O que fazer quando a escola naturaliza o racismo e a escravidão?

O racismo é real e ainda cotidiano na sociedade. Por isso, abordagem pedagógica da escravidão como um capítulo grave e triste na nossa História é fundamental

Camilla Hoshino Publicado em 01.06.2017
Duas mãos de criança - uma negra e outra branca - se entrelaçam.

Resumo

Temos que discutir e estudar a escravidão negra no Brasil e como sua longa duração é constitutiva do racismo que estrutura a sociedade brasileira.

Um post compartilhado há cerca de um ano por uma mãe em seu Facebook voltou à tona ontem. No post, Priscila Hirle, uma médica carioca, comenta sobre uma proposta da lição de casa que seu filho, na época com nove anos, recebeu da escola onde estudava:

“Se você fosse um escravo, que tipo de trabalho você gostaria de fazer: no engenho ou doméstico?”, e a resposta da criança foi: ‘Nenhum'”

Em comentário recente sobre a situação, também em seu Facebook, Priscila Hirle relatou que chegou a conversar com a diretora da instituição por conta da situação, mas que optou por trocar o filho de escola. À época, a educadora teria informado Priscila de que a lição teria sido “uma abordagem da professora dentro do contexto da escravidão e que as crianças estavam alegres discutindo o tema, pois foi uma brincadeira”.

Quando a escola naturaliza o racismo e a escravidão

Para Ana Cristina Juvenal da Cruz, docente da UFSCar ( Universidade Federal de São Carlos) no Departamento de Teorias e Práticas Pedagógicas atuando no Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros e no Grupo de Estudos sobre a Criança, a Infância e a Educação Infantil, o caso vivido por Priscila reflete práticas educativas que ainda são realizadas em contextos escolares em todo o Brasil e que, sim, naturalizam a escravidão e o racismo. A acadêmica explica que ‘naturalizar a escravidão’ significa abordar o tema sem problematizá-lo.

“Afirmar que é uma ‘brincadeira’ demonstra o não conhecimento do quanto isso é nocivo. Não há ‘brincadeira’  e nem positividade em nenhum aspecto da escravidão negra no Brasil e na diáspora africana”

“Isso deve pautar a postura de qualquer, pessoa e qualquer profissional, especialmente os que trabalham com educação”, disse.

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iStock/Arte Lunetas

Na escola, cabe ao professor apresentar exemplos positivos de negritude e assim ajudar a construir referências sólidas de identidade.

Formação de professores para combater o racismo

Na opinião de Ana Cristina, situações como essa, também mostram a formação inadequada de alguns profissionais da educação para tratar de determinados temas, no caso, o racismo.

“Nós temos sim que discutir e estudar a escravidão negra no Brasil e como sua longa duração é constitutiva do racismo que estrutura a sociedade brasileira ainda hoje”

“É importante que os profissionais que atuam na escola constantemente questionem suas práticas pedagógicas e tomem como ponto de partida fundamental que não é natural e nem normal nenhuma prática dessa natureza”, afirma.

“O racismo é real e cotidiano na vida das pessoas. Ele deriva da escravidão”

“Por isso, é importante reconhecer o modo como o racismo opera, isso vai além das posturas e interpretações pessoais, as pessoas mesmo que individualmente não se vejam como racistas operam no interior dessa lógica que estrutura as relações”, finaliza.

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