Quem são os verdadeiros responsáveis pela obesidade infantil?

As famílias estão longe de serem culpadas pelo que acontece no ambiente alimentar como um todo

Ekaterine Karageorgiadis Publicado em 26.07.2018
Bebê aparece de costas em um carinho de supermercado

Resumo

A má formação alimentar vem acarretando consequências negativas à saúde da população brasileira, mas não é justo culpar os pais das crianças. A colunista Ekaterine Karageorgiadis sugere que atuemos de forma conjunta com uma série de atores. Confira!

Hábitos alimentares se formam na infância e dependem muito da relação que o núcleo familiar tem com a comida. Afinal, a criança nasce em um contexto já estabelecido, com seus costumes e tradições próprios, e seu paladar se desenvolve à medida que lhe são oferecidos alimentos.

Os mais novos adquirem os costumes daqueles que cuidam deles, e que já mudaram bastante nas últimas gerações, especialmente em um contexto de oferta permanente, excessiva, habitual e onipresente de produtos industrializados com muito sal, gordura, açúcar, poucos nutrientes e muitas calorias vazias anunciados em meios de comunicação como sendo a melhor opção, por sua suposta praticidade e benefícios nutricionais.

A má formação alimentar de uma criança vem acarretando consequências negativas à saúde da população brasileira.

Sem distinguir entre classes sociais e regiões do país, o excesso de peso associado a doenças como diabetes, hipertensão, problemas renais caracteriza uma geração de crianças que, pela primeira vez na história, pode viver menos que seus pais. A mudança dos hábitos alimentares das famílias impacta inclusive os gastos públicos, a exemplo do investimento de recursos do Sistema Único de Saúde (SUS) na realização de cirurgia bariátrica em adolescentes a partir de 16 anos.

Muitos acusam mães e pais de serem os verdadeiros e únicos culpados pelo descuido com a saúde das crianças. Seriam eles que deixariam que seus filhos comessem demais, sem controle sobre o que consomem, e incapazes de dizer não. Famílias e escolas, em alguns casos, vivem em pé de guerra, pois boas práticas adotadas no seio familiar são desencorajadas pela rotina escolar, ou vice-versa.

Sem tempo, famílias substituem alimentos frescos e preparações caseiras por lanches, macarrões instantâneos, congelados, enlatados, molhos e temperos prontos e guloseimas. Mas não são elas que fabricam esses produtos, que os colocam à venda nos supermercados, os anunciam nas publicidades, especialmente para as crianças, associados a personagens, jogos e diversões. Não são mães e pais, avós e tios que escolhem quais produtos geram maior rentabilidade nas cantinas das escolas. Tampouco negociam com órgãos do poder público a incorporação de bolinhos ultraprocessados que não apodrecem na alimentação escolar da rede pública de ensino.

As famílias são responsáveis por suas crianças, mas estão longe de serem culpadas pelo que acontece no ambiente alimentar como um todo.

Elas devem sim exercer um papel ativo e consciente na alimentação das crianças. São as primeiras a se preocupar com os exemplos transmitidos e a ensinar os passos de uma alimentação saudável. Porém, para fazerem escolhas certas, precisam saber quais seriam elas, e como adota-las. Ou seja, precisam ter acesso a informação clara, suficiente, adequada sobre o funcionamento do sistema alimentar contemporâneo.

A família é o primeiro núcleo de desenvolvimento infantil, seguido da escola. Para que sejam realmente competentes para alimentar as crianças, é preciso que atuem de forma conjunta e complementar e que tenham ferramentas de apoio, o que depende de Estado, empresas, meios de comunicação, profissionais de saúde e educação, acadêmicos, enfim, toda a sociedade, atentar à atual realidade e propor mecanismos de mudança social – e não apenas individual, para que o melhor interesse das crianças seja assegurado e garantida sua integral proteção e a prioridade absoluta dos seus direitos.

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