Quando se pode considerar que a criança tem um atraso na fala?

Apesar de não existir regras definidas sobre o início da fala, é preciso acompanhar com atenção os indicadores do desenvolvimento infantil em cada bebê

Da redação Publicado em 17.01.2017 Atualizado em 13.04.2023
Atraso na fala: foto de uma menina que segura um telefone. Sua boca demonstra que ela está prestes a dizer alguma coisa.
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Resumo

Estima-se que, entre os 12 meses e os dois anos de vida, as primeiras palavras e frases começam a aparecer. Quando isso não acontece, é indicado que as famílias observem a criança em sua individualidade e busquem orientação de um especialista.

Que mamãe e papai não esperam ansiosos pela primeira fala de seu bebê? Quando vai chegando o momento em que ele começa a balbuciar as primeiras sílabas, toda a família se reúne ao seu redor para ouvir e comemorar. Mesmo que isso demore um pouquinho para acontecer, não significa, necessariamente, um atraso na fala. Antes da formação de uma palavra, há muitas outras maneiras de comunicação estabelecidas pela criança que devem ser acompanhadas com atenção.

A fala e o choro

Em texto publicado no blog Ninguém Cresce Sozinho, as psicanalistas Adriana Fontes Melo e Ana Paula Dias Fernandes Pacheco explicam que a fala começa a ser treinada a partir do nascimento, que impele o choro. Nos momentos seguintes da vida, este choro irá representar outras coisas. Essas que devem ser compreendidas a partir das indagações e sinais da criança. Apenas os bebês com problemas no aparelho fonador não são capazes de se comunicar por meio do choro ou de sons. Até mesmo crianças com deficiência auditiva possuem o som da voz.

De acordo com as psicanalistas, a fase de ensaio e erro na comunicação a partir do choro prepara a próxima etapa. Nessa, o bebê começa a apontar para o que quer. Esse caminho indica que ele, primeiro, aprende as regras de linguagem. E se utiliza desses códigos para se comunicar e, depois, forma as primeiras palavras a partir do resultado do que foi percebido e praticado.

Atraso na fala

“Marcadores como emissão de sons e sorrisos, troca de olhares e responsividade aos estímulos ambientais, observados ao longo do primeiro ano de vida, são fundamentais para estabelecer e sustentar a interação e a comunicação social entre o bebê e a família”. É o que afirmam as fonoaudiólogas Ana Carina Tamanaha e Camila Ribeiro, ambas do departamento de linguagem da Sociedade Brasileira de Fonoaudiologia (SBFa). 

Indicadores Clínicos de Risco para o Desenvolvimento Infantil (IRDIs)

A pesquisa multicêntrica dos Indicadores Clínicos de Risco para o Desenvolvimento Infantil (IRDIs) estima que, até os quatro meses de vida, a criança chora ou grita. Entre quatro e oito meses, ela utiliza sinais para expressar suas diferentes necessidades (sorrisos, vocalização de sons etc.). De oito a 12 meses, ela começa a compartilhar uma linguagem particular com seus pais e cuidadores. E de 12 a 18 meses é quando os pais começam a pedir que a criança nomeie o que deseja.

Alterações nesse processo

Ana Carina e Camila ainda atentam que, aos 18 meses, as crianças começam a justapor duas palavras. E, aos 3 anos, constroem frases simples com cerca de três palavras. Segundo as fonoaudiólogas, o atraso na fala é considerado quando a criança atinge esses parâmetros, mas com lentidão. Por exemplo, em vez de produzir as primeiras palavras aos 12 meses, a criança começa a emiti-las apenas aos 18. O atraso deve ser observado com maior atenção se ultrapassar os dois anos de idade. 

“Esse atraso pode ser um sinal de alerta e estar relacionado a diferentes condições. Como alteração auditiva ou intelectual, síndromes genéticas, transtorno do desenvolvimento de linguagem, entre outras”, afirmam.   

Mas nem sempre é preciso se preocupar. O ideal é ter o acompanhamento de um especialista. Em muitos casos, como relata o neurologista pediátrico Eduardo Jorge, crianças que demoram para desenvolver a comunicação verbal interagem muito bem. Por outro lado, algumas dentro do Transtorno do Espectro Autista (TEA), que apresentam todos os sinais de desenvolvimento e começam a falar aos 12 meses, podem apresentar regressão depois desse período. 

Linguagem é experiência

Apesar de cientistas ainda buscarem respostas para descrever com detalhes o processo de aquisição da linguagem, Eduardo Jorge explica que a troca e a interlocução entre crianças e adultos e entre crianças e seus pares são fundamentais para a aprendizagem da fala. “Aquisição da linguagem não envolve apenas ouvir e repetir, mas a interação entre outros sistemas”, diz. 

Por exemplo, para uma criança que está aprendendo a dizer “flor”, a atenção ao próprio objeto, o cheiro e o contato com sua textura também constroem essa experiência. O neurologista pediátrico ainda afirma que o movimento e a descoberta do próprio corpo promovem novas sinapses que interagem com o processo de aquisição da linguagem. Uma compreensão, segundo ele, ainda negligenciada pela sociedade. “As crianças precisam brincar livres”, defende.

Fatores que podem se relacionar ao atraso

Em geral, a indicação dos especialistas é que a criança não deve ser exposta a mais de uma língua enquanto está aprendendo a falar. O que nem sempre é possível. Por isso, é preciso ter em mente que, embora não sejam causais, fatores como morar em um país estrangeiro, estar fora do ambiente pré-escolar e a falta de convívio com o núcleo familiar expandido, como os avós, são fatores agravantes que podem influenciar o início da fala.

Isolamento e excesso de telas 

A orientação da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) é de que a exposição a telas e eletrônicos não ocorra antes dos dois anos de idade. Além disso, é recomendado que a família limite o tempo de exposição diário e que sempre haja mediação de um adulto em qualquer atividade. 

No entanto, Eduardo Jorge revela que tanto a exposição excessiva às telas – consideradas estimuladores de via única – quanto o isolamento durante a pandemia podem ter atrapalhado o desenvolvimento da linguagem das crianças. O impacto deve ser sentido pelos próximos anos por famílias e escolas. 

Ana Carina e Camila ainda afirmam que é importante ter em mente que os eletrônicos, apesar de estimularem quando utilizados de maneira correta e poderem oferecer conteúdo educativo, não fornecem modelos de correção quando a criança tem algum erro ou dificuldade de fala.

*Esta reportagem foi escrita originalmente por Renata Penzani. Para sua adaptação e atualização ao Portal Lunetas, colaborou Camilla Hoshino.

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