Na educação quilombola, a escola valoriza a cultura do território

Com destaque para crianças e jovens da comunidade, a educação formal de quilombo impacta 500 famílias que vivem no território de Mata Cavalo (MT)

Porvir Publicado em 25.08.2022
Duas crianças negras escrevem em cadernos, apoiados uma mesa.
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Resumo

A educação quilombola oferece atividades e metodologias que contemplam e valorizam os saberes e fazeres locais, a oralidade e a ancestralidade. O parceiro Porvir trouxe a experiência no quilombo Mata Cavalo, localizado na cidade Nossa Senhora do Livramento (MT).

O parceiro Porvir e a educadora quilombola Gonçalina Eva Almeida de Santana compartilham experiências que aconteceram no território de Mata Cavalo a partir de uma formação em etnossaberes, realizada com o Grupo de Estudos e Pesquisas em Educação Escolar Quilombola da UFMT (Universidade Federal do Mato Grosso), entre 2017 e 2021. O ponto de início é a Escola Estadual Quilombola Tereza Conceição Arruda, precursora na educação formal das crianças e jovens que vivem no quilombo. Ao todo, são 500 famílias morando neste território quilombola, que fica em Nossa Senhora do Livramento, uma cidade de 13 mil habitantes, a 50 km de Cuiabá (MT).

O que muda da escola que conhecemos para a escola quilombola?
O currículo de uma escola quilombola deve oferecer atividades e metodologias que contemplam e valorizam os saberes e fazeres locais, a oralidade e a ancestralidade, fazendo com que os estudantes não se sintam invisíveis e desconexos da sua realidade. O espaço rompe com paradigmas eurocêntricos que permeiam a educação pública comum.

Historinhas do quilombo

Iniciado em 2022, “Historinhas do quilombo” reescreve clássicos da literatura infantil, como “Branca de neve e os sete anões” e “Chapeuzinho vermelho”, para que potencializem o protagonismo de personagens quilombolas e negros. Dessa forma, os educadores buscam quebrar estereótipos de base colonialistas, racistas, sexistas e machistas, presentes, historicamente, em livros de literatura infantojuvenil trabalhados nas escolas – inclusive, nas escolas quilombolas. 

As histórias dos clássicos infantis são reescritas com ênfase nos traços específicos das crianças e jovens da comunidade, colaborando com a valorização das ideias de negritude, empoderamento e resistência, da luta dos quilombolas e suas estratégias de libertação em relação aos processos de subalternização a que foram submetidos. O projeto também está alinhado com as Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação Escolar Quilombolas. 

“Era uma vez, num quilombo chamado Mata Cavalo, localizado no cerrado do município de Nossa Senhora do Livramento, estado de Mato Grosso, uma menina negra, de olhos castanhos e cabelos bem crespos”

Casa de Cultura

Localizada dentro da escola do quilombo, a Casa de Cultura é utilizada como laboratório para conteúdos de diversas disciplinas. Na disciplina de História, por exemplo, os alunos estudam a origem da moradia das famílias e da construção de casas de pau a pique. Em Matemática, os alunos resgatam medidas do território quilombola para medir o tamanho da casa, como o braço e o palmo, para depois usar as medidas padrão, como centímetro e metro, bem como formas geométricas para desenhar o modelo da casa. 

A sociologia do quilombo trabalhou as formas de organização do trabalho, por meio do uso do muxirum (palavra de origem tupi-guarani que significa trabalho em grupo, mutirão), desenvolvido secularmente entre as famílias do território quilombola de Mata Cavalo, inclusive na construção da Casa de Cultura. A partir do trabalho em sala de aula, com a utilização dos saberes e fazeres da Casa da Cultura, como conteúdos escolares articulados aos conteúdos dos livros didáticos, os estudantes se interessam mais pelos conteúdos e se tornam participativos, além de aprenderem a valorizar a cultura local.

“As experiências relatadas aqui demonstram que é possível e necessário produzir material antirracista a partir das escolas quilombolas, além de contribuir para o orgulho de pertencimento dos nossos estudantes”

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