Chimamanda lista 8 passos para educar uma criança feminista

Para a escritora Nigeriana, feminismo nada mais é que sonhar com igualdade entre todas e todos

Renata Penzani Publicado em 07.03.2017

Resumo

"Ensine a ela que papéis de gênero são totalmente absurdos. Nunca lhe diga para fazer ou deixar de fazer alguma coisa 'porque você é menina'. 'Porque você é menina' nunca é razão para nada", defende a escritora nigeriana Chimamanda Adichie em seu novo livro.

Em 2014, a escritora nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie escreveu o livro “Sejamos todos feministas”, publicado no Brasil pela Companhia das Letras em 2017. Direto e sem filtros, o pequeno volume é um manifesto por um mundo mais igual, e traduz, entre outras coisas, como o feminismo é essencial para libertar não somente as mulheres, mas os homens também.

“Criamos as meninas de uma maneira bastante perniciosa, porque as ensinamos a cuidar do ego frágil masculino” (“Sejamos todos feministas”, 2014)

Hoje, chega às livrarias a próxima obra da escritora, onde ela leva a ideia adiante ao criar a versão para crianças de suas reflexões. “Para educar crianças feministas” (Companhia das Letras), segundo a autora, é um livro para meninas e meninos, homens e mulheres.

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Divulgação/Companhia das Letras

Lembro que me diziam, quando era criança, para ‘varrer direito, como uma menina’. O que significava que varrer tinha a ver com ser mulher. Preferiria que tivessem a mesma coisa para os meus irmãos, diz o livro.

Chimamanda Ngozi Adichie A nigeriana escreveu os aclamados romances “Meio Sol Amarelo” (2008), “Hibisco Roxo” (2011) e “Americanah” (2014), eleito um dos dez melhores livros do ano pela New York Times Book Review e adaptado para o cinema em “Doze Anos de Escravidão”. Sua obra foi traduzida para mais de trinta línguas. Sua palestra no TED, “O perigo da história única” já foi visto por mais de 1 milhão de pessoas em todo o mundo. Clique aqui para conhecer melhor a obra da autora.

A ideia surgiu do pedido de uma amiga de Chimamanda. Quando descobriu que seria mãe de uma menina, pediu a autora que a ajudasse na missão de criar uma menina livre de estereótipos de gênero.

Chimamanda resolveu então escrever esta espécie de manual de pouco mais de 60 páginas, de leitura rápida e assertiva (mas não menos complexa) onde divide suas opiniões sobre o tema em pequenos aprendizados, oito lições de como educar uma criança para a igualdade em um mundo ainda tão desigual.

O resultado é um pequeno grande grito por liberdade. Pela liberdade de a criança ser quem é – e não quem a cultura ou os padrões sociais e culturais querem que ela seja. Pela liberdade de a mãe ser quem precisar ser – e não ter de encarnar o pretenso ideal da ‘mulher perfeita’ que dá conta de tudo e todos. E, principalmente, um apelo para que o direito à liberdade de ser seja reconhecido e valorizado em todas as camadas sociais, independente de gênero, cor ou classe.

Leia alguns trechos do livro

  • “Ensine a ela que papéis de gênero são totalmente absurdos. Nunca lhe diga para fazer ou deixar de fazer alguma coisa ‘porque você é menina’. ‘Porque você é menina’ nunca é razão para nada. Jamais.”
  • “Lembra que aprendemos no primário que verbos são palavras de ação? Bom, pai é verbo tanto quanto mãe.”
  • “Se uma mulher diz não ser feminista, a necessidade do feminismo não diminui em nada. No máximo, isso nos mostra a extensão do problema, o alcance real do patriarcado. Mostra-nos também que nem todas as mulheres são feministas, e nem todos os homens são misóginos.”
  • “Ensine-a a consertar as coisas quando quebram. A gente supõe rápido demais que as meninas não conseguem fazer várias coisas.”
  • “Ensine-a a questionar a linguagem. A linguagem é o repositório de nossos pressupostos. Mas, para lhe ensinar isso, você terá de questionar sua própria linguagem.”
  • “Uma amiga minha diz que nunca chamará a filha de ‘princesa’. Quando as pessoas dizem isso, a intenção é boa, mas ‘princesa’ vem carregado de pressupostos sobre sua fragilidade, sobre o príncipe de que virá salvá-la. Essa amiga prefere ‘anjo’ ou ‘estrela’.”
  • “Ensine-lhe a fazer perguntas como: “Quais são as coisas que as mulheres não podem fazer por serem mulheres? Essas coisas têm prestígio cultural? Se têm, por que só os homens podem fazê-las?”
  • “Ensine-lhe sobre o privilégio e a desigualdade e sobre a importância de dar dignidade a todos que não querem prejudicá-la.”
  • “O poder das alternativas é incalculável. Ela só poderá se contrapor aos estereótipos de gênero se a família tiver fornecido alternativas a ela.”
  • “Ensine a ela que amar não é só dar, mas também pegar. Isso é importante porque damos às meninas pistas sutis sobre a vida delas – ensinamos que um grande elemento de sua capacidade de amar é sua capacidade de se sacrificar. Não ensinamos isso aos meninos. Ensine-lhe que, para amar, ela precisa se entregar emocionalmente, mas que também deve esperar receber.”
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Divulgação

Autora de romances premiados, a escritora nigeriana é reconhecida como umas principais vozes da literatura contemporânea.

Apesar do que o nome indica, o livro não pretende ser um receituário fechado que impõe uma maneira de educar como mais certa do que a outra, apenas pressupõe a igualdade e a liberdade como direitos inalienáveis de todas as meninas e meninos.

Feminismo é sonhar com igualdade entre todas e todos “A questão de gênero é importante em qualquer canto do mundo. É importante que comecemos a planejar e sonhar um mundo diferente. Um mundo mais justo. Um mundo de homens mais felizes e mulheres mais felizes, mais autênticos consigo mesmos. E é assim que devemos começar: precisamos criar nossas filhas de uma maneira diferente. Também precisamos criar nossos filhos de uma maneira diferente.” (“Sejamos todos feministas”, 2014)

Antes de achar que esta leitura é mais para mulheres ou meninas do que para meninos e homens, é preciso não perder de vista que a Chimamanda deste livro é a mesma que falou para mais de 1 milhão de pessoas sobre o “perigo da história única” (vídeo que se tornou um fenômeno no YouTube), ou seja, feminismo também é uma questão de contexto.

A autora entende que existe muito preconceito em torno do conceito, e defende o feminismo não como um nicho separatista em uma sociedade por si só excludente, mas como um sonho comum a ser perseguido todos os dias. E se pudermos fazer isso com – e para – as crianças, melhor para todo mundo.

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