas”. O canal é uma rede de apoio que une famílias do Brasil e do mundo. Em comum, as fissuras faciais, como a labiopalatina em suas vidas.

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Luiza Pannuzio: “Você não vê uma capa de revista com um bebê fissurado, ou na televisão programas que tratem de assuntos variados falando sobre o tema”.

O que são as fissuras faciais?

O lábio fissurado e a fenda palatina são aberturas no lábio e palato (céu da boca). Podem ser causadas por diversos fatores e ocorre por má formação na etapa inicial do desenvolvimento do embrião. Hoje, a Organização Mundial da Saúde aponta cerca de 300 mil casos de brasileiros com fissuras labiopalatinas — uma a cada 650 crianças nascidas no Brasil.

As consequências das fissuras na vida de uma criança vão além da estética; podem causar problemas auditivos, infecções crônicas, má nutrição, má formação da dentição e dificuldades no desenvolvimento da fala. Muitas crianças abandonam a escola e necessitam de acompanhamento psicológico. Na fase adulta, podem haver dificuldades de se relacionar e de conseguir emprego.

O Lunetas conversou com Luiza Pannuzio, fundadora da rede “As fissuradas” e mãe do Bento, que nasceu com fissura.

Entrevista com Luiza Pannuzio

Lunetas – Como foi para você descobrir que teria um bebê com fissura facial, como foi o caminho que percorreu até agora e como ele está hoje?

Luiza Pannuzio – Descobri que Bento nasceria com as fissuras 20 dias antes dele nascer. Fiquei em choque. Lembro que não queria que ele saísse de dentro da minha barriga. O que é normal. Não tenho medo nem vergonha de falar disso. Eu estava com medo. E também um tanto frustrada. Quando grávida, ficamos sempre imaginando nosso bebê lindo e perfeito, ninguém quer passar por isso. Cirurgias de correção. Quantas? Não há médico no mundo que possa te garantir com quantas cirurgias seu filho ficará bom. Duas? Três? E o que é ficar bom? Estamos falando de gente. De uma gente que está dentro da gente. Uma gente nossa. Pronto, é a equação do desespero.

Então, ao saber, entrei no Google e minha aflição triplicou. Bento nasceu faz 2 anos e meio e não havia uma informação sequer na internet que me acalmasse. Fizemos uma primeira cirurgia assim que ele nasceu. O que não foi bom para ele nem para mim. É uma cirurgia nada recomendável, mas não sabíamos. Enfim, superado esta primeira cirurgia, já fizemos outras duas. Todas particulares. Em bons hospitais, tivemos o melhor atendimento. O que é raro não é mesmo? Eu sei que a grande maioria das pessoas não podem pagar e é por isso este meu movimento. Bento me ensinou a respeitar o tempo e ver a vida com bons olhos.

E qual sua avaliação sobre o tratamento que é oferecido no Brasil?

LP – Existe um bom tratamento oferecido no SUS (Sistema Único de Saúde), porém a procura é enorme e mesmo um centro grande não é capaz de suprir toda carência. “As fissuradas” acreditam na capacitação de centros menores para que em suas regiões possam prestar cuidados à população sem que esta tenha que se deslocar para o tratamento para este centro maior, que fica no município de Bauru, em São Paulo e é da USP (Universidade de São Paulo). No Brasil, não falamos abertamente sobre fissuras.

O preconceito começa dentro de casa. É normal que a família, tentando proteger seus filhos os preservem antes de fazerem as primeiras cirurgias reparadoras. Mas eu, como mãe de um fissurado, acho que é mais importante estabelecermos uma troca, um diálogo, fotos e tudo mais que possa interessar para as mães que já tiveram e para as que estão para ter um bebê com fissuras. Esta foi a minha maior angústia, não ter o conhecimento. Também acredito que falando sobre o assunto quebraremos tabus, esclarecemos ao público o que é, como se trata, onde e o que mais quiserem saber.

O que você diria para a família que acabou de ficar sabendo da fissura em seus bebês?

LP – Calma. É um drama e não uma tragédia. Ouvi isso quando estava com Bento ainda na barriga e sempre me lembro desta frase. Enquanto o bebê está na barriga fica a angústia pra saber qual a extensão dessa má formação. Depois que o bebê nasce, aí sim, temos livros, médicos, centros de tratamento, temos ombros pra dar apoio. É importante ter a consciência de que o tratamento é longo e que não se resolve com uma cirurgia. O tratamento de uma criança fissurada segue até pelo menos 16 anos.

Operação Sorriso

A Operação Sorriso é uma organização não governamental dedicada a reunir médicos voluntários para operar gratuitamente crianças nascidas com lábio leporino e fenda palatina. Para isso, cirurgiões plásticos, pediatras e uma série de profissionais trabalham em conjunto com as Secretarias de Saúde e os serviços atuantes nas cidades por onde passa.

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Bruno Hoffman, nasceu com lábio leporino e fenda palatina

A cirurgia é relativamente rápida, uma cirurgia no lábio demora em torno de 45 minutos e, na manhã após a cirurgia, o paciente pode retornar para casa. “Como executivo, voluntário, atual presidente da Operação Sorriso e pai de uma criança que nasceu com fissura, sei exatamente o que significa você devolver o sorriso a uma criança. Dar a ela, em apenas 45 minutos, o direito de ter sua autoestima e sonhos renovados. Muda uma vida inteira.”, afirma Túlio Prazin, presidente da ONG.

Acompanhamento multiprofissional

O doutor Diógenes L. Rocha, cirurgião plástico, professor da Universidade de São Paulo e voluntário da Operação Sorriso diz que os centros de tratamento de fissurados existentes no Brasil não são suficientes por causa do número de fissurados, da extensão do país e consequentes dificuldades de locomoção e de acesso aos locais para tratamento e das condições sócio econômicas da maioria população.

Como o tratamento não se restringe ao fechamento cirúrgico da fenda, demandando acompanhamento longo e constante de cirurgião plástico, fonoaudiólogo, ortodontista e demais profissionais o ideal é que o tratamento seja feito na região em que o paciente more.

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