A obesidade é considerada a maior epidemia infantil da História. A estimativa é que, em cada cinco crianças obesas, quatro serão adultos obesos no futuro
Dados mostram que as crianças de hoje viverão 10 anos a menos que seus pais por conta do ambiente alimentar, e 30% delas está acima do peso.
Quais são os desafios que envolvem cuidar da alimentação das crianças cotidianamente em um mundo roteirizado para o consumo? O site Pensar Contemporâneo analisou o documentário “Muito Além do Peso” (Maria Farinha, 2012), e entrevistou a diretora Estela Renner, com o intuito de ressaltar pontos importantes a serem observados na hora de colocar a comida na mesa.
Os dados apresentados no filme são alarmantes: 56% das crianças brasileiras com menos de um ano bebem refrigerante – até mesmo em mamadeira e 30% estão acima do peso. A proporção é de que, em cada cinco crianças obesas, quatro serão obesas no futuro
Segundo Estela, a obesidade e o sobrepeso carregam com eles outras doenças muito graves, que só víamos em adultos até então: diabetes tipo 2, alguns tipos de câncer, doenças do coração, pulmão, entre outros.
“É preciso sacudir as pessoas em relação a esse assunto. Os pais sabem que seu filho está com colesterol alto, mas acreditam que vai passar, que sempre vai acontecer a fase do estirão”
Além de trazer reflexões sobre alimentação e os hábitos que podem contribuir para a obesidade, o documentário também desmistifica alguns mitos. A ideia de que a genética é a grande vilã, por exemplo, não é comprovada em números.
“Poucos sabem que o fator genético ocupa somente 10% dos casos e que a obesidade e o sobrepeso podem também ser domados com uma reeducação alimentar”
Além de dialogar com o público em geral, o objetivo do filme é trazer informações sobre o assunto, em um contexto brasileiro, e aparelhar mães e pais com um conhecimento fundamental para inspirar novas forma de educação alimentar no ambiente doméstico.
Criar uma nova consciência sobre o assunto é essencial para enfrentar um outro grande desafio: a publicidade infantil.
“É preciso regulamentar a publicidade dirigida às crianças urgentemente. Não podemos mais deixar que os pais sozinhos enfrentem esta batalha só porque eles são os pais das crianças. Os pais precisam de ajuda porque as crianças precisam de ajuda”, defende a diretora.
Em sua opinião, as cenas dos bebês tomando refrigerante antes do primeiro ano de vida são as mais chocantes.
“Um dos nossos primeiros contatos com o mundo é por meio do aleitamento materno e é um momento fundamental de reconhecimento e formação da relação mãe e filho”, explica diretora.
“Além de chocante do ponto de vista da saúde, acho muito simbólico, do ponto de vista das relações que estamos criando, ter um produto tão cheio de químicos já intrometido entre mãe e filho”
Depois do filme, até a equipe de produção mudou os hábitos alimentares. “Você convive com isso por quase dois anos, e naturalmente não tem mais coragem de colocar na boca uma coisa que tem um corante proibido na Europa porque provoca câncer”, conclui a cineasta.
Mas além de saber avaliar o que é posto à mesa, analisar os comportamentos que contribuem para um quadro de obesidade também é importante.
Horas em frente à televisão e computadores, maus hábitos alimentares e a negociação do afeto ou da obediência por meio da comida são pontos de atenção.
Algumas cenas são emblemáticas, como a da birra em que uma criança só se acalma e para de chorar compulsivamente quando recebe o que está pedindo.
Segundo a diretora, que viajou o Brasil para ouvir diferentes histórias, apesar das diferenças entre as regiões do país, os problemas alimentares das crianças, em geral, são os mesmos. Independentemente de onde ou como vivem.
“Tanto a criança do Amazonas quanto a do Rio Grande do Sul não sabe o que é um mamão e não lembra quando foi a última vez que comeu uma manga. E todas adoram e consomem salgadinhos e refrigerantes“, contou Estela.
Além das entrevistas com as famílias e dos dados pesquisados, o filme ouviu uma série de especialistas nacionais e internacionais da medicina, da nutrição, do direito, da psicologia e da publicidade.
Entre eles, Frei Betto; Enrique Jacoby, médico da Organização Mundial de Saúde; o chef Jamie Oliver e Amélio Fernando de Godoy Matos, do Instituto de Diabetes e Endocrinologia.
Os especialistas defendem a regulamentação da composição do produto por parte do governo, como também sobretaxar alimentos que vão gerar custo para a saúde pública depois – como fazem com o cigarro, no caso de produtos muito ricos em açúcares, gordura e sal.
“As pesquisas, segundo Jamie Oliver, indicam que a criança de hoje viverá 10 anos a menos que seus pais por causa do ambiente alimentar que criamos em volta dela”, alertou a diretora.
A educação alimentar nas escolas deve entrar como parte do currículo escolar das crianças. Eles também apontam como fundamental as campanhas de mídia alertando para o que se deve e o que não se deve oferecer para o seu filho no cotidiano.
Assista ao trailer de “Muito além do peso”: