O preconceito começa na infância: ‘Chamaram meu filho de viado’

A homofobia e o preconceito começam na infância 

Da redação Publicado em 21.09.2017

Resumo

"Até quando crianças vão continuar reproduzindo falas e ofensas de um universo machista particular?", questionou o blogueiro Hilan Diener.

Por conta da polêmica decisão do juiz Waldemar Cláudio de Carvalho, da 14ª Vara do Distrito Federal, que concedeu uma liminar que, na prática, torna legalmente possível que psicólogos ofereçam pseudoterapias de “cura gay”, o debate em torno do respeito à diversidade mobilizou ativistas e blogueiros do mundo da infância que se manifestaram publicamente sobre o tema.

“Eu morreria feliz se eu e a Luiza conseguíssemos deixar esse legado para o mundo. Onde a palavra ‘gay’ signifique ‘feliz’ e não uma ofensa”, escreveu o Hilan Diener, co-autor do blog Potencial Gestante, em recente postagem sobre diversidade e educação dos filhos.

No texto ‘Chamaram meu filho de viado’, o blogueiro e pai compartilhou duas situações vividas por ele com seu filho mais velho, Benjamim, que está com sete anos. Na primeira, Benja comenta que foi chamado de “viado” por um colega da escola, e pergunta o significado do chamamento na situação, na segunda, de “mulherzinha”.

“Até quando crianças vão continuar reproduzindo falas e ofensas de um universo machista particular? Isso é ou não é um sintoma de uma sociedade doente, que exige uma masculinidade agressiva e cheias de demonstrações de poder?”, questionou o blogueiro.

No texto, Hilan exemplifica seu ponto de vista relembrando o episódio em que, por conta de uma foto compartilhada nas redes sociais em que estaria em uma pose “feminina”, o príncipe George, um bebê de 4 anos, foi apelidado de “reizinho gay”.

A homofobia e o preconceito começam na infância 

Em que momento da vida um indivíduo se torna homofóbico? E, como educar e criar crianças para que cresçam adultos que repeitem todas as pessoas, independente de qualquer coisa -como raça, gênero, condição social e opção sexual?

Mesmo não havendo uma resposta única para essas perguntas, algumas posturas e reflexões podem  inspirar uma educação que combata o preconceito e o machismo.  Inspire-se com as sugestões de manifesto redigido pela jornalista Silvia Amélia de Araújo:

Pelos direitos dos meninos

  • Que nenhum menino seja coagido pelo pai a ter a primeira relação sexual da vida dele com uma prostituta (isso ainda acontece muito nos interiores do Brasil!).
  • Que nenhum menino seja exposto à pornografia precocemente para estimular sua “macheza” quando o que ele quer ver é só desenho animado infantil (isso acontece em todo lugar!).
  • Que ele possa aprender a dançar livremente, sem que lhe digam que isso é coisa de menina.
  • Que ele possa chorar quando se sentir emocionado, e que não lhe digam que isso é coisa de menina.
  • Que não lhe ensinem a ser cavalheiro, mas educado e solidário, com meninas e com os outros meninos também.
  • Que ele aprenda a não se sentir inferior quando uma menina for melhor que ele em alguma habilidade específica – já que ele entende que homens e mulheres são igualmente capazes intelectualmente e não é vergonha nenhuma perder para uma menina em alguma coisa.
  • Que ele aprenda a cozinhar, lavar prato, limpar o chão para quando tiver sua casa poder dividir as tarefas com sua mulher – e também ensinar isso aos seus filhos e filhas.
  • Na adolescência, que não lhe estimulem a ser agressivo na paquera, a puxar as meninas pelo braço ou cabelos nas boates, ou a falar obscenidades no ouvido de uma garota só porque ela está de minissaia.
  • Que ele não tenha que transar com qualquer mulher que queira transar com ele, que se sinta livre para negar quando não estiver a fim – sem pressão dos amigos.
  • Que ele possa sonhar com casar e ser pai, sem ser criticado por isso. E, quando adulto, que possa decidir com sua mulher quem é que vai ficar mais tempo em casa – sem a prerrogativa de que ele é obrigado a prover o sustento e ela é que tem que cuidar da cria.
  • Que, ao longo do seu crescimento, se ele perceber que ama meninos e não meninas, que ele sinta confiança na mãe – e também no pai! – para falar com eles sobre isso e ser compreendido.
  • Que todo menino seja educado para ser um cara legal, um ser humano livre e com profundo respeito pelos outros. E não um machão insensível! Acredito que se todos os meninos forem criados assim eles se tornarão homens mais felizes. E as mulheres também serão mais felizes ao lado de homens assim. E o mundo inteiro será mais feliz.

Pelos direitos das meninas

  • Que nenhuma menina aprenda que tem que ser “boazinha” com todos, apenas educada – mas não em todas as situações!
  • Que nenhuma menina tenha apenas a beleza elogiada. Em longo prazo, isso pode trazer mais sofrimento do que alegria. Além dos “princesa”, “linda” e gatinha” elogie também sua coragem, determinação, inteligência, seu talento para cantar, escrever ou andar de patins, por exemplo.
  • Que nenhuma menina tenha de ouvir desde os três anos até se casar (ou até morrer, se ela não se casar) a pergunta “e o namoradinho, cadê?” Vira o disco, famílias!
  • Que toda menina possa brincar com os brinquedos de sua real preferência. Mas que os pais não se esqueçam de lhe oferecer o brinquedo universal: uma bola!
  • Que toda menina tenha a chance de aprender a correr bem rápido e a gritar a plenos pulmões. É libertador e, infelizmente, pode ser necessário em algum momento.
  • Que nenhuma menina seja obrigada a ajudar nas tarefas domésticas enquanto irmãos-meninos sempre podem brincar à vontade.
  • Que nenhuma menina escute a sua volta – mesmo enquanto for um bebê que “não entende nada” – comentários sobre os “PERIGOS” de ser menina. Aquelas frases-feitas que se referem unicamente à possibilidade dela ter uma vida sexual quando virar mulher. Tipo: “é bonita, hum… vai dar trabalho”, “olha como fica de perna aberta” (sim, é inacreditável, mas tem gente que faz esse comentário sobre um bebê do sexo feminino), “menina é fácil de criar quando pequena, mas quando cresce dá mais dor de cabeça”, “se eu fosse você já olhava uma vaga no convento…”.
  • Que nenhuma menina escute o pai dizer “se alguém fizer mal a minha filha, eu MATO”. É que quando ela crescer, se for vítima de violência doméstica, por exemplo, pode não dar queixa justamente com medo de que o pai cometa uma loucura. Muito melhor dizer à própria filha “nunca tenha vergonha de me contar nada que estiver lhe incomodando”.
  • Que cada pai compartilhe com a filha as suas paixões (time de futebol, uma banda de heavy metal, mecânica de eletrônicos…) e não deduza que ela nunca terá interesse em nada disso “por ser menina”
  • Que nenhuma menina seja levada pela mãe a passar por dolorosos tratamentos estéticos (alisamento, tirar cutícula, depilar…). Por favor, não coloquem essas preocupações na cabeça de uma criança! No futuro, quase tudo o que ela ler/ver vai repetir “corpo ideal”, “cabelo ideal” e vários outros “ideais de beleza” …
  • Que nenhuma menina aprenda que não pode ser amiga de meninos porque eles sempre têm “má intenção”.
  • Que nenhuma menina aprenda que mulheres não são amigas entre si porque são “invejosas e competitivas”.
  • Que nenhuma menina ouça dos pais que não pode tocar partes do seu próprio corpo (quando estiver sozinha!) porque isso “é muito feio”
  • Que meninas não precisem mais ouvir o “já pode casar” a cada vez que faz um café ou qualquer tarefa na cozinha. Que todas as meninas aprendam desde cedo que casar é opcional! E ter filhos também!
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