Medida restringe o acesso as principais terapias voltadas a este público; planos de saúde não precisam mais cobrir esse atendimento
Todos que utilizam planos privados de saúde podem não ter tratamentos cobertos com a aprovação do rol taxativo. Crianças autistas são potenciais afetadas pela mudança.
Em segunda seção e com seis de nove votos, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu no dia 8 de junho que os planos de saúde agora operam com rol taxativo: não precisam cobrir procedimentos não incluídos na lista de procedimentos e eventos em saúde da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). A medida pode afetar 49 milhões de usuários de planos de saúde, além dos impactos ao Sistema Único de Saúde (SUS), que ficará ainda mais sobrecarregado.
Antes da decisão, os planos de saúde atuavam com rol exemplificativo: não se limitavam a cobrir apenas o que está na lista da ANS, que considera apenas o mínimo do que os convênios são obrigados a cobrir. Caso o paciente tivesse exames, cirurgias e/ou medicamentos negados, desde que houvesse fundamentação técnica, era possível recorrer à Justiça para conseguir a cobertura do convênio.
“Isso significa que, se surgirem doenças novas como a covid, ou doenças raras, vários procedimentos vão acabar sendo negados, porque não estarão no rol obrigatório. A lista de procedimentos é apenas um exemplo. Na verdade, os beneficiários têm direito à integralidade de benefícios, tendo em vista a questão da defesa da vida e da saúde de forma integral”, destaca, em nota, Shirley Morales, conselheira nacional de Saúde e coordenadora-adjunta da Comissão Intersetorial de Saúde Suplementar (CISS), do Conselho Nacional de Saúde.
Em nota, a Associação Brasileira dos Planos de Saúde (Abrange) justifica que o rol taxativo “salvaguarda a segurança jurídica, precisão técnica, viabilidade e sustentabilidade desse serviço, é a que melhor protege a coletividade dos beneficiários de planos de saúde”. Porém, o sistema taxativo apresenta fragilidades quando pessoas com deficiência, doenças raras e/ou autistas entram em pauta, considerando que tratamentos mais específicos voltados a estas populações sejam interrompidos pela não-obrigatoriedade de cobertura. Alguns dos exemplos de procedimentos que não estão presentes no rol da ANS são os métodos DIR/Floortime, Denver e ABA (abreviação em inglês para “applied behavior analysis” – análise do comportamento aplicada), voltados a crianças autistas.
“Inacreditável que as consequências do rol taxativo não tenham sido consideradas pelos ministros que votaram a favor, eles estavam preocupados com a saúde financeira dos planos de saúde, que tiveram lucro recorde. A gente fica na mão de pessoas e órgãos sem o mínimo de empatia ou que agem com interesses obscuros”, opina Valéria Lima. Mãe de Raul, 6, o menino realiza terapia baseada em ABA por meio do convênio, com uma equipe multidisciplinar que o acompanha diariamente. Com a aprovação do rol taxativo, a incerteza é o sentimento que domina, sem saber o que acontecerá quando a validade das guias de Raul chegarem ao fim.
“A gente já luta tanto para conseguir as terapias adequadas, para encaixar tudo na rotina deles. Perder isso de uma hora pra outra é muito difícil.”
De maneira excepcional, a cobertura pode ser admitida se esgotadas as opções terapêuticas do rol ou diante da recomendação de órgãos técnicos, nacionais e internacionais. Para um procedimento ser incluído no rol da ANS, ele deve passar pela Avaliação de Tecnologia em Saúde (ATS). Processos de submissão, análise e incorporação de novas tecnologias possuem prazos máximos que variam de 120 a 270 dias.
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