A revolução a favor do clima será guiada pelas crianças

Pela primeira vez, crianças e jovens ecoaram suas vozes durante a Conferência do Clima, no Egito

Foto colorida de mãos de crianças que seguram uma maquete do planeta Terra
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Resumo

Quatro jovens ativistas brasileiras escrevem sobre a importância histórica de as crianças terem sido ouvidas pela primeira vez durante a COP27 e defendem que a revolução a favor do clima será guiada por elas.

A Conferência do Clima das Nações Unidas (COP) sobre mudanças climáticas nunca foi um lugar representativo e acessível para todos. Ao longo das suas 27 edições, distintos grupos sociais vêm lutando para aumentar suas presenças e também influenciar nas negociações e decisões tomadas para conter a crise do clima. Dentre os grupos mais afetados pela crise climática, 1 bilhão de crianças mais vulneráveis estão expostas a riscos extremos no mundo todo.  

Os adultos adoram perguntar para crianças e jovens o que eles querem ser quando crescer. As crianças, em muitas das suas invenções e brincadeiras, imaginam como é ser adulto e salvar o mundo. Quando o assunto é crise climática, elas estão tendo que deixar o faz de conta de lado e assumir atitudes sérias. 

Uma criança pode ser ativista?

As crianças não se organizam em partidos políticos como adultos e muito menos lideram sindicatos que as representem. Mas isso não significa que as gerações mais novas não estão se organizando. Em vários países, projetos locais potencializados pelas mídias sociais têm sido criados por crianças e adolescentes com o objetivo de transformar suas vidas e o seu entorno quando o assunto é crise climática.

Na COP27, a revolução liderada pelas crianças já começou.

A COP que aconteceu em Sharm El Sheikh, no Egito, em novembro, trouxe novidades em sua construção e, pela primeira vez, incorporou fisicamente um espaço chamado de pavilhão das crianças e juventudes. Inicialmente, esse espaço seria apenas dos jovens, mas o movimento Children First Climate Movement, em parceria com diversas organizações internacionais, como Alana, conseguiu inserir as crianças nesse espaço. O pavilhão trouxe cores, ilustrações e mensagens de esperança e luta. Uma conquista que não se deu espontaneamente, mas a partir de muita luta traçada pelas crianças para que pudessem deixar de ser meras palestrantes em momentos simbólicos e passassem a ter seu próprio espaço de apoio, de encontro e de brincar enquanto se planeja mudar o mundo

Com a bandeira #KidsFirst (“criança primeiro”, na tradução do inglês), novas gerações pressionam por ocupar espaços de decisão. Francisco Javier Manzanares, ativista colombiano de 13 anos, é uma das crianças que lutam para ter sua voz ouvida: em sua primeira participação na COP26, em Glasgow, ele discursou na frente de líderes globais em um espaço oficial de tomada de decisões uma mesa de negociação sobre como monitorar e avaliar a implementação das metas acordadas sobre o clima , abrindo um leque de possibilidades para as crianças nestes espaços.

“O bem-estar, a dignidade e o futuro das crianças estão nas mãos de vocês”, discursou Francisco.

As crianças estão cada vez mais conscientes da situação do nosso planeta e do risco que correm seus futuros, e precisam ter espaços em que são ouvidas e respeitadas para além de representações vazias e pontuais. Apesar das conquistas, ainda há muita batalha a ser vencida. Chegar a espaços de tomada de decisão não é uma tarefa fácil.

Segundo Amara Nwuneli, ativista de 15 anos da Nigéria que participou da COP no Egito, líderes têm colocado jovens e crianças em lugares para serem vistos, e não ouvidos. No entanto, “estamos percebendo isso e estamos cada vez mais destruindo as barreiras ao fazer perguntas desafiadoras para os tomadores de decisões”, comenta.

Um mundo que demanda ação imediata

A COP sobre mudanças climáticas é um dos eventos anuais da ONU para promover o diálogo entre os países. Durante a conferência, os espaços para a sociedade civil (movimentos sociais, ONGs, empresas, fundações, sindicatos) são limitados. É preciso conseguir autorização para ser um dos chamados observadores, que têm direito de fala nas mesas de negociação. A participação de crianças e adolescentes é ainda mais desafiadora. Além de precisarem de adultos responsáveis e acompanhantes, a credibilidade de ativistas com menos de 18 anos é constantemente questionada. Por vezes, são tratados como incapazes ou simplesmente novos demais para conhecer, com propriedade, o tema que discutem.

Conferências como essa não são feitas para incluir os grupos mais vulneráveis, e respeitar e garantir seus direitos básicos.

Não há dúvidas que elas são um grupo altamente impactado pelos efeitos da crise climática – segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), uma em cada quatro mortes de crianças com menos de quatro anos tem relação direta ou indireta com riscos ambientais. Além disso, são as crianças de hoje que terão que lidar com o mundo que está sendo deixado para elas.

Muitos desses jovens cresceram enfrentando os impactos das mudanças no clima e desigualdades do sistema atual, fazendo parte dos grupos mais vulneráveis e marginalizados. Então, mais do que nunca, suas vozes precisam ecoar. São os jovens que fazem parte do nosso presente e futuro na Terra. Para que sejam de fato a geração da mudança, precisam cada vez mais estar inseridos nos debates sobre o destino do planeta e de todos que o habitam. 

A COP admitiu a necessidade de abrir espaço para o protagonismo de crianças e adolescentes ao reconhecê-los, pela primeira vez em 30 anos, como agentes transformadores nos debates sobre a emergência climática. A ONU está instigando os países a incluí-los na elaboração e implementação de políticas sobre o clima. Não está claro, porém, como serão esses espaços. A impressão é que, como todo debate da ONU, será preciso seguir a luta para ocupá-los.

* Adriani Maffioletti, 20, ativista por justiça climática e direitos dos povos originários; membro do Fridays for Future e Latinas for Climate. Amália B. Garcez, 19, ativista socioambiental e estudante de física na UFRGS. Mikaelle Farias, 21, estudante de Engenharia de Energias Renováveis, ativista e comunicadora em justiça climática e negritude. Nayara Almeida, 24, cria da baixada fluminense do Rio de Janeiro, bióloga, educadora e comunicadora climática.

** Este texto é de exclusiva responsabilidade dos autores e não reflete, necessariamente, a opinião do Lunetas.

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