Crianças devem ou não participar da fantasia do Papai Noel?

Segundo especialistas, é possível entrar na brincadeira do Natal sem subestimar o papel do lúdico e da imaginação dos pequenos

Camilla Hoshino Publicado em 07.12.2022
Uma menina negra de camiseta vermelha está abraçando um Papai Noel
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Resumo

O Natal tem seus clássicos e as polêmicas em torno do Papai Noel é um deles: existe ou não? Como lidar com quem tem medo? Pode comemorar a data nas escolas? O Lunetas entrevistou especialistas para entender como entrar nesse jogo lúdico sem traumatizar as crianças.

Shoppings lotados, um trono com decorações luminosas e aquela foto ao lado de um senhor de barba e cabelos brancos distribuindo doces num saco vermelho. O Natal tem seus clássicos e um deles é a criança que chora quando encontra o Papai Noel. Algumas se assustam, outras se emocionam. Por que será que o bom velhinho causa tanto frenesi?

Até os sete anos, é muito comum que o real e o imaginário se confundam para as crianças. “Elas escutam histórias e constroem uma representação do que é o Papai Noel, mas há diferenças quando aquela figura aparece na frente delas, e isso pode causar estranhamento”, afirma a psicóloga especializada em desenvolvimento infantil, Mayara Martins Pereira. 

“O medo, como parte da condição humana, costuma se manifestar diante daquilo que é novo”

Ainda no contexto do desconhecido, é preciso observar quais as narrativas construídas em torno do personagem, já que elas influenciam na hora de fixar uma imagem mais positiva, curiosa, negativa ou até mesmo suspeita. Por exemplo, se pais e mães dizem que a criança só irá ganhar presente do Papai Noel se obedecerem e forem “boazinhas”, o que pode passar na cabeça dela quando se deparar com aquele ser onipresente que vigiou a família o ano todo?

“Para as famílias que celebram o Natal, é mais interessante deixar as crianças vivenciarem a fantasia, dialogando sobre generosidade e união, do que barganhar ou castigar”, sugere a psicóloga.  

O desconforto também pode surgir com a pressão dos adultos por aquela interação. Enquanto as famílias aguardam ansiosas para filmar ou fotografar o momento, será que alguém lembrou de perguntar para as crianças se elas querem mesmo abraçar o Papai Noel? “Se ela não quiser, não significa que é mal-educada ou não está se divertindo, mas a criança tem consciência do seu corpo e seus limites, e forçá-la a interagir com um desconhecido pode ser desconfortável”, diz.

Natal nas escolas

Com a chegada do fim do ano, é comum que muitas escolas se organizem para enfeitar ambientes, promover atividades educativas baseadas no tema e até estimular as crianças a escreverem cartinhas para o Papai Noel. No entanto, como alerta a educadora e diretora pedagógica do Espaço Ekoa, Ana Paula Yazbek, não cabe à escola trazer o Natal para o centro do dia a dia das crianças ou incentivar o consumo.

De acordo com os dados do último Censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 4,2 milhões de brasileiros declaram pertencer a religiões que não celebram a data. Isso não significa que as famílias não se reúnam, que as crianças não se encantem, troquem presentes ou que não devam acreditar em Papai Noel. “As crianças embarcam na fantasia até mesmo para poderem enfrentar a realidade e isso independe da vontade do adulto”, sinaliza Yazbek.

Para a educadora, o mais importante da época é explorar o lúdico e construir memórias afetivas em grupo. “Pelo viés da literatura, por exemplo, podemos incluir o elemento fantástico, com um velhinho ou outros diversos personagens que oferecem presentes e coisas mágicas para uma festividade.”

Para que haja respeito a todas as crianças e suas famílias, a educadora ressalta que as escolas podem tratar o Natal como uma espécie de “imersão cultural”, aproveitando a oportunidade para conversar também com as crianças sobre datas importantes para outras religiões.

Acreditar ou não em Papai Noel?

Estimular ou não a criança a acreditar em Papai Noel e até que idade são perguntas que podem assombrar alguns adultos, mas suas respostas, de acordo com as especialistas entrevistadas, podem partir da própria criança. A primeira dica é nunca subestimar os pequenos: “É um equívoco minimizar a possibilidade das crianças compreenderem as coisas. Muitas vezes, elas sabem que esse lúdico é apenas um jogo e mesmo assim elas topam participar, diz Yazbek.

Pode ser que pais e mães tenham experiências traumáticas e não queiram criar os filhos acreditando em Papai Noel ou pode ser que eles queiram proporcionar aos filhos um momento de afeto e prosperidade que não tiveram no passado. Além da questão religiosa, celebrar ou não o Natal a partir desses personagens parte de contextos muitos particulares de cada família.

Independentemente da idade, as crianças acabam encontrando rastros deixados pelo adulto na hora de esconder os presentes ou sendo confrontadas por uma criança mais velha com a afirmação temida, mas já suspeitada “Papai Noel não existe”. Para lidar com as frustrações, segundo Pereira, a comunicação é o caminho mais acolhedor. “O que você acha disso?”, “o que você está sentindo” ou “o que significa o Papai Noel para você?” podem ser boas perguntas para substituir a dose excessiva de realismo, sem banalizar a situação. 

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