Como você se sente depois que se tornou mãe? 4 mulheres respondem

Giovanna Balogh, Luciana Bento, Andréa Werner e Luiza Diener responderam a pergunta.

Mayara Penina Publicado em 08.03.2017
Mãe e filha estão deitadas no chão em posições diferentes, de forma a conseguirem olhar pro rosto uma da outra.

Resumo

“Há uma pressão constante para que a gente se sinta culpada por não estar o tempo todo com os filhos”, disse Luciana Bento”.

A maternidade retratada na televisão e nos comerciais não condiz com a maternidade real, realmente vivida pela maioria das mães brasileiras. Para investigar um pouco mais este universo, fomos conversar com algumas mulheres mães para entender como se sentem depois que viraram mães.  “Há uma pressão constante para que a gente se sinta culpada por não estar o tempo todo com os filhos”, disse Luciana Bento”. “É como se não tivéssemos mais desejos, anseios, sonhos, vontades. Somos aquelas que cuidam”, completou Andreia Wernermãe do Theo, de oito anos.

Neste Dia Internacional da Mulheres, mais do que presentes, o que as mulheres mães querem é viver livre de julgamentos, terem seus direitos assegurados para proporcionar uma vida livre, saudável e segura para seus filhos.

Confira os depoimentos

Luciana Bento é autora do blog “A mãe preta” e 100 meninas negras e mãe da Aísha, de quatro anos e da Naíma, de dois anos

A maternidade sempre foi um desejo muito grande e quando eu finalmente me tornei mãe, percebi melhor como mulher e como pessoa. A partir da minha experiência com a maternidade me senti mais motivada em lutar pelas coisas que acredito e também para viver outras experiências que não estão diretamente relacionadas a minha relação com minhas filhas. E aí começa um conflito entre o que o senso comum espera de uma mãe e o que você deseja fazer com a sua própria vida. Nunca fez parte dos meus planos, por exemplo, deixar de trabalhar depois de me tornar mãe, mas essa imagem da mãe e dona de casa sempre é tomada e as pessoas me perguntam se eu não sinto pena de deixá-las na creche ou não me dedicar integralmente os cuidados cotidianos com elas. Há uma pressão constante para que a gente se sinta culpada por não estar o tempo todo com os filhos. A maternidade também me fez compreender ainda mais as mulheres que optam por não ter filhos. Não é tão fácil quanto parece ser. Depois que nos tornamos mães o modo como a sociedade nos enxerga muda radicalmente e parece que todo mundo para a ter o “direito” de opinar sobre sua vida e suas escolhas.

Giovanna Balogh é jornalista, autora do portal “Mães de Peito”  e mãe do Bento de seis anos e do Vicente de quatro anos

Já fui aquela mulher que era contra o feminismo, mas após a maternidade percebi como esse movimento é muito maior e necessário para todas. Após voltar da licença-maternidade vi o quanto as mulheres e, principalmente, as mães são discriminadas no mercado de trabalho. Ocupava um cargo de chefia e fui colocada de escanteio como se o fato de ser mãe inviabilizasse a minha capacidade de ser a mesma profissional de antes. Sofri assédio moral, mas infelizmente não sou a única. Quantas e quantas trabalhadoras são demitidas assim que acaba a licença-maternidade? A nossa sociedade machista vê a a licença como “férias prolongadas” quando são apenas quatro míseros meses onde a mulher é obrigada a retornar ao mercado antes mesmo de começar a introdução alimentar do seu bebê. As mulheres precisam se unir para lutar por direitos iguais não só nas redações, escritórios, mas nos afazeres domésticos, cuidados com os filhos, entre outros aspectos do nosso cotidiano. O que mais se vê é mulher se redobrando em jornadas triplas e sendo discriminada. A mãe pode sim sair para se divertir sem ser questionada “com quem estão seus filhos?”. Nenhum pai quando saí com os amigos ouve esse tipo de pergunta. O mesmo vale para quando ela for procurar emprego. Precisamos estar unidas, informadas, empoderadas para parir com dignidade, amamentar e criar os filhos sem sermos colocadas de escanteio pela sociedade. Somos mães, mas podemos tudo.

Andréa Werner é jornalista, escritora e autora do blog Lagarta Vira Pupa, que fala sobre autismo e inclusão e mãe do Theo, de oito anos.

Cresci vendo minha mãe exercer o papel que era esperado de uma mulher na época em que ela nasceu: do lar, do marido, dos filhos. Apesar dela sempre dizer que seu sonho era ser mãe, eu sentia uma certa frustração quando ela mencionava o sonho não realizado de ser arquiteta. Afinal, meu avô só havia permitido que ela fizesse magistério, “curso de mulher”. Ela lecionou por algum tempo, mas acabou deixando tudo após o casamento. Talvez por isso ela insistia tanto que eu e minha irmã precisávamos estudar e ter nossa profissão, nosso dinheiro. E foi o que eu fiz: após a formatura em jornalismo, entrei, através de um programa de trainees, no mundo das grandes corporações. O sonho realizado ao me tornar mãe não escondeu um certo desconforto. Afinal, o que sempre ouvi de outras mães e vi retratado na mídia é que aquela vivência era maravilhosa, trazia plenitude e alegria. A mulher, naquele momento, se tornava mãe. E, apesar disso não ser explícito, havia uma conotação de “morte da mulher e nascimento da mãe”, como se os dois papéis não pudessem conviver na mesma pessoa. E, passados os três meses iniciais, notoriamente mais difíceis, eu ainda sentia um cansaço acima da média, uma boa dose de saudade da liberdade anterior, um questionamento genuíno sobre a expectativa que eu tinha versus a vida real que obtive. Foi quando me rebelei contra o padrão que via ao redor e decidi tentar manter meu lado mulher ainda vivo e respirando. E, quando Theo fez oito meses, viajei sozinha com meu marido pela primeira vez desde o nascimento dele. Ficamos cinco dias fora e achei aquela experiência renovadora, como uma brisa fresca no meio do calor do verão. E assim decidimos: iríamos tentar deixar o bebê com os avós nem que fosse uma vez por ano. Precisávamos ter um momento homem e mulher, namorados, marido e esposa, comer o que quiséssemos e a hora que quiséssemos, dormir até tarde, recarregar as baterias, para voltar renovados para o nosso filho. E foi logo após uma viagem dessas, quando faltava um mês para o Theo fazer dois aninhos, que descobrimos que ele era autista. Realidade: se uma mãe de criança típica já sofre alguma pressão para se anular, para abandonar a mulher se tornar somente a mãe, para as mães de crianças com deficiências, este peso vem em dobro. Se o modelo social e exibido na mídia é da mãe que vive feliz, não chora, não reclama, e está sempre realizada com a sua vida, com as chamadas “mães especiais” isso é ainda pior. Somos quase canonizadas. Alguns nos chamam de “escolhidas por Deus”. Temos “uma missão”. E isso nos desumaniza. É como se não tivéssemos mais desejos, anseios, sonhos, vontades. Somos aquelas que cuidam. Que suportam tudo. Que engolem a frustração e enterram o lado mulher em prol da “missão”. Reclamar? Jamais! Aceite sua missão divina e não perturbe ninguém com seu mimimi! Acontece que minha mãe me criou “inconformada”. Hoje, se posso contribuir de alguma forma para este grupo de mulheres conhecidas como “mãe especiais”, é mostrando que não precisamos morrer, nos anular, abafar nossa voz por causa da maternidade atípica. Uma coisa não exclui a outra. Podemos ser ótimas mães sem perder de vista quem somos, do que gostamos. Os novos tempos permitem à mulher exercer vários papéis: o de mãe, profissional, namorada, o que ela quiser. E isso é genuíno. Aí está a verdadeira realização. Em fazer nossas escolhas e exercê-las, ao invés de tê-las enfiadas goela abaixo. Larguei o mundo das multinacionais após o diagnóstico do Theo porque estava difícil conciliar trabalho puxado versus terapias. Mas me encontrei, atualmente, como escritora. Trabalho de casa. Estou realizada desta forma. Viva o poder de escolha!”

Luiza Diener é autora do blog Potencial Gestante é mãe do Benjamin de seis anos, Constança de três anos e da Guadalupe, de um ano.

Eu comecei a perceber algumas coisa sobre diferença de gênero quanto eu tive o Benjamim, meu primeiro filho, foi quando tive minhas primeiras sacadas de estereótipo de gênero. Minha segunda filha, só sui saber que era menina no dia que ela nasceu. Foi uma segunda faísca neste tema. No começo não fazia diferença, era só um bebê, nos primeiros meses não saquei muita coisa. Com o nascimento da Constança, a partir de 2014, junto com movimentos políticos no Brasil, eu comecei a olhar para o que eu vinha passando a vida inteira que vai além dos estereótipos de gênero. Comecei a perceber vários comportamentos que eu tinha e comecei ver as cobranças em cima da minha filha e decidi que não ia deixar. Aí começou a minha batalha. Foi diferente sendo mãe de menino, porque eu comecei  ver pelos meus olhos, eu Luiza, criança.  Percebi que a Constança era mais uma menina no meio de milhões de mulheres. Essa foi a terceira faísca, tudo no movimento de observação. Na gravidez da Guadalupe não sabia que era uma menina também, mas consegui sentir um despertar muito feminino. Acredito que tem a ver com vários fatores: além dos movimentos políticos dessa direção, uma conexão mesmo com a minha menina, uma conexão muito grande com outras mulheres, isso é meio místico (risos). Quando ela nasceu eu até ensaiei o título de outro post: “O dia em que eu pari outra mulher”.  A gente brinca que “As meninas são maioria aqui em casa!” e eu sempre ensino que meninos e meninas podem brincar de tudo o que quiserem. A gestação muda muito a gente, eu aprendi a ouvir meu corpo, respeitar meu corpo, eu percebi que esta gestação estava me ensinando a saber ser mais posicionada em relação as coisas, dizer mais não, acolher mais as outras pessoas.

 

 

 

 

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