Quando médico e paciente estão alinhados, a chance de o processo de amamentação acontecer de forma natural e sem traumas é muito maior
A enfermeira e consultora em amamentação Natália Turano explica a importância de um protocolo nacional de aleitamento para orientar famílias e profissionais. Confira a entrevista!
Quando se trata de aleitamento materno, mais do que reforçar seus evidentes e inquestionáveis benefícios para o desenvolvimento do bebê, é preciso também pensar que amamentar deve ser só possível, mas confortável, e para as duas partes envolvidas.
Basta uma olhada rápida na sequência acima para reparar como se dá a reação em série de causas e consequências de um processo mal conduzido ou negligenciado. Para Natália Turano, consultora em lactação certificada pelo IBLCE- International Board of Lactation Consultant Examiners e enfermeira do Hospital Albert Einstein, esse ciclo vicioso tem um único disparador comum: a falta de informação.
“Uma amamentação adequada e informação correta previne a complementação alimentar, por isso a mulher precisa se informar cada vez mais, principalmente no começo da amamentação”.
Amamentação é um processo natural, mas precisa aprendido, com muita calma e orientação confiável”, explica a profissional ressaltando que a apreensão do ato de amamentar é processual e varia muito de mulher para mulher. “Amamentar nem sempre é tão fácil”, pondera.
Nesse contexto, é preciso discutir a importância de um protocolo nacional de aleitamento materno, para munir não só as famílias, mas também os profissionais de saúde com as informações mais completas, atualizadas e seguras que a literatura sobre o assunto oferece.
Hoje, no Brasil, a grande referência que dá norte aos profissionais do meio são os Cadernos de Atenção à Saúde do Ministério da Saúde, cuja última edição é de 2015. Lá, constam informações completas e seguramente comprovadas não só sobre os benefícios e a importância do aleitamento, mas também sobre questões pontuais que podem figurar nas dúvidas e nos receios mais frequentes das mulheres, como duração da amamentação, técnicas de pega, manejo e armazenamento de leite materno em condições específicas, restrições ao aleitamento, entre muitos outros tópicos.
O documento, chamado “Saúde da Criança – Aleitamento Materno e Alimentação Complementar” está disponível no site do MS para download gratuito.
Segundo Natália, um protocolo nacional de aleitamento atua no sentido de padronizar a conduta médica, especializada e familiar, a fim de minimizar os mitos que cercam o aleitamento. “Fonoaudiólogo, nutricionista, profissionais de saúde em geral, famílias: todos precisam falar a mesma língua”, explica.
A profissional fala também sobre a importância da rede de apoio no período de amamentação. “Para que a mãe tenha sucesso, ela precisa de apoio não só dos profissionais, mas também da sociedade e da família. Não é uma responsabilidade só da mulher”, diz.
Turano explica que, quando médico e paciente estão alinhados, a chance de o processo de amamentação – que engloba o antes, o durante e o depois do ato de amamentar – acontecer de forma natural e sem traumas é muito maior.
“Pega, posicionamento adequado, patologias mamárias, mastite, há várias coisas que englobam esse processo. Uma das principais causas de desmame, por exemplo, é o trauma mamilar, ou seja, a dor que a mulher sente. Para melhorar isso, é preciso dar suporte”, ressalta.
Ou seja, não basta optar pelo aleitamento materno, é preciso que a mulher esteja inserida em um contexto de acolhimento, empatia e colaboração em todo o processo. Afinal, é a mulher quem dá o peito, mas toda a família participa junto, cooperando, apoiando e assumindo tarefas no lugar da mãe.
“Os pais têm sido identificados como importante fonte de apoio à amamentação. No entanto, muitos deles não sabem de que maneira podem apoiar as mães, provavelmente por falta de informação. Alguns sentimentos negativos dos pais, comuns após o nascimento de um filho, poderiam ser aliviados se eles estivessem conscientes da importância do seu papel, não apenas nos cuidados com o bebê, mas também nos cuidados com a mãe.” (Fonte: “Saúde da Criança – Aleitamento Materno e Alimentação Complementar”)
“Muitas vezes, as mulheres precisam de um reforço positivo em relação à amamentação, mas algumas buscam informação junto a pessoas que não estão preparadas para fornecê-las. O ideal é que a mulher tenha um suporte desde a gestação até o pós-parto”, reforça.
No entanto, se ainda hoje a amamentação não é um assunto esclarecido para muitas pessoas, antigamente era ainda pior, quando o acesso à informação não era tão simplificado. Isso faz com que mulheres de gerações passadas carreguem uma grande carga de traumas sobre seus períodos de aleitamento, o que contribui para perpetuar mitos e medos infundados.
“Buscar referências com mulheres que não tiverem boas experiências em relação à amamentação (por exemplo, avós ou mesmo mães da nutriz que não tiverem orientação nem acesso à informação) pode atrapalhar muito. Ou ainda na internet, com amadores. Hoje, muitas mulheres buscam ajuda em bancos de leite na região onde moram ou nos hospitais onde deram à luz, é muito mais fácil conseguir informação do que antigamente”, pontua a enfermeira.
A consultora aconselha que, além dos Cadernos de Atenção à Saúde Básica do Ministério da Saúde, a mulher pode buscar informações junto à Unicef, Pastoral da Criança e no site da SBP (Sociedade Brasileira de Pediatria).
A resposta à questão acima é complexa, e envolve uma série de fatores que concernem tanto à esfera do poder público, quanto das iniciativas privadas e da mobilização comunitária e individual. Isso porque os direitos da mulher no que toca à amamentação estão representados pela licença-maternidade, pela legislação que prevê o direito de armazenar o leite materno em creches e escolas, pela pausa para amamentação prevista nas leis trabalhistas. Natália Turano ressalta a importância de dar continuidade ao suporte do aleitamento no pós-parto.
“A questão da volta ao trabalho é muito importante, sem dúvida, o ideal seria que a mulher tivesse a licença ampliada para seis meses. As mulheres voltam a trabalhar quando o bebê tem ainda quatro meses de vida, o que é muito prejudicial. Mas o que eu acho que poderíamos melhorar é o suporte no pós-alta hospitalar. O ideal seria que existisse um processo de orientação domiciliar à mulher. O Governo poderia dar subsídio para isso, como acontece em países de primeiro mundo, oferecer enfermeiras de cuidado a domicílio, mas não só, é preciso que os hospitais também tenham esse serviço”.
Segundo ela, esse cenário ideal ampliaria as opções às quais a mulher poderia recorrer quando tivesse dúvidas, evitando que ela fique suscetível a profissionais incapacitados ou mesmo fontes não seguras na internet, como é comum acontecer.
Um estudo publicado na publicação médica britânica The Lancet apontou o Brasil como país referência mundial em aleitamento materno. A publicação cruzou dados de 1.300 estudos de 159 países, e destacou como diferenciais do país a regulamentação da Lei da amamentação, em novembro de 2015, que limitou a comercialização de substitutos do leite materno, a sistematização da certificação dos hospitais “Amigos da Criança”, e também a rede brasileira de bancos de leite humano que é a maior do mundo, com 218 hospitais e 161 postos de coleta distribuídos em todos os estados. O modelo brasileiro, inclusive, já foi exportado para 25 países da América Latina, da África e da Europa.
A mulher gestou, deu à luz e já está amamentando. A quem recorrer durante o pós-hospitalar? Hoje, a mulher que precisa de auxílio pode recorrer aos bancos de leite de seu bairro, a hospitais e profissionais obstetras e consultores de aleitamento de sua confiança, ou ainda a serviços em domicílio.
“No Einstein, temos esse serviço de home care, além do serviço de amamentação. Quando avaliamos que é um aleitamento de risco, que a mulher está com dificuldade no pós parto, ela recebe um profissional enfermeiro especialistas em amamentação na casa dela. Algumas maternidades possuem esse serviço, e outras não”, explica Natália.
O atendimento baby care, por exemplo, inclui serviços como maternidade em casa (apoio domiciliar às mães); orientação à amamentação e aos cuidados nos primeiros dias de vida por enfermeiras; cuidados com o recém-nascido, incluindo o bebê prematuro e outros procedimentos domiciliares especiais.
Além disso, o Hospital possui também tele baby care, uma consultoria à distância que a mulher pode usufruir do conforto de sua casa. O serviço oferece consultoria de enfermeiras especialistas, em uma consulta individual e personalizada, que visa complementar o atendimento hospitalar. Ambos os serviços são pagos pelo paciente – saiba mais aqui. É possível ter mais detalhes também pelo e-mail orientacaomaterna@einstein.br ou pelo telefone (11) 2151-1233.
Na hora de procurar auxílio, um ponto é fundamental: saber a quem recorrer, no sentido de conhecer e confiar no trabalho do profissional ou da instituição escolhida.
Hoje, para ser consultor de amamentação, é preciso prestar uma prova de aplicação do IBLCE, instituto americano que fornece o Certificado Internacional de Consultor em Lactação. Antes de realizar a prova, é precisar comprovar horas de assistência à amamentação e conhecimento prévio na área, além de cursos de aperfeiçoamento e atualização. A prova é anual, e o título tem duração de cinco anos, e após esse período é preciso refazer o processo. Ou seja, consultores certificados são inegavelmente preparados para dar os subsídios que a nutriz, o bebê e sua família necessitam.
“O objetivo básico do Certificado Internacional de Consultor em Lactação é beneficiar o público por meio do estabelecimento de critérios mínimos para a prática dos profissionais que se dedicam ao aleitamento materno. Espera‐se que um profissional habilitado com este certificado tenha todas as condições de assistir as duplas mães‐bebês e suas famílias e ajudá‐las no manejo das dificuldades com o aleitamento materno. Além disso, os profissionais que trabalham com aleitamento materno que possuem este certificado são reconhecidos e, em muitos países, recebem oportunidades diferenciadas em relação àqueles que não o possuem.”
(Fonte: Sociedade Brasileira de Pediatria)
Podem se candidatar ao certificado, profissionais de diversas áreas tais como médicos, enfermeiros, nutricionistas, fisioterapeutas, fonoaudiólogos, assistentes sociais, educadores, entre outros, desde que preencham critérios específicos e possuam um histórico satisfatório de conhecimento prévio. Clique aqui para conhecer os pré-requisitos, e acessar o passo a passo de como obter a certificação.
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Em 2017, o Catraquinha esteve em uma parceria com o Hospital Israelita Albert Einstein para falar sobre temas que fazem parte da vida de mães, pais e cuidadores: saúde da criança, saúde da gestante, parto e amamentação. Em 2018, o Catraquinha virou Lunetas e passou a fazer parte exclusivamente da estrutura do Instituto Alana.