Por que é importante perguntar por quê?

Um exercício para o Dia da Infância: resgatar a postura curiosa das crianças diante da vida e praticar mais os porquês

Laís Barros Martins Publicado em 24.08.2020
Para ilustrar matéria sobre as perguntas de crianças, imagem de uma menina vestindo uma blusa vermelha, com dois coques no cabelo e o dedo levantado faz cara de surpresa. Há um fundo azul e um círculo amarelo próximo dela, com sinais de interrogação em branco.
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Resumo

Como conservar um olhar curioso diante da vida para além da infância? Dani Silvares, terapeuta da criança interior, propõe o exercício a nós, adultos, de questionar mais porquês em nosso dia a dia.

Porque há um mundo inédito posto à luz, crianças movidas pela curiosidade das primeiras vezes têm essa vontade genuína de irem investigando-o aos poucos ou a ambição inocente de descobri-lo todo. Para darem conta da tarefa, diante desse admirável mundo novo, formulam, por hábito comum, muitas perguntas durante a infância. Por quê?

É que “as crianças são donas de um olhar desperto, que olha e vê”, pontua a psicóloga Dani Silvares. Os porquês, molas propulsoras do seu desenvolvimento, são capazes de deslocamentos instantâneos – a cada pergunta mudam do estado inicial, que já ficou no passado. Assim, desse interesse em explorar as novidades e compreender a experiência do viver, juntando as pecinhas do imenso quebra-cabeça que é a vida, vão crescendo, sem ainda nem adivinhar que os encaixes podem ser bem tortos. Mas, para isso, ainda é cedo…

Por ora, basta que a gente saiba da potência que essas perguntas infantis guardam em si de pequenos achados ou grandes revelações. Enquanto suas perguntas, tantas vezes intrigantes, as estimulam em suas jornadas particulares, também podem ajudar adultos, como nós, a resgatar a porção de infância que ainda nos habita, a partir das reflexões que libertam depois de há muito afrouxadas pelo peso da rotina. 

“Crianças gostam de fazer perguntas sobre tudo. Nem todas as respostas cabem num adulto”, Arnaldo Antunes.

Embora nem sempre a gente tenha as respostas, Dani recomenda disponibilidade para acolher a sede de vida que uma criança tem. “Ajudamos não atrapalhando esse processo natural e espontâneo, quando não julgamos ou criticamos o olhar curioso de uma criança. Pelo contrário, devemos incentivá-lo na infância e mesmo conservá-lo na vida adulta”.

A importância do ‘por quê’

“Mais importante do que ter todas as respostas é saber fazer perguntas”, defende Dani, que é também terapeuta da criança interior. “Perguntas nos movem e nos expandem. Ao invés de anestesiar nosso sentir, nosso pensar, nosso querer, os questionamentos são um convite, a nós mesmos e ao outro, para ver além do que já foi visto”. 

“A resposta certa, não importa nada: o essencial é que as perguntas estejam certas”, Mario Quintana.

Por isso, o conselho da especialista é não perder de vista a infância, como forma de “nos transformar e inspirar outras pessoas em suas transformações”, diz. “Crescemos e desconectamos o pensar do sentir, o sentir do agir. Ao nos fragmentar, nos afastamos dessa capacidade de olhar para a vida com os olhos mais despertos”, comenta. 

Em defesa do direito de perguntar ‘por quê’

Para corrigir essa falha e reclamar de volta o nosso direito de questionar nossos próprios porquês, Dani sugere “buscar, de forma consciente, o estado de presença, pois podemos estar fisicamente em um lugar, mas absolutamente desconectados do momento. A presença nos faz enxergar o que se passa diante dos nossos olhos, descobrir possibilidades na realidade ao redor”. Só que, para defender nosso ponto de vista, ela recomenda cuidado. Isso porque os questionamentos da vida adulta, em certa medida, parecem deixar de ser bem-vindos ao provocar desconfiança ou significar uma atitude combativa, polêmica e até agressiva. 

“Diferentemente das crianças, não perguntamos apenas porque queremos compreender. Muitas vezes nossos questionamentos vêm carregados de julgamentos”. Então, é preciso “compreender a real intenção por trás de um questionamento, a intenção mais profunda. Se a forma como nos colocamos é um convite ao diálogo, à reflexão mútua, ou apenas uma tentativa de calar o outro e fazer valer a nossa voz, a qualquer custo”.

O exercício proposto por ela é que, antes de questionarmos os outros, nos questionemos a nós mesmos, extrapolando a perspectiva de certo e errado, a partir de uma postura mais empática. “O que estamos vendo que o outro não vê? O que o outro vê que não estamos vendo?”. Afinal, agora já sabemos um pouquinho melhor que nem sempre as pecinhas do quebra-cabeça se encaixam à perfeição, mas podem ser montadas de jeitos múltiplos e nada definitivos.

As perguntas mais inusitadas das crianças

Para nos dar um chacoalhão, sempre teremos as crianças e seus porquês. Porque essa postura infantil de questionar o mundo ao redor consegue nos inspirar, compartilhamos a seguir uma coletânea de perguntas que um dia as fizeram sair do seu lugar para ocupar outro estágio de entendimento da vida e, ao mesmo tempo, também desequilibraram as nossas certezas mais arraigadas, trazendo a infância um pouquinho mais para perto de novo.

“As perguntas das crianças em geral são as que nos deixam mais atrapalhados”, Érico Veríssimo.

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iStock/arte Lunetas

“Por que a lua não cai?” – Caio, 6 anos

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“Como a gente faz para saber se a pessoa é má?” – Malu, 7 anos

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“Papai, você pode me deixar voar?” – Antonio, 4 anos

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