Mães solo por opção, mães que vivenciam o abandono paterno, mães acompanhadas. Escrever pode ser terapêutico para todas elas
O projeto foi pensado para escutar os receios e as angústias de mulheres que não dizem o que sentem publicamente por medo de serem julgadas.
“Quando nasce um bebê, nasce uma mãe”. Aí está um dito popular muito comum de ouvir quando uma mulher engravida. Mas, e a mulher que existia antes daquela nova vida, para onde vai? Para quem conta seus medos, confessa suas inseguranças, segreda seus desejos?
Quando nasce uma mãe, nasce junto uma mulher nova, quase desconhecida. Uma mulher que não deixou de ser mulher porque se tornou mãe. Porém, entre essa mulher e o resto do mundo, há um abismo muitas vezes minado daqueles que não conseguem enxergá-la em toda a sua multiplicidade. Como continuar sendo a mesma, então?
Com esses e outros poréns na cabeça, a social media paulistana Joice Melo, de 28 anos, resolveu criar um espaço seguro para acolher os desabafos de mulheres de todo canto, o “Mães que escrevem“. A partir de um site e uma página no Facebook, o projeto nasceu com a ideia de reunir escritos de e sobre mulheres, feminismo, maternidade. Mas não só.
O site recebe também textos sobre política, cotidiano, comportamento, aleatoriedades, e o que mais passar pela cabeça de uma mãe em busca de ouvido atento
Mães solo por opção, mães que vivenciam o abandono paterno, mães acompanhadas, mães de famílias felizes, mães de famílias complicadas: este que pretende ser um inventário afetivo da maternidade real tem espaço para todas elas.
Joice conta que percebeu essa demanda por escuta e acolhida a partir de sua própria experiência de vida. Mãe de Juan, de seis anos, ela conta que escrever sempre lhe fez muito bem para espantar os próprios fantasmas e iluminar os lugares escuros para onde pode ir a mente de uma mãe em muitos momentos da vida.
Enquanto tenta dar conta do grande volume de contribuições que tem recebido neste primeiro mês de vida do projeto, Joice conta que muitas delas preferem escrever anonimamente, por medo de serem julgadas – ou pela sociedade, ou pela própria família, o que muitas vezes significa o receio de serem “descobertas” por seus próprios ex-parceiros.
“Dá pra ver a necessidade que a mulherada tem de por para fora, e muitas fazem anonimamente por medo de represália dos ex parceiros, ou porque não têm conhecimento de alguma ferramenta”, explica a idealizadora da iniciativa, que é totalmente independente.
“Escrevo, escrevo… Apago! Escrevo e apago novamente. Desisto de escrever, de me posicionar, de falar da minha dor. Sabe por quê? Medo! Medo de ser julgada, porque se falo de dor tem um monte de gente que vai entender que não há amor”, diz um dos textos de uma colaboradora anônima, que escolheu assinar somente como A.M.
Quem entra no endereço recém-colocado no ar – que por enquanto ainda não conta com domínio próprio, como conta a idealizadora – encontra uma escrita de muita dor e também de muita leveza compartilhada. São mulheres que querem se mostrar como são, longe ou perto de suas crias.
Os textos falam sobre assuntos como maternidade real, ausência paterna, alienação parental e depressão pós-parto, culpabilização da mulher, desigualdade de gênero, cultura da infância e muitos outros temas que orbitam o universo feminino e materno. “O projeto foi pensado para ajudar mães a desabafarem, a descobrir um talento, e a se distraírem (quando podem)”, explica Joice.
“Escrever é terapia, ajuda a tirar um peso das costas, alivia nem que seja por um tempo algumas angústias, mas também pode ser instrumento de novidades, inspirações e alegrias”
Para contribuir, o caminho é simples, e cabe somente a quem escreve assinar ou não os textos. O e-mail oficial do projeto é maequeescreve@gmail.com. Junto com o texto – que pode ser um artigo, um poema, ou outros formatos – as interessadas devem enviar também uma breve descrição e uma foto para os créditos, no caso das autoras que optarem por se identificarem. Mulheres, uni-vos!
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