O mês de julho está terminando, assim como o fim das férias escolares. A tristeza e indignação diante das centenas de milhares de mortes por covid-19 vão abrindo espaço para um sopro de esperança. Com o avanço da vacinação, fica cada vez mais próximo o horizonte desejado do retorno presencial das crianças às escolas, com profissionais da educação vacinados e protocolos sanitários protegendo, da melhor forma possível, a comunidade escolar.
Vamos voltar às escolas como antes – ou esse tempo em isolamento mudou algo em nós, como famílias, profissionais da educação e da saúde?
No que diz respeito à garantia de uma alimentação adequada e saudável, vivemos tempos difíceis, em que mais pessoas passam fome e mais da metade da população brasileira vive em situação de insegurança alimentar – provocada pelo aprofundamento da crise econômica e agravada pela pandemia, fatores que, combinados, provocaram aumento exagerado nos preços dos alimentos saudáveis.
A situação de insegurança alimentar ainda coincide com o aumento da obesidade infantil, uma vez que são cada vez mais baratos os produtos alimentícios não saudáveis, que incluem refrigerantes, suquinhos industrializados com muito açúcar, chás gelados e bebidas lácteas, além de salgadinhos, biscoitos de pacote e macarrão instantâneo.
As indústrias desses produtos (poderosas corporações) investem milhões de dólares por ano para nos martelar com anúncios e publicidade na TV, em sites, nas redes sociais e até nos joguinhos das crianças.
Quando se trata das bebidas açucaradas, as indústrias fazem de tudo para convencer crianças, jovens e famílias de que beber água não é suficiente, para que achemos “normal” que todas as refeições sejam acompanhadas de bebidas excessivamente açucaradas. O objetivo deles é vender muito e lucrar cada vez mais – independente das doenças que são associadas a esses produtos como obesidade, diabetes tipo 2, hipertensão, complicações renais, entre outras.
Uma pesquisa recente mostrou que as crianças brasileiras consomem, em média, 88 litros de bebidas açucaradas por ano – muito mais do que a média para adultos, que é de 62 litros. Usando essa média de consumo e modelos epidemiológicos que calculam o risco atribuível desses produtos à saúde, pesquisadores afirmam que 721 mil crianças estão com obesidade ou sobrepeso no Brasil devido ao consumo de bebidas açucaradas. Não é impressionante pensar que esses casos – e todo o sofrimento que está por trás de cada uma das crianças com excesso de peso – poderiam ser evitados se esse tipo de bebida não estivesse disponível às crianças?
O que escola e alimentação têm a ver? Tudo! O ambiente escolar é o segundo ambiente mais importante na alimentação das crianças, só perde para… a casa. No caso dos estudantes de escolas públicas, a alimentação é oferecida pela própria escola, seguindo cardápios criados por nutricionistas e orientados por uma lei federal, que instituiu o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE). Um programa que, apesar dos desafios que enfrenta, vem garantindo alimentação adequada e saudável para 41 milhões de crianças e adolescentes no Brasil. Só que, infelizmente, o PNAE não atende a todos. No caso das escolas particulares, a cantina escolar é que assume o protagonismo. Você já analisou os produtos vendidos por lá?
Infelizmente, a maioria das cantinas vende produtos alimentícios ultraprocessados, como as bebidas açucaradas, produtos que devem ser evitados de acordo com o Guia Alimentar da População Brasileira e o Guia Alimentar para Crianças Brasileiras Menores de Dois Anos, ambos documentos norteadores do Ministério da Saúde, elaborados em parceria com diversos pesquisadores brasileiros renomados.
A ACT Promoção da Saúde encomendou uma pesquisa de opinião ao Instituto Datafolha e confirmou que a população brasileira não engole a conversa fiada da publicidade: aproximadamente oito em cada dez brasileiros são contrários à venda de bebidas adoçadas nas cantinas de escolas públicas e particulares, sendo 63% totalmente contra, o que revela uma preocupação com o fácil acesso que as crianças têm a esses produtos e a percepção de que o ambiente escolar deve ser protegido.
Para que nossas crianças se alimentem de forma saudável, precisamos estar atentos à disponibilidade dos alimentos: se produtos não saudáveis estão muito acessíveis, eles são mais consumidos. Fazer escolhas saudáveis não deveria ser tão difícil para pais, mães e responsáveis.
Precisamos do apoio das políticas públicas para que bebidas adoçadas e outros produtos ultraprocessados não invadam nosso cotidiano e adoeçam nossas crianças.
Estudantes de escolas públicas, por exemplo, estão mais protegidos no ambiente escolar por causa do PNAE, que limita a oferta de produtos não saudáveis. Mas e os estudantes das escolas privadas?
Refrigerantes nas escolas, não!
* As autoras Rosa Maria Mattos (jornalista e assessora de comunicação), Bruna Hassan (nutricionista e epidemiologista) e Kelly Alves, (nutricionista e especialista em saúde coletiva) fazem parte da ACT Promoção da Saúde.
** Este texto é de exclusiva responsabilidade do autor e não reflete, necessariamente, a opinião do Lunetas.
Leia mais